Eduardo Oliveira
Silva – Jornal i, opinião
É um dever de
cidadania a vigilância para não deixar extinguir esse enorme bem comum
A par da paz, a
saúde é sem dúvida o bem mais precioso do ser humano. Só não o sabe quem
porventura tenha uma saúde de ferro extensiva a toda a família. Mas tarde ou
cedo, mesmo esses se confrontam com uma realidade inevitável.
Os portugueses têm
o privilégio de ter um SNS de que se podem orgulhar e cuja construção foi
certamente a maior de todas as conquistas da democracia.
No seu conjunto,
seja na rede pública pura, comportando hospitais e centros de saúde, seja
através das convenções com entidades privadas complementares que visam
legitimamente o lucro, a saúde em Portugal tem uma qualidade de assistência
notável, se retirarmos por vezes as condições de instalação.
No entanto, as
coisas estão a mudar. Diariamente vão surgindo informações sobre cortes. Um dia
são economias em medicamentos para doentes com doenças crónicas e caras. Noutro
é o encerramento ou a concentração de urgências. Noutro ainda é o fecho de
maternidades e hospitais. Aqui e ali anunciam-se reformas de centros de saúde e
a sua concentração, o que basicamente piora a assistência, mas satisfaz o
objectivo de reduzir pessoal.
Ontem noticiou-se
que poderia haver cortes até 15% em custos com alguns recursos humanos, mas já
ao cair da noite o facto foi negado oficialmente, o que não deixa de ser
estranho. Apesar de falar em empolamento, o suposto esclarecimento da
administração da saúde nada adiantava quanto ao teor das ordens transmitidas
para em concreto se elaborarem os orçamentos, o que revela falta de
transparência. Negar uma notícia sem dar dados objectivos não convence ninguém.
Seja como for, o facto é que o percurso será de redução na despesa com pessoal,
que entretanto vai também ficar sujeito ao eventual aumento de horário para 40
horas semanais, se o Tribunal Constitucional validar a decisão, como se espera.
É bom de ver que os factos apontam para medidas orçamentais ainda mais
restritivas em todas as área do SNS, que assim só pode perder qualidade.
Se é certo que o
dinheiro é um bem escasso, se é certo que é preciso gerir com eficácia e
economia de escala, não é menos certo que estamos a caminho de uma inversão de
paradigma e de uma regressão objectiva, o que mais tarde terá consequências
negativas para os cidadãos.
Diariamente,
jornais, televisões e simples conversas dão conta de situações em que, por
exemplo, um tratamento urgente foi atrasado por limitação de meios.
Até aqui a situação
tem, ainda assim, sido gerida com algum equilíbrio e sensatez. No entanto, tem
de se admitir que quaisquer cortes suplementares em relação aos que já foram
feitos podem produzir menos capacidade de tratar e curar. 2014 ameaça portanto
ser um ano de ruptura, como os portugueses que precisarem de cuidados de saúde
perceberão individualmente, embora colectivamente isso passe despercebido na
exacta medida em que só quem precisa pode avaliar o assunto.
E é exactamente por
isso que há um dever de vigilância sobre o sistema, que, independentemente da
ideologia, do credo ou da idade, cada cidadão deve exercer para preservar o SNS
dentro de padrões de qualidade e humanitários que não deslustrem os que já
foram alcançados.
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