Filomena Martins –
Diário de Notícias, opinião
De um ministro - e
de um Governo - esperamos que aja. Não que ache. Nuno Crato fez um flick-flack
em relação ao ensino do Inglês do primeiro ciclo e caiu de costas. Porque
depois da embrulhada em que se envolveu sobre o tema, veio dizer que também ele
acha que a língua inglesa deve fazer parte do currículo obrigatório desde a
primária. E, para que o desastre da sua pirueta não fosse muito evidente,
mandou um qualquer dos órgãos do Ministério da Educação estudar a coisa. O que,
já sabemos, demorará mais meses que o Tribunal Constitucional a avaliar algumas
reformas. Voltando ao ministro, o que ele acha achamos todos. No mundo cada vez
mais globalizado, onde o inglês é a língua mais universal, este é um tema sobre
o qual existe verdadeira unanimidade. Mas eu e essa grande maioria, não podendo
decidir, elegemos quem decida. O eleito é--o para fazer. Não para achar.
Nuno Crato é
ministro num momento muito especial. Os cortes a que está obrigado - os que se
impõem desde há muito no sector e os que lhe impõem por força da austeridade -
limitam-no. Como também todos estamos conscientes dessa dura realidade, Crato
podia ter sido frontal e citar o seu ex--colega Vítor Gaspar: "Não há
dinheiro, qual destas palavras é que ainda não perceberam." E simplesmente
comprometer-se a colocar o ensino de Inglês obrigatório como uma das
prioridades para o próximo ano. Ao embrulhar-se nas palavras, ao atirar a
responsabilidade para as escolas em nome de uma independência inexistente -
podem decidir dar ou não Inglês, mas não podem contratar quem o possa dar -, o
ministro escolhido pelas suas capacidades técnicas mostrou todas as suas
inaptidões políticas.
O pior de tudo isto
é que se trata apenas de mais um episódio fortuito na educação. Num sector que
há muito precisa de uma renovação total, de uma reforma completa a todos os
níveis, fazem-se simples remendos ao sabor das necessidades ou das pressões
corporativas. Esta tinha sido a oportunidade - não faltam argumentos que o
justifiquem - para a reforma estrutural tão necessária. Mas avança-se só com
mudanças conjunturais, a maior parte por motivos economicistas não assumidos,
que dificilmente perdurarão no tempo. A educação em Portugal vive um momento
terrível, a queda do número de estudantes no ensino superior é assustadora (e
tem mais que uma razão de ser), e em vez de atos concretos, andamos entretidos
em piruetas de linguagem, em retórica política eleitoral. E, enquanto isso,
adia-se o essencial. E assim continuaremos a ser um país adiado, com um futuro
adiado.
A anedota
O episódio da não
notificação de Oliveira Costa é anedótico. Só que não dá vontade de rir, é mais
caso para chorar. Um dos responsáveis do maior crime financeiro em Portugal em
vez de ter tido um destino semelhante - à escala - do que aconteceu a Madoff,
foi primeiro mandado para casa com pulseira eletrónica e está agora
simplesmente com termo de identidade e residência, situação que a própria
ministra parecia desconhecer. Mas, como se não bastasse, as autoridades
estiveram dois meses sem o conseguir contactar e teve de ser ele a telefonar
para os tribunais. Com este último exemplo, a justiça não fica ainda mais
desacreditada. Cai mesmo no ridículo.
As mentiras
Oratória,
demagogia, ou, na expressão mais moderna, narrativa, são palavras sinónimas em
política. Na boca de Maria Luís Albuquerque, primeiro, e de Rui Machete, agora,
soam apenas a desculpas esfarrapadas. A ministra das Finanças insiste que
"não teve conhecimento oficial" dos swaps, quando é por demais
evidente que conhecia o problema e desempenhou um papel em toda a situação. Rui
Machete considera uma "incorreção factual" o facto de haver negado ao
Parlamento ter sido acionista da SLN, quando as suas ligações ao BPN são
públicas e evidentes, ainda que o tema queime e seja uma vergonha aparecer
ligado a ele. Mais grave que contradições é faltar-se à verdade. É mentir. E
não assumir as consequências desses atos.
O patético
Numa campanha
autárquica onde lamentavelmente se falou de tudo menos de problemas locais - e
muitos são bem graves -, tornar Woody Allen o grande protagonista das disputas
regionais é absolutamente patético. Não pelo realizador ou pela sua obra. Nem
sequer pelo potencial de promoção que um filme seu, realizado em qualquer ponto
do nosso país, seguramente terá. Mas pela oportunidade de trazer o assunto para
a lista de prioridades atuais, quando não há dinheiro para mandar cantar um
cego ou para ensinar inglês às nossas crianças. Os homens da troika que por cá
andam devem estar estupefactos entre a nossa absoluta e urgente necessidade de uma
lei antipiropo proposta pela oposição e os contactos ao mais alto nível do
vice-primeiro-ministro para discutir cenários cinematográficos ao mesmo tempo
que vai empurrando com a barriga a reforma do Estado.
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