Eugénio Costa Almeida* - Folha 8 – edição de 12 outubro 2013
Rui Machete é o
actual MENE (Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros) – antigo MNE (Ministro
dos Negócios Estrangeiros); pelos vistos para os portugueses qualquer
relacionamento internacional só se faz pela via do negócio – teve um encontro
imediato de primeiro grau com a comunicação social angolana, oficiosa, onde
terá apresentado as “desculpas diplomáticas” – em negócios não há “desculpas
diplomáticas”, mas… – pelos casos que, habitualmente, e de quando em quando, a
nossa comunicação social orientada faz emergir das esconsas secretárias dos
jornalistas (não dos Jornalistas) que por lá pululam e que servem para acirrar
alguns ódios de estimação – estranhamente, a maioria parte de jornalistas
que, por sinal, até são lusos, talvez saibam mais que nós que somos angolanos
e menos aptos às intrigas palacianas – contra a Justiça portuguesa e contra
alguns políticos lusos (o que se estranha porque não há políticos mais subservientes
aos políticos estrangeiros que os lusos, e não é de agora…).
Desta vez, e uma
vez mais, a questão prendeu-se com os processos, que estão, sublinhe-se, em
segredo de Justiça e sem que qualquer dos eventuais visados tenha sido
constituído arguido ou testemunha, e que eventualmente recairão sobre
personalidades nacionais, algumas de relevo político e jurídico.
Segundo os nossos
órgãos informativos oficiosos, Rui Machete terá dito, ou tentado explicitar,
que os processos estavam quinados e fechados. E tê-lo-á feito de forma
diplomática (sic) para evitar constrangimentos entre Angola e Portugal,
recordando que no nosso quadrado estão alguns milhares de portugueses a trabalhar
e algumas dezenas de empresas a laborar, contribuindo estes para minorar a depauperada
balança de pagamentos lusa (Angola é o 5º destino de bens e serviços e o
primeiro fora do espaço da UE, nas relações comerciais lusas).
Como diplomata
considero que a atitude do MENE terá sido aceitável. Mas esqueceu-se o bom do
MENE luso que além de diplomata, recente e após irrevogável demissão do
anterior, Paulo Portas, Rui Machete é também ele um jurista e insigne advogado
com a particularidade de ter sido consultor da empresa de causídicos que
patrocinavam os tais responsáveis angolanos sujeitos a processos jurídicos a
decorrer na Procuradoria-Geral da República (PGR) lusa – local, reconhecido
de, por vezes, escaparem em gritantes sussurros alguns sérios segredos de
justiça –; logo potencial conhecedor dos processos em causa.
Só que o bom do
MENE luso terá dito (não ouvi, logo não posso afirmá-lo), que as diplomáticas
afirmações que terá prestado teriam como remetente a PGR lusa que, posteriormente,
rectificou após desmentido daquela, evocando o seu conhecimento do processo
através de uma antiga nota do DCIAP, de 13 de Novembro de 2012, onde o
Ministério Público afirma “que corre uma investigação com o NUIPC
142/12.0TELSB sem que, contudo, nela estejam constituídos quaisquer arguidos”.
Ou seja, não há arguidos mas há uma investigação…
E qual é o espanto?
Há países onde o Ministério Público não se submete às ordens dos patrões políticos
ou governamentais e seguem os trâmites normais dentro de um departamento de
Justiça. Ou seja, só se regem pelo que determinam as normas jurídicas e
constitucionais de um Estado. Por vezes, a PGR só tem conhecimento dos
processos quando os mesmos estão encerrados e prontos a serem dirimidos –
quando lá chegam – em Tribunais.
Mas isso só
acontece em países onde o segredo é a máxima da Justiça ou onde esta tem
poderes próprios e não se deixa manietar por conveniências políticas,
económicas ou governamentais.
Mas voltando a Rui
Machete e às diplomáticas desculpas, até se compreende a sua atitude
enquanto “gestor” do MENE; já não se aceita, todavia, que se esqueça que também
é jurista e que há factos que não devem ser discutidos na praça pública –
quando se fala para um órgão de informação, torna sempre uma pequena notícia
num acto de, nas palavras de Francisco Louçã, “fabricação de informação” extensível
a todos os leitores e, ou, ouvintes!
Diplomaticamente
falando, se houvesse qualquer necessidade de esclarecer os governantes dos
actos jurídicos que impelem sobre as citadas, ou quaisquer outras, personalidades
nacionais isso seria feito em locais específicos e em momentos exclusivos, ou
seja, durante algum encontro de ministérios ou governos.
Mas como a
diplomacia lusa sempre foi conhecida pelos momentos mais estranhos e mais
complexos dentro da realpolitik provavelmente, a atitude do MENE luso, Rui
Machete, até terá sido a mais conveniente para ver se os processos em questão
saem da monótona dormência onde pernoitam grande parte dos processos jurídicos
portugueses.
O certo é que, em
Portugal, todos contestam a oportunidade das palavras de Rui Machete, ao ponto
do seu primeiro-ministro, o mais africano dos portugueses, as ter considerado
como uma “declaração menos feliz”.
Num país
normalizado, um Ministro ser assim enxovalhado por vários lados só teria uma
solução: demitia-se!
*Investigador do
CEI-ISCTE-IUL e pós-doutorando da UAN
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