Ana Sá Lopes –
jornal i, opinião
Sociais-democratas
e democratas-cristãos morreram e o velório está a ser prolongado
A Europa passou
meses em suspenso por causa das eleições alemãs. O sonho de que as
"coisas" iriam mudar atravessou as fronteiras do Sul fustigado. Se
calhar a senhora Merkel não se mexia porque tinha uma campanha eleitoral para
ganhar - e um novo partido eurocéptico para enfrentar. Mas as
"coisas" iam mudar, tinham de mudar. Afinal o SPD tinha feito metade
da campanha a criticar o excesso de austeridade que Merkel tinha imposto ao
Sul.
A "grande
coligação" ainda não está fechada, mas os dois partidos já estão de acordo
sobre a política europeia. E o que nos diz esse acordo? Que vai ficar tudo na
mesma. O SPD reduziu-se à sua insignificância: voltará a apoiar a política da
bastonada. Não há eurobonds para ninguém nem garantias da união bancária.
Depois da falência
do socialismo francês - e do desaparecimento de François Hollande do cargo de
combatente da austeridade para o qual foi eleito - é a vez dos
sociais-democratas europeus de levarem com mais um tijolo na cabeça. O SPD, um
dos primeiros partidos socialistas europeus a converter-se à terceira via, não
irá dar qualquer contributo para a resolução dos problemas estruturais da
Europa e da arquitectura do euro. O Sul continuará entregue aos bichos e à
ditadura de uma união monetária concebida para os mais fortes.
Estamos a viver uma
espécie de fim dos tempos - embora muita gente finja ainda não ter dado por
isso. Os dois partidos fundadores da União Europeia - os sociais-democratas e
os democratas-cristãos - foram capturados pelos interesses financeiros, pelos
negócios, pela miséria ideológica do individualismo selvagem. Na prática,
socialistas e democratas-cristãos morreram e o que vemos à nossa frente é um
velório prolongado. Nenhum europeu teve ainda a coragem de lhes fazer o
enterro, mas é urgente fazer esse funeral e o luto subsequente. Mais vale
desligar a máquina que continuar neste estado comatoso a fingir que ainda
existem partidos social- -democratas, valores social-democratas ou
democratas-cristãos.
O que sabemos que
existe, neste momento, é uma extrema-direita a crescer e a organizar-se. Marine
Le Pen deverá ganhar as eleições europeias em França e já prepara activamente
uma aliança com os extremistas da Holanda, com a Liga Norte e com outras
companhias do género. Estes senhores têm um programa, sociais- -democratas e
democratas-cristãos não têm nenhum. As coisas não vão correr bem.
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