“Não é neonazi.” “É
apenas um eleitor ordinário, que anda há anos frustrado por ninguém tratar dos
seus problemas.”
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Hospodářské noviny, Praga – Presseurop – imagem Shooty
A eleição, neste
fim de semana, do neonazi Marian Kotleba para o cargo de governador de uma
região constitui o último exemplo da ascensão da extrema-direita na Europa. A
elite política e a sociedade eslovacas, que favoreceram a vitória deste
“outsider”, estarão à altura da situação?
Num feriado
recente, os radicais ultranacionalistas polacos deitaram
fogo a uma instalação artística em forma de arco-íris, numa praça no centro
de Varsóvia, e em seguida incendiaram uma guarita junto à embaixada da Rússia.
Os incidentes deram origem a um escândalo internacional. O confrade eslovaco
dos ultranacionalistas polacos, Marian
Kotleba, chegou mais longe. No fim de semana, venceu as eleições regionais
e tornou-se Župan (governador) da região de Banská Bystrica. O facto constituiu
um choque para muitos eslovacos.
À frente de uma das
oito regiões do país está agora um homem que elogiou o Estado da Eslováquia
fascista e a expulsão dos judeus, que gosta que lhe chamem “Vůdce” (Líder), que
está a criar uma milícia contra os ciganos e que lidera um partido, o “Nossa
Eslováquia”, cujo programa pode ser resumidamente definido como uma
“improvisação populista com elementos de neonazismo”.
Depois da entrada
de Jobbik
no Parlamento húngaro, em 2010, deixou de ser de espantar o facto de a
frustração e o desapontamento com a evolução política e económica na Europa
Central ter dado vantagem nas urnas a um político extremista e ao seu partido.
Contudo, a troca de recriminações entre políticos eslovacos de esquerda e de direita,
do estilo “a culpa é tua e não minha”, indica que os políticos não se
aperceberam da mudança do estado de espírito da população.
A facto de Kotleba
ter chegado à segunda volta levou a uma participação dos eleitores superior à
verificada nas quatro outras regiões, onde o escrutínio se realizou no sábado.
E os votos que obteve não vieram de uma única classe social.
A vitória agora
alcançada por Kotleba irá obviamente impeli-lo de candidatar-se, no próximo
ano, às eleições presidenciais e locais. Apesar de não ter hipótese de ganhar,
os resultados obtidos lançam as bases para as eleições parlamentares de 2016.
Como governador da região, Kotleba ficará isolado, mas, segundo o sociólogo
Martin Bútora, por exemplo, isso dar-lhe-á a oportunidade de se apresentar como
vítima do sistema e marcar pontos.
Desilusão e o
Estado da Eslováquia
O sucesso de
Kotleba tem a ver com vários aspetos e resulta de diferentes fatores a que nem
todos os eslovacos são sensíveis. O descontentamento global com o
desenvolvimento da sociedade eslovaca, nos últimos anos, é uma das causas.
Outra é a
incapacidade que as elites de esquerda e de direita mostraram para organizar
uma oposição a Kotleba, que surpreendeu toda a gente por ter passado à segunda
volta.
O
primeiro-ministro, Robert Fico, apoiou os candidatos do seu partido SMER nas
regiões de Nitra e Trnava contra o (alegado) perigo húngaro, mas não dedicou
qualquer tempo ao candidato desse mesmo partido em Banská Bystrica. Por outro
lado, o candidato dos partidos conservadores de direita recusou-se em absoluto
a apoiar o candidato do SMER, na segunda volta.
O terceiro fator
tem caráter de longo prazo e é de certo modo subliminar. Segundo o sociólogo
Michal Vašečka, existe na sociedade eslovaca um grupo relativamente grande de
eleitores com tendências autoritárias (como provam sucessos anteriores do Partido
Nacional Eslovaco e do HZDS, de Mečiar).
Este grupo também está disposto a questionar o resultado da Segunda Guerra
Mundial, na medida em que põe em causa a cumplicidade do líder do Estado da
Eslováquia, Jozef Tiso, com o Holocausto e com outros crimes.
Segundo Vašečka,
desde meados dos anos de 1990, esta linha de opinião tem vindo a ganhar força e
isso graças à influência da Igreja Católica.
O trunfo dos
ciganos
Apesar de, no
contexto europeu, termos que encarar a vitória de Marian Kotleba como uma de
uma série de outras que indicam que o apoio aos extremistas está a aumentar,
aquela vai além de um simples voto de protesto, porque este radical totalmente
imprevisível sabe aliar o populismo à questão dos ciganos, um problema delicado
e que continua por resolver.
Não oficialmente,
os ciganos constituem um décimo da população da Eslováquia. A maioria dos
eslovacos considera o problema dos ciganos acima de tudo como uma questão de
segurança, e não de direitos humanos ou sociais. E isso joga a favor de
Kotleba, que, por exemplo, comprou o terreno onde se situa um dos muitos
acampamentos de ciganos e agora quer expulsá-los dali – ou seja, usar a força
como solução.
Mais do que o
costumado trunfo dos húngaros, o recuperado trunfo dos ciganos tem empurrado a
política eslovaca para o extremismo. A resposta dos políticos dos partidos
tradicionais revela que estes foram ultrapassados e que o sucesso de Kotleba
tem a ver com algo exterior aos acontecimentos políticos atuais.
Na Eslováquia
pós-1989, esses acontecimentos não foram totalmente benignos para a democracia
liberal e para os seus valores fundamentais. Mas nem mesmo o antigo líder do
Partido Nacional Eslovaco, Ján Slota, alguma vez se declarou partidário do
nazismo e da sua vertente eslovaca, de uma forma tão aberta como Kotleba. “Isto
é mais sério do que parece”, afirma Martin Bútora.
Governador como
prova dos nove
Num texto publicado
pelo Instituto de Assuntos Públicos de Bratislava e intitulado “De onde e para
onde: 20 anos de autonomia”, a antiga plenipotenciária governamental para os
assuntos ciganos, Klára Orgovánová afirma que, quando se trata de avaliar os
progressos alcançados pelos eslovacos na construção de uma sociedade civil, os
ciganos são a prova dos nove.
Nesse sentido,
Marian Kotleba, tão estreitamente associado à questão cigana, será um teste à
política eslovaca no seu todo.
Com a eleição deste
para o cargo de governador, a Eslováquia parece ter dado um passo atrás. No
entanto, isso está longe de ser verdade. Só a resposta dos políticos à
realidade que esta votação democrática trouxe consigo e a forma como eles
lidarem com essa realidade nos mostrarão a verdadeira situação da sociedade
(civil) eslovaca e a qualidade da sua democracia e das suas instituições.
Por outras
palavras, podem aumentar a popularidade de Kotleba, tratando-o como um pária.
Ou podem, inteligentemente, desacreditá-lo como político no seu papel de
governador. Contudo, neste momento, as hipóteses de a segunda alternativa se
concretizar são bastante reduzidas.
Reações de
Bratislava
Partidos declinam
qualquer responsabilidade
“Eleições não
movimentaram partidos”, constata o SME após a
eleição surpreendente de Marian Kotleba, militante de extrema direita de
longa data, para o cargo de governador da região de Banská Bystrica.
O êxito de Marian
Kotleba no seio do partido SMER (socialista) foi amplamente facilitado pela
ausência de apoio do candidato do SDKÚ (direita), vencedor na primeira volta,
ao candidato do SMER. Mas ambos os partidos declinam qualquer responsabilidade,
lamenta o diário, para quem
a ausência de
autocrítica é uma das piores características dos políticos […] e uma das
principais razões para que os eleitores tenham deixado de confiar neles – em
parte com razão – mas também na democracia – um pouco estupidamente.
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