Alastra-se, nos
EUA, luta dos trabalhadores de fast-food por salários e direitos. Detalhe: eles
ganham quatro vezes mais que no Brasil
Gabriela Leite –
Outras Palavras
Os quase invisíveis
funcionários de fast foods norte-americanos estão organizando-se para chamar a
atenção para que seus direitos sejam reconhecidos. Em 5 de dezembro, atendentes
de redes como McDonald’s, Burger King, KFC e Wendy’s de mais de 100 cidades dos
Estados Unidos não apareceram nas lanchonetes. Organizaram-se, à sua maneira,
em cada parte do país, exigindo melhores salários e o direito de poderem se
sindicalizar. De flash mobs a cartazes luminosos e fantasias irônicas de Ronald
McDonald e Tio Sam, levantaram uma mesma bandeira: o aumento do salário mínimo
para 15 dólares por hora — mais que o dobro dos U$7,25 atuais, piso salarial
norte-americano, equivalentes a R$ 16,80.
O movimento começou
com uma pequena marcha em Nova York, em novembro de 2012, com trabalhadores das
redes KFC, McDonald’s e Burger King. Já protestavam pelo aumento do salário para
15 dólares por hora, e chamavam a atenção para como é impossível viver em
condições materiais dignas com um destes empregos. Em agosto deste ano, os
protestos aumentaram: aconteceram em mais de 60 cidades norte-americanas.
Você pode não
reparar, mas os sanduíches de aparência plastificada são montados e servidos
por mãos humanas. E, apesar de haver um mito de que este é um emprego para
jovens e profissionais iniciantes, os números mostram exatamente o contrário: a
maior parte dos funcionários têm mais de 25 anos e em torno de 68% deles são os
principais responsáveis pela renda de sua família. Muitos têm filhos e cumprem
jornada dupla para poder manter suas casas.
Paul Krugman, Nobel
de Economia, lembra que, assim como a maioria dos trabalhadores
pobres, os funcionários do varejo têm sofrido perdas graves, nos Estados Unidos
— uma nação cada vez mais desigual. Apesar da crise, a economia é, hoje, muito
maior do que há quarenta anos. Porém, os salários nas empresas varejistas
(algumas delas, gigantes globais como McDonald’s e WalMart) representam, hoje,
30% menos do que em 1973 — quando já não eram grande coisa. O salário mínimo
nacional nos EUA é de U$7,25 por hora (em alguns estados é um pouco maior), e os
atendentes de fast food recebem, se tanto, apenas alguns centavos a mais. O
Instituto de Políticas Econômicas dos EUA concluiu que, se o mínimo aumentasse
para U$10,10, beneficiaria diretamente 30 milhões de trabalhadores.
Apesar da crença de
que salários mais altos resultariam num aumento do preço dos produtos ou na
inviabilidade financeira das cadeias de restaurantes, Krugman mostra, por meio
de pesquisas, que isso não é verdade. Para ele, é necessário que, além da
elevação do mínimo, existam e sejam ampliados programas de assistência médica e
alimentar (nos EUA, existem os food stamps, que são algo com um vale refeição
oferecido pelo governo aos mais pobres).
Mas afirmar a
inviabilidade do aumento do salário dos funcionários, sob o pretexto de que os
alimentos ficariam mais caros é, no mínimo, muito mesquinho. Isso fica
explícito quando se compara o que ganham o caixa de um McDonald’s e o
presidente da empresa. Um atendente tem de trabalhar quase quatro meses para
alcançar o que James Skinner, o útimo CEO da rede cujos dados estão
disponíveis, ganhava em uma hora. Segundo a Fast Food Forward,
movimento de trabalhadores de fast food novaiorquinos, a média de salário de um
presidente destes restaurantes é de U$25 mil por dia. E toda esta indústria
recebe, aproximadamente, 200 bilhões de dólares a cada ano.
É por causa desta
desigualdade que, normalmente, um funcionário não poderia parar para fazer
greve por um dia — isso significaria 50 dólares a menos em sua renda. Por isso,
grupos ativistas como a Fast Food Forward e Fight For 15, auxiliados por
sindicatos, fundações e organizações de base, financiaram a paralisação.
O McDonald’s, que
costuma reprimir e penalizar trabalhadores que se organizam, acredita
cinicamente que eles têm melhores maneiras de aproveitar os poucos dólares que
ganham. Em um site de recursos humanos dirigido aos funcionários, sugeriu-se que cortassem sua comida em pedaços, para
que rendesse mais. E se estivessem com problemas financeiros, a dica era vender
alguns de seus bens em sites especializados. Além disso, alertava-se: reclamar
demais pode ser perigoso por causar grande aumento do hormônio do stress — a
recomendação era que cantassem, para esquecer dos problemas.
Seria interessante
se o movimento reivindicatório dos EUA chegasse ao Brasil. Em São Paulo, em
maio do ano passado, o McDonald’s assinou um acordo com o Sindicato dos Trabalhadores
em Hotéis, Bares, Lanchonetes e Restaurantes de São Paulo (Sinthoresp),
regularizando as jornadas de trabalho e salários fixos de seus funcionários.
Antes disso, os funcionários tinham horários de trabalho irregulares e eram obrigados
a ficar à disposição da empresa. Nesta época, o piso de um trabalhador de 44
horas semanais era quatro vezes menor que o de seu colega nos EUA: R$ 769,26 —
cerca de 4 reais por hora (ou U$1,72, considerando o dólar a R$2,34). A
exploração, como se vê, também é devidamente exportada.
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