As novidades na
composição do governo alemão (coalizão com os social-democratas) podem abrir
caminho para mudanças políticas significativas.
Flávio Aguiar –
Carta Maior
Berlim - Hoje,
terça-feira, 17 de dezembro, o novo governo alemão será oficialmente nomeado
pela votação do Bundestag. Angela Merkel continua à sua testa, e Wolfgang
Schäuble no Ministério das Finanças. Mas há algumas mudanças na sua composição
que podem abrir caminho para mudanças políticas significativas.
O governo anterior erea composto pela CDU/CSU e o FDP, partido sempre descrito na mídia como “business friendly”, o que pode pode ser traduzido livremente por “amigo dos mercados”. Agora a composição foi feita com o SPD.
As diferenças começam aí: o SPD, agora sob a liderança de Sigmar Gabriel, que se tornou o vice-chanceler e o ministro de Energia e Economia, adernou um pouco para a esquerda. Com isto ele recupera a imagem de ser um partido social-democrata, ao invés de uma cópia descorada do conservadorismo imperial do estilo herdeiro de Margaret Tatcher.
Esta inflexão foi suficiente para colocar o governo inteiro mais um pouco à esquerda, fazendo diminuir a presença e influência tanto do lado mais conservador da CDU quanto da CSU bávara, decidamente o braço e o pulso direitos da coalizão.
Estes tênues movimentos foram suficientes para levantar o sobrolho – senão a ira – dos sacerdotes do catecismo econômico ortodoxo, alertando que a Alemanha está se pondo à beira do abismo (v., por exemplo, o comentário de Olaf Storbeck em site da Reuters). A latitude e os números mudam, mas a estrutura da ladainha e os adjetivos têm a mesma estrutura e o mesmo cheiro. Traduzindo literal ou livremente os termos, encontramos “descalabro”, “irresponsabilidade”, “desastre”, “desestímulo ao investimento privado”, etc.
Motivos para tal alarme, que mobiliza banqueiros, comentaristas, uma tal de Associação dos Engenheiros, o Conselho dos Assessores Econômicos (espécie de Clube dos Reis Magos), que deve zelar pela ortodoxia dos governos?
Ora, o salário mínimo em dose dupla: em primeiro lugar, sua simples adoção em nível nacional; em segundo lugar a quantia de 8,50 euros a hora. Isto “elevará os custos” no Oeste alemão, mais próspero, e “provocará o desemprego” no Leste, mais pobre. Mais: a redução da idade de aposentadoria de 65 para 63 anos, para quem trabalhou já 45 anos, beneficiando milhões de trabalhadores das camadas mais pobres, que começam a trabalhar mais cedo. Para os trabalhadores que estão entrando hoje no mercado de trabalho a idade é de 67 anos. Também conta-se na lista destas benesses “insuportáveis” o favorecimento dos que ganham menos, a proteção de mães trabalhadoras e outras medidas que só poderiam partir de uma súbita admiração por Hugo Chavez, Maduro, Lula, Dilma, Correa, Morales, Mujica, Bachelet, Kirchner e quejandos e quejandas todos e todas juntos e juntas.
Todas estas medidas farão as novas gerações pagarem o pato sob a forma de novos impostos, aumento dos antigos, etc. – embora adotadas com extrema cautela e ajustado comedimento. O mínimo, por exemplo, só entrará em vigor a partir de 2015 e só será universalmente adotado a partir do final de 2017.
Mas o mau exemplo está dado: estes passos do Sacro Império Germânico, onde antes só se adorava o Moloch Mercado, certamente farão retardar, senão regredir as necessárias machadadas em direitos da cidadania nos perdulários países da Europa-Sul, embora Schäuble nas Finanças seja uma garantia de que a política alemã para o continente não mudará muito.
Em outras frentes o novo desenho do governo alemão também provoca preocupações empresariais. Von der Leyen no Ministério da Defesa não é juma boa notícia para a indústria armamentista alemã, que tenciona ampliar seus mercados junto às monarquias e emirados árabes. Dentro do espectro da CDU, ela pertenca mais ao lado esquerdo, do que ao direito, tendo se destacado no Ministério do Trabalho, onde atuou no governo passado de Merkel no sentido de preservar direitos e ampliá-los no caso das mulheres. Tampouco a disposição anunciada pelo último Congresso do SPD, abrindo a possibilidade de uma coalizão nacional com a Linke traz tranquilidade para os súditos do catecismo ortodoxo.
Além disto neste novo governo será rfeforçada a posição alemã a favor de soluções negociadas no caso do Irã – com ressonâncias no caso sírio. E certamente se consolidará o apoio à luta do Brasil por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, dentro de um quadro de reforma da instituição. Talvez seja até apressada a saída das tropas alemães no Afeganistão, embora o SPD seja um partidário conspícuo da permanência do país dentro de uma linha definida pela OTAN. Haverá, com Franz-Walter Steinmeier no Ministério de Relações Exteriores, uma linha de maior cobrança no caso da espionagem norte-americana, pelo menos no continente europeu.
Não demorará muito e haverá quem queira, nas margens do Reno, do Elba e do Oder, repetir a lição da Tailândia, onde uma elite irritada está nas ruas para derrubar o governo da primeira-ministra Yingluck Shinawatra e suas iniciativas “populistas”.
Da fronteira com a Dinamarca ao norte, à com a Áustria ao sul, ainda ressoará o brado de ira: Basta, camarada Merkel!
O governo anterior erea composto pela CDU/CSU e o FDP, partido sempre descrito na mídia como “business friendly”, o que pode pode ser traduzido livremente por “amigo dos mercados”. Agora a composição foi feita com o SPD.
As diferenças começam aí: o SPD, agora sob a liderança de Sigmar Gabriel, que se tornou o vice-chanceler e o ministro de Energia e Economia, adernou um pouco para a esquerda. Com isto ele recupera a imagem de ser um partido social-democrata, ao invés de uma cópia descorada do conservadorismo imperial do estilo herdeiro de Margaret Tatcher.
Esta inflexão foi suficiente para colocar o governo inteiro mais um pouco à esquerda, fazendo diminuir a presença e influência tanto do lado mais conservador da CDU quanto da CSU bávara, decidamente o braço e o pulso direitos da coalizão.
Estes tênues movimentos foram suficientes para levantar o sobrolho – senão a ira – dos sacerdotes do catecismo econômico ortodoxo, alertando que a Alemanha está se pondo à beira do abismo (v., por exemplo, o comentário de Olaf Storbeck em site da Reuters). A latitude e os números mudam, mas a estrutura da ladainha e os adjetivos têm a mesma estrutura e o mesmo cheiro. Traduzindo literal ou livremente os termos, encontramos “descalabro”, “irresponsabilidade”, “desastre”, “desestímulo ao investimento privado”, etc.
Motivos para tal alarme, que mobiliza banqueiros, comentaristas, uma tal de Associação dos Engenheiros, o Conselho dos Assessores Econômicos (espécie de Clube dos Reis Magos), que deve zelar pela ortodoxia dos governos?
Ora, o salário mínimo em dose dupla: em primeiro lugar, sua simples adoção em nível nacional; em segundo lugar a quantia de 8,50 euros a hora. Isto “elevará os custos” no Oeste alemão, mais próspero, e “provocará o desemprego” no Leste, mais pobre. Mais: a redução da idade de aposentadoria de 65 para 63 anos, para quem trabalhou já 45 anos, beneficiando milhões de trabalhadores das camadas mais pobres, que começam a trabalhar mais cedo. Para os trabalhadores que estão entrando hoje no mercado de trabalho a idade é de 67 anos. Também conta-se na lista destas benesses “insuportáveis” o favorecimento dos que ganham menos, a proteção de mães trabalhadoras e outras medidas que só poderiam partir de uma súbita admiração por Hugo Chavez, Maduro, Lula, Dilma, Correa, Morales, Mujica, Bachelet, Kirchner e quejandos e quejandas todos e todas juntos e juntas.
Todas estas medidas farão as novas gerações pagarem o pato sob a forma de novos impostos, aumento dos antigos, etc. – embora adotadas com extrema cautela e ajustado comedimento. O mínimo, por exemplo, só entrará em vigor a partir de 2015 e só será universalmente adotado a partir do final de 2017.
Mas o mau exemplo está dado: estes passos do Sacro Império Germânico, onde antes só se adorava o Moloch Mercado, certamente farão retardar, senão regredir as necessárias machadadas em direitos da cidadania nos perdulários países da Europa-Sul, embora Schäuble nas Finanças seja uma garantia de que a política alemã para o continente não mudará muito.
Em outras frentes o novo desenho do governo alemão também provoca preocupações empresariais. Von der Leyen no Ministério da Defesa não é juma boa notícia para a indústria armamentista alemã, que tenciona ampliar seus mercados junto às monarquias e emirados árabes. Dentro do espectro da CDU, ela pertenca mais ao lado esquerdo, do que ao direito, tendo se destacado no Ministério do Trabalho, onde atuou no governo passado de Merkel no sentido de preservar direitos e ampliá-los no caso das mulheres. Tampouco a disposição anunciada pelo último Congresso do SPD, abrindo a possibilidade de uma coalizão nacional com a Linke traz tranquilidade para os súditos do catecismo ortodoxo.
Além disto neste novo governo será rfeforçada a posição alemã a favor de soluções negociadas no caso do Irã – com ressonâncias no caso sírio. E certamente se consolidará o apoio à luta do Brasil por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, dentro de um quadro de reforma da instituição. Talvez seja até apressada a saída das tropas alemães no Afeganistão, embora o SPD seja um partidário conspícuo da permanência do país dentro de uma linha definida pela OTAN. Haverá, com Franz-Walter Steinmeier no Ministério de Relações Exteriores, uma linha de maior cobrança no caso da espionagem norte-americana, pelo menos no continente europeu.
Não demorará muito e haverá quem queira, nas margens do Reno, do Elba e do Oder, repetir a lição da Tailândia, onde uma elite irritada está nas ruas para derrubar o governo da primeira-ministra Yingluck Shinawatra e suas iniciativas “populistas”.
Da fronteira com a Dinamarca ao norte, à com a Áustria ao sul, ainda ressoará o brado de ira: Basta, camarada Merkel!
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