Pedro Marques Lopes
– Diário de Notícias, opinião
Por iniciativa do
Presidente da República, foi fundado em 2012 o Conselho da Diáspora. Segundo o site
na internet, o objetivo é construir "uma rede de portugueses e
lusodescendentes, que residem no exterior, com o propósito de elevar a
reputação de Portugal no mundo". Estamos assim perante as melhores
intenções.
A segunda reunião,
realizada na semana passada, passou para os media como um encontro de
emigrantes de sucesso que iam ajudar, nas palavras de Cavaco Silva, a
"corrigir alguma desinformação que existe sobre o nosso país e assim
ajudar a melhorar a credibilidade do País e a difundir as suas
potencialidades".
Deixemos de lado a
expressão emigrantes de sucesso, não nos preocupemos em perguntar o que é um
emigrante malsucedido e se não seria mais importante dedicar algum tempo aos
nossos compatriotas não bem-sucedidos, digamos assim. Também não vale a pena
questionar de que tipo de desinformação Portugal está a ser alvo e quem são os
promotores de tão vil manobra. Palavras tontas e teorias da conspiração não
merecem muita prosa.
Não há registos,
mas espero que, já que se falava de emigração, se tenha aproveitado para falar
do que foi, a par do desemprego, uma das grandes catástrofes de 2013: a
emigração de 120 mil portugueses. Temo que não. Temo que se tenha perdido o
tempo todo na preparação de networking, em trocas de cartões para futuros
negócios, em relatos das histórias de sucesso, em comentários sobre as
maravilhas que os mercados internacionais dizem da nossa austeridade. É que não
há manobra de charme junto das comunidades estrangeiras, não há ataque a
desinformação que responda a esta pergunta: se o País é tão bom e tem tão boas
condições, por que diabo fogem 120 mil pessoas, a esmagadora maioria na força
da idade, bem formadas e qualificadas?
Portugal tem uma
longa história de emigração. Uma história com demasiadas vertentes, demasiadas
razões, demasiadas causas para que se possam analisar todas em meia dúzia de
linhas. Mas é, sobretudo, uma história de falta de horizontes, de falta de
perspetiva, de desespero, de miséria e, mais vezes do que imaginamos, de fome.
Aqueles 120 mil que
saíram de Portugal não falharam em Portugal, Portugal é que lhes falhou. Saíram
das faculdades, dos subúrbios das cidades. Desta vez não são os que fugiam da
vida do campo, analfabetos ou semianalfabetos que passavam a salto a fronteira,
nos anos 50 e 60. Tempos que nos prometeram que não voltariam a acontecer.
Situações que seriam parte de uma má memória que a integração na Europa e a correção
dos nossos endémicos problemas iriam resolver. De facto, já não se foge a
salto, os que vão não são analfabetos, mas os nossos continuam a ter de partir.
Estes que agora
saem são filhos e filhas de gente que se sacrificou para lhes dar cursos superiores.
Que acreditou que estava a construir um futuro diferente para os filhos e para
a comunidade. Alguns, filhos e filhas de gente que emigrou para que eles não
tivessem de sair da nossa terra.
Acredito que a
maioria destes 120 mil e de tantos outros que também partirão e de outros
tantos que já partiram, aqueles que desperdiçamos, aqueles em quem tanto
investimos, não serão os ocupantes de bidonviles das novas Franças. Muitos
serão bem-sucedidos, não no léxico provinciano do Conselho da Diáspora, mas tão
simplesmente assumindo que terão uma vida sem grandes problemas, que poderão
criar sem sobressaltos de maior os seus filhos e poderão exercer a profissão
para que foram formados. Farão, com certeza, muito pelos países onde viverão.
Nem tudo se perdeu: pelo menos a nossa comunidade ajudou-os a prosperar noutro
lado.
Para a nossa
comunidade é mais uma catástrofe, repito. Ao desperdiçarmos tanta gente
arrasamos o nosso potencial de crescimento, hipotecamos a próxima geração,
criamos ainda de forma mais vincada um país de crianças e velhos, talvez mesmo
só de velhos: um país sem futuro.
Era capaz de jurar
que os promotores do Conselho da Diáspora ainda não perceberam isto, nem se
maçaram sequer a levantar estas questões.
A nossa emigração é
tantas vezes a história de grandes sucessos individuais, de aventuras, de
feitos extraordinários, mas é sobretudo a prova de um enorme falhanço como
comunidade. Um falhanço demasiadas vezes repetido.
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