Henrique Monteiro –
Expresso, opinião
A definição de um
líder é a de alguém que exerce influência sobre o comportamento, pensamento ou
opinião dos outros. Àqueles políticos que seguem a opinião da turbamulta e dos
ventos do momento chamam-se, no geral, oportunistas.
Ontem, os líderes
parlamentares discutiram a trasladação do corpo de Eusébio para o Panteão; mas,
para cumprir a Lei, terão de esperar um ano para aprová-la.
Aquando do
falecimento de Amália, os "líderes" eram outros e fizeram mais ou
menos o mesmo, conseguindo uma coisa espantosa: alterar um decreto de 25 de
setembro de 1836, assinado por Passos Manuel, para diminuir o tempo que devia
mediar entre o falecimento e a honra de ir para o Panteão. Achou Passos Manuel
(e a Rainha D. Maria II assinou) que esse período deveria ser de cinco anos. Os
nossos deputados, em 2000, acharam que um ano basta. Eu pergunto: hoje, não
bastará uma semana? Um grito, que seja, de um cidadão emocionado não chega?
Irrita-me
solenemente as leis em Portugal serem adaptadas à medida dos acontecimentos. Se
o Parlamento sabe que não pode decidir antes de um ano por que agendou para
ontem essa discussão? A resposta é: oportunismo, populismo e falta de
liderança!
Há 164 anos todas
as personalidades tinham de ter falecido há mais de cinco anos para que o
Parlamento decidisse sobre a sua presença no Panteão. Por que razão se alterou
a lei para Amália Rodrigues? A resposta é: oportunismo, populismo e falta de
liderança!
Até parece que
tenho qualquer coisa contra Amália (nada, pelo contrário, foi uma cantora fora
de série) ou Eusébio (deu-me muito mais alegrias do que a maioria dos
portugueses). Mas se pego nestes exemplos é só para sublinhar como este país se
trata mal a si próprio e tem um Parlamento e uns líderes parlamentares que nem
sabem liderar, nem sabem impor uma lei. É uma vergonha.
Como é uma vergonha
que nomes como os que ontem aqui referi (e outros que me
apontaram e concordo, como Aristides Sousa Mendes) não tenham quem no
Parlamento os proponha, apenas por não haver quem na rua grite por eles. Como
um comentador ontem escreveu a propósito do meu artigo: "Pessoa, Camões,
Herculano estudam-se nas escolas. Não consta que se vá estudar Eusébio ou
Amália". Os seus contributos para o país (nomeadamente no estrangeiro)
foram grandes, foram enormes mas foram de qualidade diferente e, no caso
específico de Eusébio - e sublinho sem o querer minorar -, não condizentes com
o que a própria Assembleia da República decidiu em 2000: "As honras do
Panteão destinam-se a homenagear e a perpetuar a memória dos cidadãos
portugueses que se distinguiram por serviços prestados ao País, no exercício de
altos cargos públicos, altos serviços militares, na expansão da cultura
portuguesa, na criação literária, científica e artística ou na defesa dos
valores da civilização, em prol da dignificação da pessoa humana e da causa da
liberdade".
Adaptar as leis às
circunstâncias, às emoções momentâneas, aos oportunismos da caça ao voto é a
melhor prova de que pouco aprendemos ainda sobre a qualidade da democracia e da
racionalidade que ela tem de comportar. Dirão, somos latinos, somos emocionais.
Eu respondo: tretas! Falta-nos quem não tenha medo de afrontar o ar do tempo!
Nota histórica: O
Panteão Nacional congrega também a Igreja de Santa Cruz, em Coimbra, onde estão
sepultados D. Afonso Henriques e D. Sancho I; de início, consagrou-se como
Panteão o Mosteiro dos Jerónimos, onde estão sepultados Camões e Pessoa, mas um
decreto de 1916 mudou-o para o então "antigo e incompleto templo de Santa
Engrácia", que, na verdade, só ficou concluído em 1966 (daí a expressão
"isto é como as obras de Santa Engrácia"). Foi a partir de 1916 que
se começaram a colocar os túmulos que ainda hoje lá estão e os cenotáfios que
representam outros grandes vultos da História.
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