A Nação (cv)
Os estudantes
cabo-verdianos nas Canárias estão preocupados com a situação de ilegalidade em
que muitos são obrigados a viver. Dizem-se abandonados pelas autoridades do seu
país, que, além de não renovarem o convénio que lhes permita viver legalmente,
fazem promessas que não cumprem.
Nádia Cristina, 22
anos, estudante na Universidade de Las Palmas de Gran Canárias (ULPGC),
considera preocupante a situação em que se encontram dezenas de cabo-verdianos
que escolheram as Canárias para seguir a sua formação superior.
É dos poucos
estudantes que aceita dar a cara porque é, também, dos poucos que se encontra
em situação legal. Acredita que mais de 30 por cento dos seus colegas naquela
região espanhola estão sem os documentos exigidos, vivendo por isso na
clandestinidade e ilegalidade, com tudo de mau que isso possa significar para
um estudante estrangeiro num meio como as Canárias.
"Estou
indignada com a situação irregular de muitos estudantes aqui nas Canárias.
Muitos foram os ministros, o embaixador de Cabo Verde na Espanha, que aqui
estiveram e nos prometeram muitas coisas, desde 2007. Já estamos à espera de
soluções há mais de seis anos, mas o que vemos é que a situação está cada vez
pior", desabafa.
Nádia Cristina, que
confessa não estar em situação pior, diz-se desgastada ao ver colegas a
passarem por tanta aflição, sem poder fazer nada. "O mais grave é a
ilegalidade de muitos estudantes”.
Mas não é só isso.
“Falta também uma entidade que nos represente, pois, a sede onde fica o
consulado de Cabo Verde responde pelo nome de Yuba, uma empresa, nunca
conseguimos contactar o cônsul porque ele está sempre em viagens em questões
que dizem respeito os seus negócios”.
A não renovação do
convénio entre Cabo Verde e as Canárias parece também ter trazido alguns
constrangimentos para os estudantes cabo-verdianos. "Precisamos que
renovem esse acordo e que as exigências para se estudar aqui sejam logo
esclarecidas, porque, a cada ano, parece que mudam as regras", diz Nádia
Cristina, desconsolada.
Perigo de não
terminar o curso
O que mais
"dói" em Nádia, segundo a mesma confessa, é a "má fama" que
se atribuem em Cabo Verde aos estudantes nas Canárias, sem saber as
"privações" por que passam.
Segundo relato de
outros estudantes contactados por A NAÇÃO, por causa desse "abandono",
muitos estudantes vêm-se obrigados a dormirem nas próprias universidades porque
não têm dinheiro para pagarem a renda de uma casa ou mesmo um quarto.
"Ficam ali porque algumas universidades ficam com a porta aberta durante
24 horas", diz um desses estudantes, sob anonimato, para se proteger da
polícia.
Outra fonte, que
regressou a Cabo Verde sem terminar os estudos, diz que já teve de "dar
agasalho" a vários colegas nas Canárias. "Vim embora porque não tinha
condições de lá continuar", afirma esta jovem, para quem, tal como Nádia
Cristina e outros estudantes, o acréscimo obrigatório de 350 euros para 530
euros no dinheiro que os pais têm de enviar aos filhos para poderem sobreviver
naquele arquipélago é demais.
"Temos de
entregar documentos comprovatórios para termos o visto de residência. Com a
obrigatoriedade de termos 530 euros, todos os meses, fica muito difícil viver,
ainda por cima, o visto de residência para estudante não nos permite trabalhar,
e mais, a maioria vive com uma média de 300 euros", conta Nádia Cristina.
Medo
Diante das
exigências, quando o estudante não consegue reunir todos os requisitos de
renovação do visto atempadamente nas Canárias é-lhe apontado como solução
"regressar a Cabo Verde” e com os documentos retornar àquele arquipélago. "O
problema é que muitos optaram por este caminho e nunca mais regressaram, pois
são-lhes criadas barreiras em Cabo Verde", diz um dos estudantes ouvidos
pelo A NAÇÃO.
Um outro estudante,
que já está no último ano do curso, confidenciou-nos que está clandestino e que
não pensa, mesmo assim, regressar a Cabo Verde para renovar o visto. "Se
for não regresso, não me vão permitir. Portanto, prefiro continuar como estou;
arrisco todos os dias, já que para renovarmos a matrícula nas universidades não
nos pedem o visto renovado. Quando terminar os estudos, aí sim, regresso".
Sem os documentos
em dia, o estudante estrangeiro não pode concorrer a bolsas, nem circular nos
estados Shengen (Europa), etc. "O que mais lamento é não poder passar
férias em Cabo Verde. Como eu, vários outros colegas estão na mesma situação”.
Uma outra estudante
que tem dificuldades em pagar os estudos disse que contactou o actual ministro
do Ensino Superior, Ciência e Inovação (MESCI), António Correia e Silva, a quem
explicou a situação mas que até hoje espera por ajuda. "Ele fez uma
promessa, trocamos e-mail, disse-me que encaminhou o meu pedido para o
departamento que cuida desses assuntos. Disseram-me que já têm o resultado, mas
nunca mais soube de nada".
Diante de um tal
quadro os estudantes cabo-verdianos nas Canárias dizem-se abandonados pelo
governo do seu país. E diante dessa acusação este jornal tentou contactar o
MESCI, António Correia e Silva, para esclarecer essas questões, mas, até o
fecho da edição, não obtivemos nenhuma resposta. Isso não obstante ele saber do
nosso interesse há vários dias.
Sem comentários:
Enviar um comentário