João Goulão –
Jornal de Angola, opinião
A maioria dos
deputados do Parlamento da Ucrânia evitou, por ora, uma guerra civil mas
tornou-se parte de um golpe de Estado.
Todos os acordos
políticos estabelecidos entre o presidente Ianukovitch, agora demitido, e as
oposições, com envolvimento de países da União Europeia como a Polónia e a
França, foram efémeros e valeram no curto tempo que teriam de durar até à
vitória da facção dita “pró-europeia”.
O golpe consumou-se e suspende, em princípio, os confrontos, mas deixa em
aberto todos os problemas de fundo.
Foram marcadas eleições antecipadas para 25 de Maio. No Parlamento, depois da
demissão do presidente, Volodymyr Rybak, na sequência de ameaças de morte, foi
decidida a libertação de Tymochenko, a pessoa mais rica de um país de pobres,
mulher de actividades empresariais muito bem sucedidas nos Estados Unidos, até
agora a cumprir uma pena de sete anos por corrupção em negócios de gás com a
Rússia.
O “jogo”, a palavra escolhida pelo embaixador dos Estados Unidos em Kiev
para os acontecimentos na Ucrânia, vai continuar. Os peões das grandes
potências irão mover-se segundo as coordenadas internacionais e os ucranianos,
de Leste ou Oeste, de Norte ou Sul, têm o destino traçado: votarão sem ter voto
na matéria.
Quem ganhará? Klitschko, o candidato de Merkel e da União Europeia, o
boxeur democrata cristão que apropriadamente chefia o partido Udar
(Golpe) mas que Washington olha de esguelha? Timochenko, que deu com a
“revolução laranja” em pantanas e que agora manobrava da prisão através do seu
alter ego Arseni Iatseniouk, que os americanos escolheram como “o gajo”,
segundo a palavra da subscretária de Estado Nuland, que tem a pasta da
desestabilização da Ucrânia? Os fascistas de Tyahnibok, do partido Svoboda
(Liberdade), cujas milícias dirigidas por grupos treinados pela OTAN fizeram
das manifestações ditas pacíficas arruaças provocatórias? O Partido das
Regiões, dominante no leste russófono, mesmo que Viktor Ianukovitch tenha agora
caído em desgraça, abrindo as portas a uma guerra interna no seio da oligarquia
regional?
Muita coisa se vai escrever sobre a “batalha política” supostamente ucraniana,
como se ela pudesse funcionar à margem dos campos de batalha da nova guerra
fria, que não tarda a alastrar à Bielorrússia.
A mente maniqueísta da comunicação social neoliberal vai explicar que tudo se
decidirá entre entendimento que vier a ser formatado por “europeístas” e
“americanistas” e as “gentes de Moscovo”.
Por momentos os ucranianos acreditarão que alguma coisa mudou, mas não tardarão
a perceber que ao seu dispor vão ter mais da mesma miséria. No entanto há um
dado imprevisível e inquietante a ter em conta: as eleições ucranianas
vão coincidir com as europeias, nas quais se prevê uma afirmação sinistra do
retorno fascista. Atenção pois à prestação das hordas de Tyahnibok, aliado da
senhora Le Pen, dos neonazis holandeses, húngaros e de países do Báltico.
Elas foram as grandes vencedoras desta crise, pelo que alento e apoio não lhes
falta. E o seu hipotético êxito inflamará os renovados nacionalismos do Centro
e Leste da Europa, que ardem já em fogo nada brando.
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