Rui Peralta, Luanda
I - O Equador passa
por um momento de profunda transformação. Conservando as suas identidades
culturais (as hispânicas e as autóctones) o país constrói uma sociedade em que
o Homem sobreponha-se ao Capital. É evidente que esta difícil tarefa conta com
a oposição da oligarquia, que coloca a indústria mediática a atacar o rosto
visível da grande transformação em curso: o Presidente Rafael Correa. Correa é
retratado na imprensa oligárquica (e nas poucas vezes em que a industria
mediática internacional não ignora o Equador) como um “novo caudilho”.
Os sete anos de
revolução Cidadã não foram fáceis, nem isentos de desilusões. Quando a
Revolução iniciou a sua marcha, o país estava destroçado. Em dez anos o Equador
conheceu sete presidentes e em 1999 passou pela pior crise da sua História.
Nunca foi um país com tradição migratória, mas nesse período de crise, cerca de
dois milhões de equatorianos abandonaram o Equador. Províncias inteiras sofreram
um processo intensivo de desertificação. Na província de Chimborazo, por
exemplo, mais de 50% das crianças foram criadas sem conhecerem os pais, o que
originou um fenómeno crescente de suicídio infantil. Por sua vez os que
emigravam (maioritariamente para Espanha) não podiam regressar porque ficaram
ilegais nos países onde buscaram trabalho.
Em sete anos muita
coisa mudou, principalmente a atitude. A Revolução Cidadã demonstrou que o país
pode ser diferente. O factor de coesão social foi reactivado em torno de um
projecto nacional de desenvolvimento real, não aquele desenvolvimento que
apenas se reflecte nas estatísticas do PIB, nas carteiras dos ricos e nos
cartões de crédito das suas madames, mas um desenvolvimento social, que
reflectiu o crescimento económico na sociedade equatoriana. A Revolução Cidadã
aposta numa sociedade do conhecimento como chave do futuro e iniciou profundas
transformações na Educação.
A soberania dos
recursos foi um outro passo fundamental. A transformação do Equador irá inserir
o país na economia-mundo. Um país que aposta num mercado gerido pela sociedade
(e não uma sociedade dominada pelo mercado), que aposta no bem-estar, na
dignidade e na liberdade dos seus cidadãos e na necessidade de conhecimento,
fonte criadora de uma sociedade cosmopolita e pluridimensional.
Os centenários
atavismos culturais estão em fase de superação (este é sempre um processo lento
e melindroso). A desigualdade no género e a violência doméstica são apenas dois
exemplos que merecem a maior atenção por parte do executivo equatoriano e onde
se revelam já alguns avanços significativos. As mulheres equatorianas estão
ocupando espaços que ainda na década passada eram impensáveis. A presidente do
parlamento equatoriano é a presidente parlamentar mais jovem do mundo e os
membros do Supremo Tribunal de Justiça são eleitos em função das regras de
equidade do género. Actualmente 40% do executivo do país é formado por
mulheres. Estes factores são emblemáticos e exemplificativos das alterações
culturais em curso.
Em aberto permanece
a questão do aborto e o matrimónio homossexual, questões que ganham espaço de
discussão nos fóruns públicos e nas ruas, como movimentos reivindicativos de
direitos.
II - O combate á
pobreza e a diversificação da matriz produtiva são dois factores essenciais nas
políticas de desenvolvimento preconizadas pela Revolução Cidadã. Neste sentido
as questões ambientais são de primordial importância para este país. Também
aqui o combate á pobreza é levado a cabo, pois esta é um dos principais factores
que afectam o meio ambiente. A principal fonte de comunicação de água potável
do Equador não é o petróleo, nem a mineração, mas sim os resíduos dos esgotos e
as águas não tratadas, consequências dos atrasos e da ausência de sistemas de
sanidade pública e da imensa proliferação dos bairros pobres em torno das
cidades principais do país.
É na política
ambiental que é travado um braço de ferro com as transnacionais. Um caso que se
encontra no tribunal de Haia e que opõe a Chevron ao governo equatoriano é um
exemplo dos combates que as nações em processo de emancipação económica têm de
realizar pela soberania dos recursos. É provável que a decisão do tribunal de
Haia seja contrária ao Equador e favorável á Chevron, mas é não se pode
esquecer que estas instituições judiciais foram criadas pelo Capital e em
função da defesa dos seus interesses. Essa é uma frente de batalha que os
países em processo de emancipação terão de resolver em conjunto durante a sua
caminhada pelo desenvolvimento. No caso do Equador a integração no âmbito da
América Latina é a via a seguir, pois apenas com a integração os Estados da
região poderão criar mecanismos de comércio livre e justo, contrapondo os seus
interesses aos do Capital.
As recentes
negociações entre o Equador e a U.E. são elucidativos deste problema que os
Estados isolados têm de enfrentar, quando a questão seria muito diferente se os
mercados fossem integrados. A principal produção não petrolífera do Equador é a
banana. Ora, com a assinatura de um tratado de livre comércio entre a Colômbia
e a U.E. a banana colombiana ficou a um preços mais baixo que o da equatoriana.
Este é um dos muitos casos em que os países da região vêm os seus interesses
afectados ao assinarem tratados bilaterais. A Colômbia vende mais banana a um
preço mais baixo, afectando os seus produtores internos e afectando os países
vizinhos, que vêem-se na obrigação de baixar os preços ou de reduzir a
produção, o que implica problemas de diversa ordem como aumento do desemprego,
descontentamento, instabilidade, etc.. Com esta política, neste caso, lucra a
U.E. que compra as bananas mais baratas. As políticas de integração dos
mercados latino-americanas urgem em cada dia que passa porque o desenvolvimento
desta região passa por um processo transformador que deverá afectar a região no
seu todo, de forma a colmatar as assimetrias.
Inerentes aos
processos emancipadores e às suas dinâmicas de transformação e de
desenvolvimento, são as “doenças infantis”. No caso do processo equatoriano a
“crise de infantilidade” assentou a creche e o ATL em alguns sectores
ecologistas e em diversos grupos “verdes”, associações ambientalistas, etc..Se
fossem levadas a sério as políticas propostas por estes sectores (a “Esquerda
das sementes”, ou outras tendências folclóricas da esquerda burguesa –
“revolucionários” soft, produtos da ética dominante, “politicamente correcta” -
que pretende separar a questão ambiental da guerra de classes) o Equador
morreria de forme para preservar os recursos naturais (e o país recuaria no tempo,
provavelmente até á época das civilizações pré-colombianas).
Os bens ambientais
são bens públicos e têm de ser publicamente geridos, porque são bens produtores
de sustentabilidade e como tal devem ser considerados. O ar produzido pela
selva amazónica é disfrutado em todo o planeta, logo é globalmente consumido,
inclusive pelos contaminadores globais, pelos usurpadores de recursos e pelos
destruidores de bens ambientais. Não é objecto de privatização, nem de
nacionalização, nem de legislação proprietária como a propriedade industrial,
intelectual ou outra. Os bens ambientais são públicos, património de todos nós,
habitantes desta complexa nave espacial que transporta-nos, abriga-nos e
alimenta-nos. O Equador (ou qualquer outro Estado da região amazónica) não
poderá vender, nunca, o ar que a selva produz e que é consumido por todos os
consumidores do mundo.
Também o
conhecimento deveria ser um bem publico, universal, acessível e, globalizado.
Mas aí o caso muda de figura. Se um qualquer consumidor necessitar de um
software tem, depois de o pagar (o que nem sempre é possível, porque muita das
vezes não é um produto acessível) e cumprir com uma série de normas e
procedimentos de instalação (nas legislações mais fundamentalistas o consumidor
se adquirir o software por vias impróprias, como seja comprar uma “versão
pirata”, ou “pirateá-lo” está sujeito a multas ou a pena de prisão.
Esta política de
privatizar o conhecimento, de obrigar a pagar aos consumidores o preço pedido
pelo vendedor, de obrigar ao cumprimento de todos os procedimentos definidos
por leis referentes á propriedade industrial e intelectual, é a política que o
Ocidente utiliza para subordinar (e subornar) a América Latina, África e outras
zonas do globo, geralmente depositárias de vastos recursos naturais (e que a
ética dominante – a ética “neutral” do politicamente correcto e da
“imparcialidade” - considera deficitárias em “recursos humanos”, ou
impossibilitadas de potenciar o “capital humano”, zonas habitadas por “gentes”,
mas com poucas “pessoas”, no fundo a nova versão do “fardo do homem branco” de
Kippling, o poeta do “British Empire” do “Cabo ao Cairo e infinitamente mais
além”), através da tecnologia e do know-how (é o savoir-faire que é importantes
e não o “laissez-faire” que as elites ocidentais, da direita-nova á
esquerda-moderna, andam a propagar e que aprisiona de ilusões as elites
africanas com as tragicomédias do “afro-capitalismo” e do “crescimento
exponencial africano”, ou com o papel “civilizador dos mercados” na América
Latina).
III - No âmbito dos
tratados internacionais, o Equador renunciou ao ATPDEA com os USA, o seu
principal parceiro comercial. Este acordo significava 50 milhões de USD por
ano, a título de compensação pela luta antidroga. Nos últimos anos o ATPDEA foi
utilizado pelos USA como um instrumento de chantagem: ou portas-te bem ou
retiramos a verba. Quando foi do caso de Snowden, os USA ameaçaram o Equador
com a suspensão desta verba, caso o Equador desse asilo a Snowden. A resposta
do Equador foi imediata, rompendo com o acordo. Mas as ingerências dos USA são
efectuadas a diversos níveis.
O National
Endowment for Democracy (NDE) financiou, recentemente, uma agencia de noticias.
A agência em causa era conhecida pelas suas campanhas em prol da “liberdade de
expressão e de informação”. O financiamento não se destinou a uma cooperativa
de jornalistas ou a uma agência de informação regional, ou a um órgão de
comunicação universitário, enfim a qualquer projecto que tivesse nascido da
criatividade dos seus proponentes e que justificasse o financiamento. Não! O
financiamento foi para uma agencia que está ligada á oligarquia equatoriana,
que goza dos apoios dos mais ricos e que não necessita dos dólares USD da NDE
para nada, a não ser para utilizar na campanha contra a Revolução Cidadã, de
forma intimidatória, avisando que os “los yanquis están con nosotros”.
Para essa gente,
liberdade de expressão e liberdade de informação são sinonimo de CNN, FOX e
mais algumas siglas de intoxicação mediática, máquinas de destruição massiva,
extensões do Imperio e do Capital. Mas não é só por esta via que a ingerência é
realizada. A USAID assessorava o Parlamento equatoriano, na criação de leis.
Mas que legislação poderia provir de um poder legislativo assessorado pela
USAID? Claro está que o actual executivo rompeu com a “parceria”.
Uma comunicação
social que cumpra as suas funções, de forma livre e responsável (devendo aqui
serem amplos os critérios e os significados) é fundamental em qualquer
sociedade (e são casos raros, os existentes). Para que isso aconteça e o
direito á informação e de liberdade de expressão não se tornem formalidades e
camuflagens, é necessário rever o paradigma: a propriedade privada dos meios de
comunicação social (esse paradigma tem de ser revisto em muitos outros
sectores, como a saúde, a educação, a habitação, os transportes, etc.).
Os cidadãos têm de
controlar todo o poder, logo, também, o mediático. Esse controlo não tem nada
de controlo sobre a opinião, censura e outras aberrações que hoje praticam-se diariamente
sob o signo do direito de informar e de ser informado e da liberdade de
expressão. O controlo deve ser exercido nos meios de comunicação privados e nos
meios de comunicação estatais, pois são esses que representam interesses muito
específicos e que podem constituir (e constituem) monopólios de manipulação e
condicionamento da opinião pública.
Quando fica patente
que a política seguida reflecte-se na soberania dos recursos existe de imediato
diversas reacções (da mais encolerizada á mais serena, passando pelos avisos
apenas lidos nas entrelinhas) por parte dos Estados hegemónicos e dos grupos
transnacionais privados. Um dos instrumentos utilizados pelas potencias
externas (Estados e grupos transnacionais privados) e pelos interesses internos
(a burguesia nacional apenas aceita a “parceria dos recursos”, seja com o
Estado seja com os grupos externos) são as ONG,
As ONG detêm no que
respeita às questões de soberania dos recursos e na criação de espaços
alternativos um papel fundamental…Na ingerência externa e no bloqueio interno
(o boicote)! Financiadas a partir do exterior, as ONG, representam diversas
funções vitais de infiltração, vigilância, análise e informação a favor dos
interesses hegemónicos ou mesmo de interesses privados de grupos multinacionais.
Os seus fundos não são controlados e são uns dos instrumentos mais perigosos do
neocolonialismo e dos interesses imperialistas.
Rodeadas de boas
intenções, sempre na base do politicamente correcto, representantes exemplares
da nova ética dominante (globalmente mentecapta e sempre bem comportada, isenta
e angélica) as ONG internacionais ou nacionais, são, cada vez mais, um espelho
daquela velha figura de retórica, tantas vezes empregue na linguagem comum:
“Farinha do mesmo saco”! Vejamos a história da maioria das ONG ditas
“nacionais” (aquelas que não vêm do exterior montarem estruturas alienígenas,
fundamentos da neocolonização cultural): Um candidato perdeu eleições, monta
uma ONG financiada a partir do exterior e torna-se “representante da sociedade
civil”. Desta forma mandou bugiar o escrutínio popular e prossegue a sua
actividade “politico-comercial-filantrópica”, tornando-se um “activista”, um
elemento “activo e consciente dos seus deveres éticos”. E causas há muitas:
meninos de rua, órfãos, 3ª idade, empreendedorismo, juventude, imensas questões
ecológicas e ambientais, animais para proteger, espécies em extinção, formação
profissional, guerra, paz, refugiados, pobreza, etc., etc..
IV - Os gastos
militares do Equador aumentaram nos últimos anos, não devido ao rearmamento, ou
ao reequipamento, mas ao aumento dos soldos, dos salários e das condições de
vida dos soldados. O objectivo é reduzir os efectivos militares e
simultaneamente aumentar a qualidade dos meios defensivos. Quando em 2008 a CIA
e o Exército colombiano penetraram em território equatoriano e bombardearam
áreas fronteiriças em território colombiano (quando da operação que eliminou o
comandante Reys, das Forças Armadas Revolucionária da Columbia – Exército
Popular, que refugiara-se no Equador), a agressão não foi detectado devido á
inexistência de radares. Actualmente a cobertura de radares abrange todo o
território nacional.
As Forças Armadas
do Equador adquiriram recentemente aviões não pilotados (drones) de tecnologia
avançada e de grande valor estratégico. Este processo de modernização das
forças armadas faz parte de um mais vasto projecto integral de desenvolvimento
cientifico-tecnológico e de diversificação da matriz produtiva. Quando a
Revolução Cidadã começou as Forças Armadas possuíam apenas um helicóptero em
funcionamento, o que era ridículo atendendo ao facto de 40% do território
nacional ser selva e não existirem meios aéreos de vigilância. Hoje a Força
Aérea Equatoriana está apetrechada com 18 helicópteros Super Tucano, adquiridos
ao Brasil e 12 caças Cheetah, adquiridos em segunda mão á África do Sul.
O Equador foi um dos signatários da declaração
“América Latina, Zona de Paz” aprovada pela CELAC. A importância desta
declaração reside no conceito de Paz: não só a ausência de guerra, ausência de
imposição militar, mas também da imposição das elites, dos sistemas de
desenvolvimento geradores de exclusão social e da violência implícita na
contradição entre ricos e pobres, entre detentores de propriedade (as várias e
diversas camadas e subcamadas burguesas – da grande burguesia de vários
sectores á pequena burguesia titubeante, passando pela média burguesia, ora
deslumbrada, ora assustada – e os sectores oligárquicos da sociedade
equatoriana) e os qua não detêm propriedade (os proletários, conforme indica o
seu próprio nome e que hoje ninguém gosta de ouvir falar, sendo diluídos na
designação, mais generalista, “pobres”). Nesta declaração da CELAC a paz é
entendida como a presença da justiça social, da equidade e da dignidade. Obviamente
que a implementação destas condições não é efectuada por decreto ou por uma
declaração, mas sim com trabalho quotidiano, no sentido da integração
latino-americana.
A criação da CELAC
foi uma prova da aspiração
latino-americana em procurar a sua emancipação e de se afirmar como igual
perante o gigante do Norte, cuja hegemonia, apesar de debilitada, continua a
ser um factor de potencial risco para os povos das Américas do Sul, Central e
Caribe. A CELAC é um foro multilateral, composto por uma enorme diversidade de
interesses (em que alguns estados até têm maior identificação e sólidas
relações com os USA), enquanto a UNASUR é um espaço de integração focado na
execução de políticas e de criação de infraestruturas e conselhos de defesa. Por
sua vez a MERCOSUR é um espaço regional de integração dos mercados, de
importância vital para a região. A estas estruturas de integração contrapõe-se
a Aliança do Pacifico, uma criação dos USA que reúne os sectores contrários ao
rumo da integração. É evidente que a integração latino-americana implicará uma
nova dinâmica nos mercados do Pacifico o que constitui uma ameaça á geoeconomia
dos USA, para a qual o Pacifico é de importância vital (um “mare nostrum”).
É fundamental não
perder de vista os objectivos políticos, sociais e culturais da integração, mas
eles têm de ser realizados de forma pragmática, o que implica avançar com a
integração na esfera mais básica de todos os processos históricos de
integração, porque a mais necessitada de se posicionar na economia-mundo: os
mercados.
V - A milhares de
quilómetros do Equador (e a milhares de anos-luz da Revolução Cidadã), os
ruídos e o ribombar da artilharia fustigam a velha cidade de Homs, na Síria. A
intensidade dos combates destrói a cidade, como se tratasse de uma imensa
operação demolidora. Ao contrário de Damasco, onde as lojas estão abertas até á
noite e tráfego permanece intenso, mesmo no período nocturno, em Homs as ruas
estão desertas.
Os bandos armados
encontram-se sitiados no distrito de Bab al Sebaa e são formados por cerca de
mil combatentes. As marcas de destruição estão espalhadas por toda a cidade,
mas este distrito é conhecido por ser a “zona fantasma” devido á destruição
provocada pelos combates. É curioso que sempre que os bandos armados estão em
apuros, a indústria mediática internacional começa a falar em “ajuda
humanitária” seguindo o guião escrito pela NATO e pelos oligarcas do Golfo. Em
Homs não faltam alimentos, mas sim armas e munições, para resistir á agressão
estrangeira e às forças internas a soldo do imperialismo.
Homs, cidade e
província, é muito idêntica ao Líbano, no que respeita ao mosaico cultural. A
religião (islâmicos sunitas e xiitas, cristãos de diversas matizes) e os grupos
étnicos (alauitas, curdos, arménios) constituem partes do mosaico e muitas
vezes são apenas pontas visíveis de um imenso e complexo icebergue. Os alauitas
constituem o grosso da Força de Defesa Nacional, milícias pró-governamentais do
partido BAAS e combatem ao lado do Exército Sírio, das milícias xiitas do Hezbollah
e das milícias curdas.
Já os bandos
armados são compostos maioritariamente por sunitas, que habitam no distrito de
al-Waar, onde se encontram refugiadas mais de 400 mil pessoas, que ficaram numa
situação difícil, pois o al-Waar é um distrito sitiado e esta é uma área da
cidade que é merecedora de alguma atenção humanitária, embora – curiosamente –
não seja referida nos relatórios da ajuda humanitária, que refere Homs de uma
forma abstracta, não sabendo muitas vezes se esses relatórios referem Homs como
cidade ou Homs como província.
A província de Homs
alberga pouco mais de um milhão e setecentas mil pessoas. O representante local
da UNICEF, Godfrey Ijumba, refere a existência de cerca de 600 mil desalojados
e que a UNICEF distribuiu roupa de inverno a meio milhão de habitantes. Homs
converteu-se em assunto internacional na Conferencia de Paz de Genebra II, até
agora produtora de impasses políticos e diplomáticos.
Não sei se os ecos
da Revolução Cidadã chegarão á Síria, mas sei que os sírios aspiram á Paz,
desde que seja mantida a soberania e a integridade do país. Quando a Paz chegar
e a agressão terminar, os sírios estarão em condições de realizar, de forma
soberana, as transformações necessárias para que a Síria assuma o seu destino
de acordo com as decisões da soberania popular. Até lá o som das armas
permanecerá sendo a única busca possível de paz e a luta contra a agressão
imperialista constitui-se em prioridade.
Se no Quito sopram
os ventos da emancipação, em Damasco as tempestades tomam conta dos céus…Mas,
no fundo, Quito, Damasco, Homs estão juntas nas aspirações por um mundo
diferente. Pelo menos um mundo onde parem as agressões e se deixe de ouvir o
troar dos canhões. Um mundo onde a vida seja um acto de dignidade e não uma
constante humilhação. Mesmo que os caminhos para lá chegar sejam diversos,
difíceis e impliquem longas caminhadas e complexas encruzilhadas.
Fontes
The Independent,
February, 5, 2014
Wall Street Journal
February, 3, 2014
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