Avanço
de radicais sunitas do EIIL abala fronteiras artificiais criadas na região após
a Primeira Guerra. Solução do conflito passa por aliança entre iranianos e
sauditas, opina Loay Mudhoon, da redação árabe da DW.
Sem
dúvida, o surpreendente avanço, no Iraque, da milícia radical-sunita Estado
Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL) redefiniu as relações de força no
Oriente Médio. Pois os jihadistas da Idade da Pedra conseguiram, em apenas
poucos dias e sem resistência considerável do Exército nacional, assumir o
controle sobre grandes territórios no oeste do país, entre eles a segunda maior
cidade iraquiana, Mossul.
Os
combatentes do EIIL já devem ter estabilizado sua base de poder naquela parte
do país, que tem forte presença sunita. E detêm ainda o controle sobre amplas
áreas no leste da Síria, ao longo do Rio Eufrates.
Além
disso, tudo indica que conseguiram dominar uma estrategicamente importante
passagem de fronteira para a Síria. Desse modo, deixa de existir, de fato, a
fronteira entre os dois Estados onde os "guerreiros de Alá" pretendem
construir um califado jihadista.
Será
que a galopante desintegração do Estado no Iraque – e também na Síria –
significa o fim da ordem estabelecida pelo acordo de Sykes-Picot, como afirmam
numerosos observadores e peritos em Oriente Médio ? E, caso positivo, o que virá após
essa ordem "pós-otomana"?
Recapitulando:
o presente grupo de países no Oriente Médio se baseia nas fronteiras
estipuladas no acordo negociado em 1916 pelo militar britânico Mark Sykes e
pelo diplomata francês François Georges-Picot, as quais definem a geografia
política da região até hoje. Os atuais Estados entre o Mar Mediterrâneo e o Rio
Tigre foram fundados a partir desse acordo, ao lado de outros pactos
posteriores à Primeira Guerra Mundial.
O
avanço da milícia do EIIL no Iraque representa, inegavelmente, uma grande
ameaça terrorista para a região. Mas um exame mais atento revela que esse
desdobramento não passa de um sintoma para problemas regionais mais profundos.
A
fragilidade dos Estados é o problema principal. Três anos atrás, a Primavera
Árabe demonstrou de forma expressiva quão fracos são os Estados árabes
pós-coloniais, em especial na Líbia e na Síria. Antes, a incompetente
administração de George W. Bush nos Estados Unidos precipitara o Iraque
repetidamente no caos, numa inigualável série de erros.
Acima
de tudo, provou ser um erro fatal o apoio americano a Nuri al-Maliki. Devido a
sua política sectária, o primeiro-ministro xiita arca, pessoalmente, com a
maior parte da responsabilidade pela alienação de sunitas e curdos – e, em
consequência, pela desintegração do Iraque pós-Saddam Hussein. A política
discriminatória de Al-Maliki preparou o solo para a ascensão do EIIL e outros
grupos partidários da jihad – a "guerra santa" muçulmana.
A
esses conflitos sobrepõe-se, ainda, a luta pela supremacia regional entre o Irã
e a Arábia Saudita. Esse conflito pela hegemonia exacerba a velha hostilidade
entre sunitas e xiitas e a instrumentaliza politicamente, o que bloqueia todas
as tentativas de propor soluções pragmáticas para os conflitos.
Alianças
pragmáticas é o que a situação exige, após o fracasso na Síria e visando manter
sob controle, o máximo possível, as ameaças de conflitos transfronteiriços
criadas pelo EIIL.
Pelo
menos as lideranças em Teerã e em Riad parecem ter reconhecido que, fora de
qualquer controle, os jihadistas do grupo extremista portam riscos
incalculáveis para ambos os países – até porque Estados em desintegração são
algo que Irã e Arábia Saudita realmente não precisam na região.
Uma
vez que o momentaneamente debilitado Ocidente não é capaz de atuar como poder
ordenador externo, ele depende do auxílio das potências regionais. Por isso, os
EUA deveriam aproveitar a linha telefônica direta entre o presidente iraniano
Hassan Rohani e o rei saudita Abdullah para possibilitar um governo de unidade
nacional no Iraque, naturalmente sem o fracassado Al-Maliki.
No
melhor dos casos, esse seria o primeiro passo para a criação de uma nova
estrutura de cooperação no Oriente Médio, já que com os jihadistas não é
possível se fundar nenhum Estado. Também por causa disso ainda é cedo para se
falar de um fim do sistema Sykes-Picot na região.
Deutsche Welle – Autoria: Loay
Mudhoon (av) – Edição: Alexandre Schossler
Em
meio ao avanço dos radicais sunitas, Kerry faz visita surpresa ao Iraque - Em
encontro a portas fechadas com primeiro-ministro iraquiano, secretário de
Estado dos EUA discute segurança no país diante do avanço de insurgentes
islâmicos. Estados Unidos pedem governo inclusivo no Iraque. (23.06.2014)
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