quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Brasil: PARA JORNALISTA, IMPRENSA NEGRA É VOZ ATUANTE CONTRA MAZELAS



Afropress

S. Paulo – “A mídia e a comunicação, em geral, é um instrumento de força, inclusive para pressionar a Justiça a promover a Igualdade”. A opinião é do jornalista Rosenildo Ferreira, Editor-assistente e colunista da Isto é Dinheiro, escolhido em eleição recente promovida pela MaxPress e Jornalistas & Cia, um dos 100 mais admirados jornalistas do Brasil.

Carioca, nascido em Campos dos Goytacazes, ele trabalhou nos mais importantes veículos do país como O Estado de S. Paulo, Gazeta Mercantil, Rádio Jornal do Brasil e Correio Braziliense, em Brasília, e como correspondente do jornal em Londres, Rosenildo lançou o Projeto Colaborativo 1 Papo Reto, que pretende discutir “a sustentabilidade nos mais variados aspectos do dia a dia e das atividades das pessoas, como consumo, economia, política, cidadania e ecologia”.

O Papo Reto leva adiante esse objetivo por meio de reportagens, artigos originais escritos por um time de blogueiros, chamados de Griots, e colunistas convidados. No momento, o jornalista trabalha no Prêmio Empreendedor Sustentável, edição 2014, que terá os vencedores conhecidos em janeiro, em solenidade pública, em S. Paulo. Foram escolhidos 50 empreendedores das mais diferentes áreas e 20 serão escolhidos como os maiores empreendedores sustentáveis.

“O Prêmio completa a série de projetos especiais jornalísticos nos quais nossa equipe se debruça ao longo do ano, incluindo os seguintes temas: Agroenergia, Mobilidade Urbana, Dia Mundial do Meio Ambiente, Resíduos Sólidos e Energias Renováveis. Nos quais procuramos debater as ideias, a partir de um ângulo mais original e sem “correr atrás” de culpados”, afirmou.

O jornalista, que nas horas de folga atua como professor voluntário de Ética, Direitos Humanos e Atualidades no Cursinho do Coletivo Griot XX de Novembro, na comunidade São Remo, e também escreve na Revista Afirmativa Plural, da Afrobras, falou para a Afropress, dos planos e projetos e reiterou a importância da mídia focada na temática étnicorracial brasileira.

“A imprensa, ao longo da fundação do Brasil, sempre foi uma voz atuante na denúncia das mazelas. A chamada imprensa negra foi uma voz atuante na denúncia contra as mazelas do sistema e a favor das garantias individuais. A imprensa tem um papel relevante e até essencial. Mas cabe à Justiça agir de forma definitiva contra as mazelas de nossa sociedade. A maior delas, sem dúvida, é o racismo. Pois ele, especialmente no Brasil, condena quase metade da população formada por afrobrasileiros a disputar as migalhas de um país que ajuda a erguer no dia a dia”, acrescentou.

Veja, na íntegra a entrevista do Editor Assistente da Isto é Dinheiro.

Afropress - O que é o Projeto Papo Reto e há quanto tempo acontece o Prêmio Empreendedor Sustentável?

Rosenildo Ferreira - O portal de internet www.1paporeto.com.br é a parte mais visível da start up Projeto Colaborativo 1 Papo Reto, cuja ambição é discutir a sustentabilidade nos mais variados aspectos de nosso dia a dia e de nossas atividades: consumo, economia, política, cidadania e ecologia. Fazemos isso por meio de reportagens, artigos originais escritos por um time de blogueiros, carinhosamente chamados de Griots, e colunistas convidados. Também atuamos com curadoria, selecionando o que de melhor rola pela rede, no Brasil e no exterior, para apresentar ao nosso público alvo: pessoas ente 18 e 40 anos integrantes das classes C e B. Além do portal de internet também contamos com um programa na rádio Mega Brasil on line. Os próximos desdobramentos deste negócio serão a abertura de um canal de TV no Youtube, uma editora e uma produtora. Tudo isso tendo como foco o mundo digital.

O Prêmio Empreendedor Sustentável surgiu da necessidade de tentar mudar um pouco a pauta da imprensa. É que mesmo no campo da sustentabilidade vem prevalecendo notícias mostrando o que está errado. Consideramos não apenas válida como também necessária e urgente a denúncia séria e fundamentada. Contudo, achamos que a missão de tentar construir um mundo melhor passa pela disseminação dos exemplos positivos. E nada melhor que fazer uma singela homenagem àqueles que partem para as soluções, transformando os limões da vida e suculentas e refrescantes limonadas.

O Prêmio completa a série de projetos especiais jornalísticos nos quais nossa equipe se debruça ao longo do ano, incluindo os seguintes temas: Agroenergia, Mobilidade Urbana, Dia Mundial do Meio Ambiente, Resíduos Sólidos e Energias Renováveis. Nos quais procuramos debater as ideias, a partir de um ângulo mais original e sem “correr atrás” de culpados.

Afropress - Qual é o objetivo do Prêmio e como é organizado a indicação e a escolha dos ganhadores?

RF - O Prêmio nasceu então como uma forma de ampliar a dimensão do Projeto Colaborativo 1 Papo Reto. Para isso, fizemos uma rigorosa seleção de pessoas e iniciativas inovadoras. A base é a leitura atenta de jornais e revistas, dos sites de organismos de pesquisa e também dos portais de internet dedicados ao tema empreendedorismo. Aqui e no exterior. Muitas das ideais selecionadas nesta primeira edição do Prêmio são velhas conhecidas daquelas que militam no chamado Terceiro Setor. Contudo, acreditamos que elas não haviam sido contadas com o devido carinho ou relacionando sua existência como sendo uma prática sustentável, capaz de ser replicada.

Feita a seleção inicial, me fixei em 50 nomes, sobre os quais escrevi textos curtos, informativos e destinados a apresentar o projeto/iniciativa/atividade. As histórias foram reunidas em uma editoria específica do portalwww.1paporeto.com.br e enviadas a um seleto grupo de jurados (veja relação completa no link abaixo). Coube a eles pontuar cada uma das iniciativas de acordo com três critérios: relevância, alcance e relação custo-benefício.

Desta forma creio que conseguimos equalizar iniciativas multimilionárias, como a criação da primeira usina de etanol de segunda geração, do Brasil, com ações como o lançamento de um jornal comunitário, feito no esquema fanzine e que representou o início da libertação cidadã de uma comunidade na periferia de Salvador. Ou mesmo a iniciativa de um surfista-ativista que, de forma isolada e meio quixotesca, foi para o calçadão de Ipanema (RJ) fazer um protesto contra a poluição das praias e hoje lidera uma das mais vigorosas iniciativas nesta área.


Afropress -  Quantos são os participantes da edição 2014?

RF - Então, o júri analisou cada um dos 50 casos/iniciativas/empreendimentos e atribuiu notas de acordo com os parâmetros citados acima. Como um Prêmio só fica marcante com festa e a entrega de placas/troféus resolvemos fazer um evento corporativo e de relacionamento reunindo pessoal o Terceiro Setor, empresários da Nova Economia e outros empreendedores, em uma celebração do bem. A ideia é iniciar 2015 com boas notícias.

Coube a 1 Papo Reto apenas a tarefa de tabular as notas e ranquear os 20 mais bem votados. Somente.  Todas as 50 histórias serão reunidas em um livro, que será publicado no primeiro semestre de 2015. Dessa vez, nos rendemos ao papel (!!!), mas também teremos a versão digital com extras, como depoimentos em vídeo etc.

A segunda edição do Prêmio, em 2015, reunirá outras 50 personalidades/ideais e ações, do Brasil e do exterior, que serão analisadas por um novo júri. Esperamos fazer deste Prêmio um marco da sustentabilidade no Brasil.

Afropress - Quando serão divulgados os nomes dos ganhadores?

RF - Os 20 ganhadores serão conhecidos, por meio de posts na internet e anúncios ao longo do mês de Novembro/Dezembro. A festa acontece em 12/01/2015 e na ocasião iremos reuní-los na celebração.

Afropress -  Fale um pouco da sua história de vida e trajetória profissional.

RF - Sou quase um cidadão do mundo. Nasci em Campos dos Goytacazes, fui muito cedo morar em Duque de Caixas, Bento Ribeiro, Del Castilho, Madureira, Grajaú, Brasília e Londres. Estudei na Universidade Gama Filho, onde me graduei em comunicação social, e trabalhei em algumas das mais importantes publicações do país: O Estado de São Paulo, Gazeta Mercantil, rádio Jornal do Brasil e Correio Braziliense, no Rio de Janeiro, em Brasília e em Londres. Sou filho de um professor de português e literatura e de uma modelista. Na carreira de jornalista me especializei em economia, negócios e sustentabilidade. Em São Paulo desde 1994, além de empreendedor de internet atuo como editor-assistente e colunista na revista IstoÉ Dinheiro. Em minhas horas de folga atua como professor-voluntário de ética, direitos humanos e atualidades no cursinho do Coletivo Griot XX de Novembro, na comunidade São Remo. Também escrevo, de forma voluntária, na revista Afirmativa Plural, da Afrobras, sou membro do conselho consultivo da Faculdade Zumbi dos Palmares.

Afropress - Como jornalista, como vê o papel da comunicação na denúncia, no combate e na superação do racismo no Brasil?

RF - A imprensa, ao longo da fundação do Brasil, sempre foi uma voz atuante ma denúncia das mazelas. No Brasil colônia, a imprensa era proibida. Por conta disso, o primeiro jornal brasileiro, o Correio Braziliense, era editado em Londres por Hipólito da Costa. Outro grande destaque da imprensa nacional foram as experiências de mídia étnica ao longo dos séculos XIX e XX. A chamada imprensa negra foi uma voz atuante na denúncia contra as mazelas do sistema e a favor das garantias individuais. A imprensa tem um papel relevante e até essencial. Mas cabe à Justiça agir de forma definitiva contra as mazelas de nossa sociedade.

A maior delas, sem dúvida, é o racismo. Pois ele, especialmente no Brasil, condena quase metade da população formada por afrobrasileiros a disputar as migalhas de um país que ajuda a erguer no dia a dia. A mídia e a comunicação em geral é um instrumento de força, inclusive para pressionar a Justiça a promover a igualdade.

Afropress - Como está analisando o atual momento político do país, e o papel da população negra que é majoritária na sociedade, mas que segue invisível nas campanhas e nas agendas das políticas públicas dos governos?

RF - Em artigo recente na revista da Afrobras pontuei que a comunidade afrobrasileira foi aprisionada em um enredo, o da classe C, que acabou diluindo suas demandas históricas. A questão da pobreza no Brasil em elação direta com a cor da pele. Sabemos disso quando entramos em um supermercado, quando entramos em um shopping Center ou quando fazemos sinal para um táxi. Atitudes cotidianas, mas que, no caso dos afrobrasileiros, se traveste muitas vezes de um verdadeiro desafio. A noção e as teses de que a questão é de renda e não de cor da pele, não resiste a uma simples comprovação. Basta enviarmos dois jovens a um restaurante: um branco e outro negro, vestidos igualzinho. Adivinhe que será atendido melhor e quem será seguido pelo segurança... Essa é fácil, né!?

Afropress - Faça as considerações que julgar pertinentes.

RF - Acredito que a promoção da diversidade é um trabalho que deve ser exercido no dia a dia. Quando contratamos serviços ou compramos produtos, por que, quase nunca, ou nunca, questionamos a inexistência de afrobrasileiros no recinto?  Não existem por que não cobramos sua presença. Sim, a comunidade negra se deixou levar pela Síndrome de Estocolmo. Os 400 anos de exploração sistemática fizeram grudar na cabeça de muitos irmãos que temos de nos conformar com o que vemos por aí. Uma TV que mostra apenas 30% da população brasileira, onde os afrobrasileiros não arranjam emprego porque não têm “boa aparência”, e porque o mundo é assim mesmo. Não, não é! Nunca foi! Nosso dinheiro vale tanto quanto o dos demais brasileiros. Os impostos que pagamos são os mesmos. Logo, deveríamos ter o mesmo direito em todos os níveis. Se não os temos, é porque muitas vezes nos deixamos levar por um enredo que nos colocou na subserviência, nos convencendo que este era o nosso lugar.

Quando fiz a relação do Prêmio Empreendedor Sustentável, procurei lançar luzes sobre um número bastante diverso de empreendedores. Das iniciativas teoricamente mais simples até as mais complexas, na prática. Não fiz uma espécie de cota... Muito pelo contrário. O que fiz de fundamental foi não excluir as pessoas pela cor ou o seu lugar de origem. Ganhamos todos. Especialmente a cidadania.

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