Francisco Louçã – Público, opinião
Confrontado
com as declarações de Merkel sobre o exagero de licenciados em Portugal, Crato
terá reafirmado que não temos excesso de pessoas que concluíram a
universidade. Fez bem em responder à chanceler e tem razão na sua afirmação,
como se verifica pelo gráfico (clique para ampliar): segundo os números do
Eurostat, referentes a 2013, Portugal tem uma percentagem de licenciados na
população que é menor do que a da Alemanha (e do que a da média europeia).
Mas
isto não encerra toda a questão. É que Crato não quis responder ao segundo
argumento de Merkel, que era o mais importante. Dizia a chanceler que, tendo
licenciados a mais, Portugal (e Espanha) querem manter tudo na mesma e não se
dedicam a abrir as vias profissionalizantes. Ora, é de lembrar que, com este
governo e este ministro, a troika e, em particular o governo alemão, exigiu que
metade dos estudantes fosse encaminhada para o ensino profissional. Crato foi
um entusiasta desta medida: ter-lhe-á escapado a conta elementar que torna
evidente que, deste modo, haveria sempre redução de acesso às universidades?
Mais ainda, o ministro decidiu impor aos politécnicos uns cursos de dois anos,
que são a redução do ensino superior a uma versão tupiniquim do ensino
profissional alemão, para satisfazer a tal exigência. Ou seja, Crato foi o mais
merkeliano dos ministros da educação e, portanto, estranha-se que estranhe que
Merkel tire conclusões do atraso da aplicação da sua vontade. Alguém não está a
ser coerente, e não me parece que seja Merkel.
Mas,
como o gráfico demonstra, Merkel pretende para Portugal o que não pretende para
a Alemanha. Portugal deve especializar-se em trabalhadores de especialização
média, abdicando ou reduzindo-se na disputa do conhecimento, que é o centro da
vida do ensino superior. Um paraíso para a deslocalização de empresas de
trabalho a salário baixo.
Fica
finalmente a pergunta: haverá um dia um primeiro-ministro de Portugal que faça
um discurso sobre as deficiências do sistema de educação na Alemanha e o que
nele deve ser corrigido?
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