As
lavas, fruto da erupção vulcânica, avançam sem misericórdia sobre Chã das
Caldeiras. Ontem, terça-feira, foi o dia mais difícil. A fúria do vulcão foi
bem forte e a lava engoliu uma boa parte da Portela. Já a situação de hoje é de
alguma acalmia na Chã, com o abrandamento da actividade vulcânica nas últimas
horas. Mas a lava caminha lentamente em direcção às Igrejas Católica e
Adventista.
O
dia de ontem foi de desalento, desespero e tristeza. Viu-se uma parte da
Portela, principal povoação da Chã, a ser engolida pelas lavas. Escola, Hotel
Pedra Brabo, Unidade Sanitária de Base, Delegação Municipal e várias casas
ficaram debaixo do manto negro das lavas.
Dezenas
de pessoas presenciaram esta fúria da natureza com os olhos húmidos, dentes
cerrados e abanando a cabeça. Não acreditavam naquilo que estavam a ver. Como
que a tentar reunir forças dentro de si para travar ou empurrar as lavas. Mas o
ritmo da corrente de lava continua implacável, imprevisível e não mostra sinais
de trégua.
Contabilizam-se
60 casas e mais de 52 cisternas destruídas pelas lavas. Foram engolidos ainda a
Sede do Parque Natural do Fogo, a Escola do Ensino Básico, o Hotel Pedra Brabo,
as estradas de acesso à Chã das Caldeiras, vários hectares de terreno com
milhares de plantas frutíferas.
Felizmente
não há mortes a lamentar. Apenas prejuízos materiais avultados, que podem
aumentar nos próximos dias e que obrigam os populares e autoridades a fazer
contas à vida. Nesta manhã de quarta-feira, as lavas caminham lentamente em
direcção as Igrejas Católica e Adventista e estão a menos de 50 metros da Adega de
vinho.
Durante
o dia de ontem, o trabalho foi intenso na Adega para transferir com uma
motobomba mais de 150 mil litros de vinho para um local seguro. No que diz
respeito ao acesso, máquinas trabalham a todo vapor para a reabertura de uma
via alternativa.
“Homi
Grande” um amigo eterno.
Para
muitos moradores, a Chã continua a ser um local de admiração. Lembram que o
vulcão, apelidado “Homi Grandi”, deu aos solos uma das maiores potências
agrícolas de Cabo Verde e um filão turístico. Tirou tudo nos últimos dias,
consumindo lentamente infra-estruturas, casas, campos de cultivo. Mas, mesmo
assim, consideram-no “um amigo”.
Teodoro
Montrond é natural da Portela, viu a sua casa ser engolida pelas lavas
vulcânicas. Diz-se triste, mas não decepcionado com o “Homi Grandi”. Guia
turístico de profissão, este jovem de 30 anos conta que o vulcão deu-lhe e
tirou-lhe tudo: "Mas acredito que amanhã volta a devolver-me tudo em
dobro", afirma confiante.
Montrond
acredita que a Chã vai reerguer para voltar a ser um grande atractivo turístico
e um pólo de desenvolvimento da ilha do Fogo. Consciente do perigo, uma das
preocupações deste jovem é que no futuro, "as autoridades venham
impedi-los de voltar à Chã".
Já
a jovem Carla Fernandes (Nena), 26 anos, é uma das 290 habitantes desalojadas
de Portela que encontraram refúgio no centro de acolhimento em Achada Furna. Perdeu
a sua casa, mas não sente raiva do vulcão. “São coisas da natureza”, diz. A
jovem diz que não quer investir mais na Chã, mas pensa voltar para trabalhar na
agricultura.
O
futuro neste momento é incerto. “Estamos à espera das autoridades. Eles sim
sabem o que podem fazer connosco. Não sei o que poderá acontecer daqui para
frente”, disse a outra jovem Kelita Barros, ao asemanaonline.
Versão
idêntica têm outros moradores com quem conversamos. Mostram-se convictos de
que, apesar da tristeza e da angústia, continua a esperança “a vida não pára
aqui. Agora é hora de levantar a cabeça e seguir em frente, procurando
soluções”, dizem.
Nicolau
Centeio – A Semana (cv)
Sem comentários:
Enviar um comentário