Autoridades
confirmam detenção de porta-voz da RENAMO mas negam que a mesma tenha ocorrido
no recinto da Presidência da República e não se pronunciam publicamente sobre o
conteúdo da acusação.
Em
Moçambique, o Governo e a Polícia confirmaram a detenção, esta segunda feira
(7.07) do membro do Conselho de Estado e porta-voz do líder do maior partido da
oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), António Muchanga. No
entanto, 24 horas após a detenção, as autoridades ainda não fizeram qualquer
pronunciamento público em relação ao conteúdo da indiciação que pesa sobre o
detido.
Tanto
o porta-voz do Governo, Alberto Nkutumula, como o Comando-Geral da Polícia
afirmaram que a detenção teve lugar na avenida Julius Nyerere, próximo do Cinema
Xenon. "Houve uma solicitação da Procuradoria Geral da República para que
fosse retirada a imunidade de um membro do Conselho de Estado por forma a que,
de acordo com a lei, fosse ouvido em perguntas" afirmou Alberto Nkutumula,
acrescentando que o Conselho de Estado "deliberou que devia cooperar com a
Justiça, daí ter retirado a imunidade". "O conteúdo da
acusação", explica ainda o porta-voz do Governo, "não constava do
documento".
Fontes
da RENAMO, nomeadamente o membro do Conselho de Estado Manuel Lole e o chefe da
delegação da RENAMO nas negociações com o Governo, Saimone Macuiane, tinham
afirmado que a detenção ocorreu no recinto da Presidência da República, quando
Muchanga saía de uma sessão do Conselho de Estado. Macuiane considera que esta
detenção constitui um recuo após 63 rondas negociais visando encontrar uma
solução para a crise político-militar no país.
"Se
ele foi ao Conselho de Estado em representação do nosso partido, penso que
merecia algum tratamento neste órgão, independentemente de qualquer outro
assunto que pudesse vir a ser tratado", afirma o chefe da delegação da
RENAMO.
Detenção
peca por tardia, diz FRELIMO
De
acordo com a agência Lusa, o porta-voz da RENAMO continuava detido na manhã
desta terça-feira (8.07), numa esquadra da Polícia da República de Moçambique
(PRM) na zona do porto de Maputo. A agência noticiosa revela ainda que a
advogada do porta-voz do presidente da RENAMO afirmou que está a ser impedida
de visitar o seu constituinte. "Dizem [agentes da esquadra] que têm ordens
do chefe para não me deixarem entrar. Estamos a fazer uma carta de protesto à
Procuradoria-Geral da República (PGR). Qualquer que seja o tipo de crime, ele
tem direito a um advogado, que é um direito constitucional", afirmou em
declarações aos jornalistas Alice Mabota, que é também presidente da Liga dos
Direitos Humanos de Moçambique.
24
horas após a detenção, as autoridades ainda não fizeram qualquer pronunciamento
público em relação ao conteúdo da indiciação que pesa sobre António Muchanga.
Especula-se que a mesma esteja relacionada com repetidos pronunciamentos feitos
por Muchanga descritos como sendo de "incitamento à violência".
O
jurista António Boene lembra que "os membros do Conselho de Estado, apesar
de gozarem de imunidade, não gozam de impunidade, o que significa que qualquer
um deles, aos olhos da lei, pode ser detido". O jurista sublinha ainda que
"as ameaças proferidas por António Muchanga concretizaram-se",
afirmando que "não se entendia por que razão alguém que fazia
pronunciamentos incendiários continuasse ainda a fazê-lo".
Para
o porta-voz da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), Damião José, esta
decisão, seguida da ordem de prisão, "abre caminho para que a
administração de justiça desenvolva o seu trabalho sem limitações" e dá a
"nobre oportunidade" a António Muchanga de se explicar pela "incitação
à violência, morte de civis e destruição de bens privados". Esta
terça-feira, em conferência de imprensa, o porta-voz do partido do Presidente
Armando Guebuza congratulou-se com a "sábia, pertinente e oportuna"
decisão de levantamento de imunidade do porta-voz da RENAMO, considerando que a
sua detenção apenas peca por tardia.
"A sábia decisão do Conselho de Estado e pronta resposta da administração
de justiça peca apenas por chegar tarde, porque há já bastante tempo que o povo perguntava se António Muchanga era intocável e estava acima da
lei", declarou, em Maputo, Damião José.
Novo
obstáculo nas negociações para o fim da crise
O
analista político Calton Cadeado observa que a detenção de António Muchanga
veio ofuscar aquela que era a principal expectativa do conteúdo da discussão
que motivou a reunião do Conselho de Estado, nomeadamente o cessar das
hostilidades e o impacto nas negociações. Calton Cadeado admite que este facto
poderá traduzir-se na perda de confiança entre as partes, ainda que "a
confiança já estivesse reduzida". "Isto pode criar a sensação de que
qualquer reunião que for criada agora para colocar frente a frente o chefe de
Estado e Afonso Dhlakama vai ser realizada na mesma medida", afirma o
analista. "Quanto ao diálogo", continua Calton Cadeado, ainda haverá
impasses "porque isto vai tocar no lado emocional da outra parte, que é a
RENAMO".
António
Muchanga é o segundo membro senior da RENAMO detido alegadamente por
incitamento à violência, depois do chefe do Departamento de Informação do
partido, Jerónimo Malagueta, em junho do ano passado, que viria a permanecer nas
celas durante oito meses.
Deutsche Welle - Autoria Leonel
Matias (Maputo) / Lusa - Edição Maria
João Pinto / António Rocha