Beatriz
Gamboa, Díli
Xanana
Gusmão levou quase um ano a dizer que se demitiria em 2014. Depois desistiu de
o fazer porque se apercebeu que a justiça se preparava para “incomodar” membros
do seu governo por crimes de corrupção, incluindo ele, primeiro-ministro. Já
não se demitia tão depressa como o anunciado. A partir desse momento prevaleceu
a emergência de planear e agilizar uma tática que impedisse a elaboração de
processos judiciários e investigações incómodas e interrogatórios e mais que
prováveis julgamentos. O plano resultou. Os executantes de tratar judicialmente
dos processos em curso foram expulsos e os processos ficaram prontos para irem
parar no lixo.
Finalmente,
livre dos juízes que lhe preparavam a “cama”. Sentiu-se livre de se demitir…
Não. Falta aqui, em tudo isto, nesta trama, qualquer coisa que nos está a
escapar e que decerto mais tarde viremos a saber. Xanana Gusmão não é pessoa de
se demitir. Aquela falsa modéstia de declarar que só tinha o 2º ciclo escolar e
mais isto e aquilo foi para atirar areia para os nossos olhos.
Mari
Alkatiri e outros confidentes de Xanana Gusmão saberão quase tudo deste nebuloso
processo. Não foi por acaso que teve uma reação demasiado branda em relação à
inconstitucional expulsão dos juízes. Nem foi por acaso que reiterou estar ao
lado de Xanana nos ataques que lhe fizeram. Talvez um pouco antes tenha nascido
o acordo entre ambos e também nesse tempo foi selecionado o futuro
primeiro-ministro substituto de Xanana, Rui Araújo. Só agora, há poucos dias,
publicamente anunciado. E o que sabia o presidente Taur Matan Ruak sobre toda
esta panóplia de políticas de concordância que levaram Xanana Gusmão a abdicar
do seu “reinado”? Muito provavelmente ainda não sabia de nada. E o que soube
eram só rumores. Porque quando soube com toda a certeza a primeira convicção
foi convocar eleições antecipadas.
Então, primeiro, eram as eleições antecipadas
para a Assembleia Nacional, daí surtiria o partido ou partidos que formariam
governo. Processo normal e democrático. Acontece que nem Xanana Gusmão, nem
Mari Alkatiri e alguns dirigentes da Fretilin, partilhavam da opinião do
Presidente da República, Taur Matan Ruak. Eleições antecipadas não foi o
acordado anteriormente entre Alkatiri e Xanana. Perante a resistência dos
dirigentes dos dois maiores partidos políticos, o presidente acabou por aceder
às pretensões daqueles líderes e aceitar a queda do governo e sua substituição
como se trate de uma reestruturação. Além do mais, para o presidente, o
primeiro-ministro indicado agradou-lhe. Considera Taur Matan Ruak que Rui Araújo
oferece garantias de desempenhar o cargo de PM com qualidade.
Em
todo este processo existem algumas versões desta trama. A que se chamam
rumores. E são. Imensos rumores até correspondem à realidade. Não são ficção. Sobre
esta trama em que um governo cai, incluindo o PM, e um novo governo nomeado é
chamado fruto de reestruturação me parece que a versão acima contida é o rumor
mais certo e que mais se coaduna com a realidade. Sendo que a realidade é, também,
que nenhum timorense eleitor foi consultado nem se pronunciou democraticamente –
através do voto – para que o PR e os dirigentes partidários se sintam com
legitimidade democrática para alegarem que este governo, com Rui Araújo, da
Fretilin, no cargo de PM, é legítimo. Não é. Admira é que Rui Araújo tenha
aceite desempenhar aquele cargo nas atuais circunstâncias, anómalas e
antidemocráticas. Esta atitude pode ser para já a demonstração de uma má característica
da personalidade do PM indigitado que está incumbido de assegurar a condução
governativa do país até 2017. Araújo
começa com um mau prenúncio e até nem merecia que o sacrificassem assim. Diz o adágio que quem não
quer ser lobo não lhe veste a pele.
Infelizmente em Timor-Leste quase tudo é possível.
O que existe de mau no mundo paira insistentemente sobre as nossas cabeças e nossas vidas. Antes foi o
que foi e que na nossa história consta. Agora é só mais isto: absoluta ausência
de democracia em todo este processo. E é certo que Xanana Gusmão e tantos
outros continuarão por aí, impunes. Ao que se diz, governando e governando-se.
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