Díli,
11 fev (Lusa) - Xanana Gusmão prometeu, em 2002, que se vivesse até aos 60 -
cumpre este ano os 69 - ia convidar os amigos para comer os seus melões e as
suas abóboras, profissão alternativa depois de sair da liderança de
Timor-Leste.
"Vou
ser sempre o que sou. Se eu viver até aos 60 anos talvez o convide para comer
os meus melões, as minhas abóboras", ironizou na altura, numa entrevista à
Lusa.
Volvidos
13 anos e depois de compaginar a liderança do país, em vários cargos, com uma
sucessão de "profissões" paralelas, Xanana Gusmão ainda não parece
preparado para ser agricultor.
De
facto, nem sequer parece claro que vá ter menos trabalho porque na
segunda-feira deixa de ser primeiro-ministro mas continua no Governo, a liderar
um super-ministério, o Ministério do Planeamento e Investimento Estratégico,
responsável pelo Plano de Desenvolvimento e, inerentemente, pelas grandes
linhas de desenvolvimento do país.
Uma
pasta que permitirá cumprir o que ele próprio traçou, em 2012, como o objetivo
para a legislatura em curso: o "próximo mandato vai ser de pontes,
estradas, portos e aeroportos", disse em entrevista à Lusa.
É
mais uma reinvenção de Xanana Gusmão que, ao contrário do que ocorre noutros
países, em vez de ir "subindo" de escalão vai "descendo":
foi Presidente da República, depois primeiro-ministro e agora vai ser ministro.
E
sempre no comando da direção do país, agora a liderar o que diz ser o processo
de transição geracional.
Mas
reinvenções não são novas para Xanana Gusmão. Afinal já foi topógrafo, jornalista,
guerrilheiro, fotógrafo amador, poeta e "bombeiro", pelo menos pela
resposta pronta que dá a qualquer crise no país.
Primeiro
Presidente depois da restauração da independência de Timor-Leste, entre 2007 e
até segunda-feira foi primeiro-ministro, cargo que ocupou sempre com o apoio de
uma coligação, primeiro a Aliança de Maioria Parlamentar (AMP) e depois um
"bloco" a três (CNRT, PD e FM).
Desde
finais de 2013 que anda, publicamente, a explicar que ia deixar de ser
primeiro-ministro e porque o deve fazer - renovação e transição geracional -
mas, em privado, essa possibilidade já se antevia mesmo antes do voto de 2012.
Filho
de um professor, que o criou mais a um irmão e cinco irmãs, Xanana Gusmão
nasceu em Laleia, no maior distrito de Timor-Leste (Manatuto), já lá vão quase
69 anos.
Da
escola primária Xanana continuou os estudos na Missão Católica de Nossa Senhora
de Fátima, em Dare - nas colinas que rodeiam a capital, descendo posteriormente
a Díli.
O
tempo de estudante foi abandonado cedo, e Xanana entrou em força na vida,
trabalhando de manhã como topógrafo e à tarde a ensinar na escola chinesa.
Em
abril de 1974, junta-se à redação do primeiro jornal do território, "A Voz
de Timor", aderindo no mesmo ano à FRETILIN em que acaba por assumir as
funções de vice-diretor do Departamento de Informação.
A
morte de Nicolau Lobato em dezembro de 1978, três anos depois da invasão
indonésia, e a aniquilação da quase totalidade da direção da FRETILIN, empurram
Xanana Gusmão para a chefia, um papel que assumiu já a pensar na reorganização
da luta.
Em
1981, organiza a Primeira Conferência Nacional da FRETILIN e é eleito líder da
Resistência e Comandante-em-Chefe das FALINTIL. Dois anos depois chefia as
primeiras conversações com as forças armadas ocupantes nas áreas libertadas do
território, que resultaram num cessar-fogo em vigor até agosto do mesmo ano.
Delineou
e executou a Política de Unidade Nacional que se traduziu no aumento de
contactos com a Igreja Católica e no desenvolvimento da rede clandestina nas
áreas urbanas e noutras zonas ocupadas. Em 1988, o êxito da Política de Unidade
Nacional traduz-se ainda na criação do CNRM - Conselho Nacional da Resistência
Maubere e, mais tarde, o CNRT, Conselho Nacional da Resistência Timorense.
Em
20 de novembro de 1992, um ano após o Massacre de Santa Cruz, Xanana Gusmão foi
capturado pelas forças armadas indonésias e mantido prisioneiro em Jacarta.
Aparentando
cedência perante a pressão indonésia, Xanana Gusmão reverte o curso dos
acontecimentos no julgamento e, perante a comunicação social internacional,
denuncia a natureza genocída da ocupação indonésia de Timor-Leste.
Em
abril de 1988, na Convenção Nacional Timorense na Diáspora que criou o CNRT -
Conselho Nacional de Resistência Timorense -, Xanana Gusmão é aclamado líder da
Resistência Timorense e Presidente do CNRT.
Em
10 de fevereiro de 1999, Xanana Gusmão é transferido da Prisão de Cipinang para
uma casa-prisão em Salemba, no centro de Jacarta, em consequência da crescente
pressão internacional pela sua libertação e da declaração do Presidente Habibie
da Indonésia no sentido de conceder a independência a Timor-Leste caso o
resultado da consulta popular fosse a rejeição do plano de autonomia proposto
pelo seu Governo.
O
ano do referendo acaba por ser um dos mais marcantes na vida de Xanana Gusmão,
que desde logo é assumido como o interlocutor timorense privilegiado pela
comunidade internacional.
Três
dias depois do início da onda de violência que se seguiu ao voto, Xanana Gusmão
é libertado, entrando em Timor-Leste um mês depois.
Agora,
com Timor-Leste livre e independente há 12 anos, Xanana Gusmão lidera mais um
passo para a libertação: a da dependência na geração mais velha, um processo
que agora começa com a tomada de posse do VI Governo Constitucional.
ASP
// EL
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