Folha
8 digital (ao) – 30 maio 2015
O
julgamento do jornalista e activista angolano, Rafael Marques, que se estendia
por mais de dois anos, chegou, enfim, ao seu termo, mas em forma de “mbaia”
jurídica made in Angola, depois de ter interrompido várias vezes. Ultimamante,
em Novembro de 2014, 24 de Março de 2015, em seguida a 23 de Abril e 15 de Maio
e, finalmente, 21 de Maio. Vejamos como se coseram as linhas desta mascarada
judicial.
Na
reunião de 24 de Março, a suspensão deveu-se ao facto de terem sido introduzidas
15 novas atribuições de culpa contra Marques sem se ter procedido ao
indispensável aviso prévio. Esta derrapagem daquilo que são as regras e normas
jurídicas e as estritas directivas judiciais, tanto no nosso país como em
qualquer parte do mundo, levou ao adiamento do julgamento para o mês seguinte,
dia 23 de Abril.Nesse dia, uma luz apareceu no horizonte do julgamento, quando
no final da audiência foi, digamos, programado um “acordo amigável” entre as
partes, ou seja, entre o próprio Rafael, de um lado, e sete generais - sendo um
deles o ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República,
General Manuel Hélder Vieira Dias Júnior, “Kopelipa” - e vários representantes
de duas empresas de diamantes, por outro.
A
audiência foi suspensa em nome desta boa causa e o julgamento novamente adiado
para 14 de Maio.
Mas
nesse dia, 14 de Maio, a atmosfera rapidamente tomou contornos escuros quando
os advogados da acusação disseram que o acordo para chegar a um entendimento
passava por uma denegação de Marques das suas próprias acusações, sugestão que
o jornalista imediatamente recusou. O resultado foi, claro está, a suspensão e
mais um adiamento da sessão para dia 21 de Maio.
O
“MANGUITO” (ALEGADAMENTE) DE JES
A
nova audiência do 21 de Maio foi realizada à porta-fechada e a sessão terminou,
com a divulgação duma nova e muito boa surpresa, em declarações feitas ao site
Rede Angola pelo advogado de Rafael Marques, David Mendes.
“Os
generais, a ITM, e a sociedade de Catoca [empresas de mineração citadas no
livro] aceitaram as explicações de Rafael Marques, e demonstram que não querem
continuar a litigar. Foram dispensados os declarantes e as testemunhas, porque
as explicações que o Rafael deu para eles foram convincentes. No 25 de Maio
serão realizadas as alegações finais, e esperamos que nos termos do artigo 418
do Código Penal o tribunal decida aceitar as explicações. As partes
interessadas assim já decidiram e registaram em acta que estão de acordo com
as explicações, e o tribunal então não deve aplicar nenhuma pena ao Rafael”,
disse David Mendes ao Rede Angola.
Segundo
o acordo, além da extinção do processo, Rafael Marques e os generais vão
trabalhar em conjunto para monitorizar a questão dos direitos humanos na área
de exploração diamantífera nas Lundas. Por outro lado, o livro Diamantes de
Sangue não poderá ter novas edições».
Por
sua parte, Rafael Marques estava visivelmente satisfeito. “Em relação aos
generais, a questão está esclarecida e haverá até possibilidade de trabalhar
com alguns desses generais para resolução de questões a nível dos direitos
humanos e, nesse caso, saímos todos tranquilos. Também ficou lavrado que
continuarei a monitorizar a situação dos direitos humanos nas Lundas e espero
que todas as empresas que forem contactadas respondam às minhas diligências”,
revelou à saída do Tribunal, acrescentando, «o livro não será mais reeditado.
É acto voluntário da minha parte não reeditar o livro para facilitar o diálogo
e novas consultas. Além disso, já se passaram quatro anos desde a publicação.
Quer da minha parte, quer para os generais não há intenção de continuar com
este caso, de modo que encontramos uma solução satisfatória para todas as
partes”.Por seu lado, seguindo em consonância com o estipulado, o Ministério
Público tomou a mesma posição e pediu prosseguimento dos autos sem a inquirição
das testemunhas nem dos declarantes. “O tribunal, face a este comportamento
de todas as partes, decidiu adiar a continuação do julgamento para 25.05”,
explicou.
Tudo
ouro sobre azul de Limoges.Impacientes, esperamos. E aí, a surpresa foi ainda
maior do que a da audiência anterior: a acusação, pela voz do Ministério
Público, tirou o seu coelho da cartola e pediu ao tribunal que Rafael Marques
fosse condenado a uma prisão efectiva de 30 dias, por não ter apresentado
provas das suas acusações.
O
que realmente se tinha passado até essa data, em trocas de frases a suscitar
uma aproximação e acordo entre as partes tinha por único objectivo obter
anuência de Marques para dispensar a presença e, subsequentemente, as declarações
probatórias das acusações das suas testemunhas. E Rafael Marque foi nessa
cantiga.
Tinham
desaparecido assim da cena do palco jurídico as fundamentais provas do que
ele tinha escrito no seu livro.
Ao
sair do tribunal, Rafael Marques, indignado, considerou que a decisão do
Ministério Público foi “um abuso” e que, «embora não tivesse havido acordo, porque
todas as tentativas de acordo falharam, tinham sido dadas muitas explicações
que permitiram que os generais, empresas e até mesmo o Ministério Público
retirassem as acusações contra mim (...) Eu trouxe, assumindo avultados custos,
cinco vezes as minhas testemunhas à barra do tribunal, mais de oito pessoas
que vivem a quase mil quilómetros de Luanda, decidi não apresentá-las à barra
do tribunal porque acreditava nas declarações dos generais e do Estado angolano…
E agora dizem que eu não apresentei provas?! ... Caí numa armadilha”,
concluiu.
O
FIM DA PICADA
«Luanda,
28 de Maio (Lusa) - O tribunal provincial de Luanda condenou hoje Rafael
Marques a seis meses de prisão com pena suspensa no processo de difamação sobre
a violação dos direitos humanos na exploração diamantífera, apesar de um
acordo do jornalista com os generais queixosos.
Durante
todo o julgamento, que se iniciou em Março, apenas foi ouvido Rafael Marques,
que explicou em tribunal, ao longo de várias sessões, e nunca obteve respostas
dos visados no livro às questões colocadas sobre o tema.
.A
21 de Maio passado, Rafael Marques, e os nove generais angolanos que o tinham
processado por se considerarem vítimas de “denúncia caluniosa” e “injúrias” no
livro “Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola”, chegaram a um
acordo de cavalheiros. Rafael Marques e os generais queixosos acordaram
trabalhar em conjunto para fiscalizar a questão dos direitos humanos na
exploração de diamantes nas províncias das Lundas. Por seu lado, Rafael
Marques, decidiu que “Diamantes de Sangue”, editado em Portugal pela Tinta da
China, não terá mais reedições.(…) “ No entanto, e apesar do acordo alcançado
entre as partes, no dia das alegações finais o Ministério Público angolano
pediu 30 dias de prisão para Rafael Marques. «É uma cilada. O que houve foi
uma cilada. E o Estado angolano há-de conhecer-me de uma forma muito mais
dura”, afirmou, na altura, Rafael Marques.(DN)»
MORAL
DESTA HISTÓRIA
«Nunca
acredites em palmadinhas nas costas e em palavrinhas lindas a aprovar o que
tu dizes, se vierem da parte duma raposa que sabe que não tens dentes para a
morder».
Em
outras palavras, mais condicentes com esta nojenta demonstração do nível da
moralidade, nível civil e da educação desta gente, que nos desgoverna há perto
de quarenta anos, que nos leva a reler a dica angolana: não te aproximes, ou,
como se diz na banda, não te metas!...
Essa
gente esforça-se, com grande engenho e eficácia, por levar Angola para as
fossas sépticas do entulho da humanidade, o clube de multimilionários que
enriqueceram ilicitamente ou, pelo menos, a especular escandalosamente em
detrimento de tudo e mais alguma coisa que não seja da sua igualha.
Caíste,
Rafa, levanta-te, porque, se não te matarem, a tua vitória, essa sim, é certa.
E se te matarem para eles sempre será uma imunda derrota.
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