Martinho Júnior, Luanda
1
– A reunião cimeira Comunidade de Estados Latino Americanos e Caribenhos
(CELAC) – União Europeia (UE), realizou-se num momento distinto para a
humanidade:
-
As tensões globais de essência capitalista agudizam-se entre os que se propõem
ao exercício duma hegemonia unipolar e os emergentes que cuidam de seguir a
trilha da multipolarização, recorrendo a painéis
filosófico-doutrinário-ideológico-políticos e geo estratégicos distintos;
-
As culturas orientadas para a hegemonia unipolar, socorrem-se de capacidades
que se inscrevem em processos neo liberais e especulativos, fórmulas
exacerbadas que acabam por subverter os parâmetros de liberdade, de democracia
e até de vida;
-
As culturas orientadas para a emergência, cultivam duma forma geral e com
algumas excepções assumidamente socialistas, orientações de carácter
capitalista (de economia de mercado), com amortecedores para as suas políticas
sociais e estímulos visando maior justiça e equilíbrio nos relacionamentos
internacionais, abrindo-se à participação alargada de cada vez mais
organizações sociais de base;
-
As situações respectivas entre os componentes da CELAC e da União Europeia,
reflectem também essas tensões e essa dicotomia de processos, com a CELAC a
integrar o campo dos emergentes (multipolarização) e a União Europeia a ser
cada vez mais condicionada ao “diktat” da hegemonia unipolar.
-
As cimeiras entre ambas as organizações regionais (eta é a segunda), elevam
assim a fasquia do diálogo norte-sul a um nível que antes seria muito difícil
alcançar, até por que a emergência só pode ocorrer em função das recíprocas
correias de transmissão e a consequente perda de potencialidade daqueles que se
propõem ao domínio absoluto de 1% sobre o resto da humanidade, algo que obriga
ao risco dos relacionamentos poderem não avançarem de forma pacífica e
recorrendo ao diálogo e à concertação.
Há
contudo uma plataforma comum para todos eles, sem apesar disso se constituir
numa síntese definitiva entre contrários: a aceitação de que vastas regiões do
globo fazem valer-se mais por via das organizações regionais reconhecidas
internacionalmente, do que por via individual de cada país, o que cria um
espectro inovador de responsabilidades, pois tacitamente todos vão aceitando a
irreversibilidade da globalização.
2
– Com a CELAC a América Latina deu um passo mais no sentido duma integração que
está intimamente associada à independência e soberania duma região com
capacitação sócio-cultural comum cada vez mais forte, próximo do ponto ideal (e
utópico) de não retorno, 200 anos depois das independências formais, “de
bandeira”.
As
culturas latino americanas têm por via da CELAC, uma excelente fórmula de
afirmação de sua unidade, o que distingue mesmo a região em relação a outras
organizações regionais de emergentes e a coloca numa posição singular no
contexto global.
Com
uma base sócio-cultural e histórica comum que se vai fortalecendo, integrando
um pacote de organizações de espectro similar, a CELAC é uma das organizações
que pode assim, a sul, assumir um papel mais progressista em termos da própria
emergência, algo que está inteligentemente a ser aproveitado pelos seus
dirigentes mais lúcidos, destacando-se nesse aspecto os componentes da ALBA, a
Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América.
A
CELAC (e particularmente os progressistas que reflectem as posições de
vanguarda dos membros da ALBA) está portanto disposta a defender a Venezuela e
o seu amplo projecto Bolivariano como um dos seus mais esclarecidos
fundamentos, ao mesmo tempo que procura assegurar a distensão em relação a
Cuba, assim como a questão de justiça devida para com toda a América Latina,
tudo sem esquecer as reparações históricas que a UE deve assumir para com as
pequenas nações insulares das Caraíbas, tornadas há séculos acantonamento de
escravos de origem africana, condenadas ainda hoje ao subdesenvolvimento típico
das periferias e, por esse modo, à dependência.
3
– Com a União Europeia seguiu-se uma trilha de capitalismo neo liberal que
valorizou a concentração exponencial de capital (incluindo o capital financeiro
especulativo), subvalorizando cada vez mais as conquistas sociais dos seus
povos, uma trilha agravada pela deslocalização de investimentos e de indústrias
que, se não for urgentemente reequacionada, poderá influir no sentido da crise
que entretanto nesse campo se instalou.
Por
essa razão, a essa trilha não resta outra alternativa senão procurar
concertações que nada tendo a ver com os relacionamentos passados, enfrentam
emergentes cada vez mais decisórios no carácter polarizado da globalização e,
no caso do relacionamento com a CELAC, uma organização que assume sob os pontos
de vista ético, moral, sócio-cultural e sócio-político, um papel inconfundível
e já incontornável no contexto global.
Na
base dos fundamentos da UE, está uma história de construção de impérios que não
se podendo mais ressuscitar, marcam no subconsciente humano as trilhas a que
jamais se poderá voltar, o que pode pesar negativamente nas possibilidades de
diálogo com outras organizações regionais, ou com as potências maiores ao nível
dos Estados Unidos, da China, ou mesmo da Federação Russa transcontinental.
Para
quem se submete, ou se avassala, aos processos típicos do campo da hegemonia
unipolar, a deriva conservadora e ultra conservadora do poder das oligarquias
pesa também nas possibilidades desse diálogo e da necessidade de incessante
busca de consensos; não ocorrem por acaso as “revoluções coloridas”, nem
as “primaveras árabes”, muito menos o “abcesso” capitalista
levado ao extremo na Ucrânia.
4
– A cimeira CELAC-UE traz-nos assim redobradas expectativas:
-
Até que ponto a América Latina, auto declarada “zona de paz, cooperação em
matéria demeio ambiente, desarme nuclear, tráfico de drogas e migrações”,
poderá fazer valer, em socorro duma UE que representa de certo modo o ocaso dos
impérios, as enormes potencialidades de sua emergência, que recorre à história,
à densidade de processos sócio-culturais cada vez mais homogéneos e a uma cada
vez mais ampla participação democrática popular?
-
Até que ponto se poderá equacionar maior equilíbrio entre uns e outros,
alcançar maior justiça humana, mais educação, mais saúde e maior respeito pelo
Planeta, hoje em dia um conjunto enorme de soluções tão indispensáveis para a
vida da e na Mãe Terra?
A
União Europeia debate-se intestinamente na velha fórmula shakespiriana, do “to
be, or not to be”e é a América Latina que assume a luz entre as trevas:
…
É dela que se esperam as melhores opções e soluções, que todavia terão de perseguir
os caminhos da inclusão e afastar os da exclusão; por isso é nela e a partir
dela que recaem as mais construtivas expectativas, em nome de toda a
humanidade, apesar das trocas comerciais entre as duas regiões estarem longe de
serem significativas!
Ainda
com a CELAC a vanguarda cubana está disposta a “não ter medo de conversar
sobre qualquer assunto” manifestado por qualquer das partes: é ainda Cuba
que dá a maior potência ao enfoque da luz sobre as trevas!
Foto:
El Presidente de la
Comisión Europea , Jean-Claude Juncker, izquierda, y el
presidente del Consejo Europeo, Donald Tusk, derecha, dan la bienvenida al
Primer Vicepresidente de Cuba Miguel-Canel Bermúdez a su llegada a la Cumbre UE-CELAC en
Bruselas el miércoles 10 de junio de 2015. Foto: Virginia Mayo/ AP - http://www.cubadebate.cu/noticias/2015/06/10/alta-representante-de-la-union-europea-recibio-a-diaz-canel/#.VXh77BvbJy0
Sem comentários:
Enviar um comentário