Roger
Godwin – Jornal de Angola, opinião
Um
dos dois maiores acordos comerciais mundiais assinados no início do ano tem o
envolvimento de 26 países de três blocos regionais africanos, naquilo que é uma
excelente oportunidade de mostrar ao mundo que as transacções em África não são
assim tão difíceis de fazer como algumas potências mundiais têm tentado fazer
crer.
A
Área Tripartida de Comércio Livre – assim se chama o acordo que envolve 26
países africanos – é já considerada a maior zona de comércio do continente e
estende-se das cidades do Cabo ao Cairo.A fazer funcionar este acordo estão
alguns grupos regionais africanos, como a Comunidade de Desenvolvimento da
África Austral (SADC), a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental
(CEDEAO) e a COMESA.
De alguma forma, a Área Tripartida de Comércio Livre é uma resposta directa às preocupações de muitos países e foi anunciada nas conclusões de uma conferência de homens de negócios africanos realizada em finais de Fevereiro no estância egípcia de Sharm el-Sheik, onde mais uma vez foi feito um apelo para a unidade do mercado africano.
Uma abundância de fronteiras tem sido a razão atribuída para a limitação das economias de escala de muitos africanos, o que só poderia ser alterado se fossem fixados problemas comuns capazes de levar à criação de grupos de trabalho para resolver esses problemas, nomeadamente,sobre as ligações rodoviárias e à redução de tarifas, facilitando dessa forma o desenvolvimento de uma política de integração.
Para agravar mais o problema, existe o facto de os transportes de mercadorias em África custarem o dobro do dos países ocidentais, factor que se reflecte directamente na política de preços praticados e que não favorecem as transacções comerciais entre mercados africanos.
Para cúmulo, os poucos programas comerciais assinados entre países africanos têm uma fraca aplicação por razões que todos conhecem mas que poucos têm a coragem de assumir.
A eternal desconfiança política entre alguns países, sobretudo vizinhos, é na realidade um forte factor que tem impedido a aplicação de muitos dos acordos assinados, orçamentalmente cabimentados mas nunca executados.
Alguns blocos regionais africanos têm também funcionado demasiado fechados, não desenvolvendo parcerias com os de outras regiões, o que limita o leque de possibilidades de realização de mais entendimentos comerciais.
Nesse sentido, este acordo tripartido permite aos 56 países que nele aceitaram participar a criação de um mercado gigantesco para a troca de produtos, livres de impostos fronteiriços, o que é uma importante possibilidade de se abrirem ao mundo através da promoção das suas exportações.
Neste momento o projecto está já em fase de início de implementação, sendo necessário passar mais algum tempo para que se possa perspectivar um pouco melhor aquilo que será a sua vertente virada para a exportação, sabendo-se que a grande prioridade imediata é mesmo o seu estabelecimento ao nível de todo o continente africano.
Para já as perspectivas são excelentes e só o facto de ele incluir os três principais blocos regionais é, por si só, uma forte garantia de sucesso, podendo mesmo perspectivar-se que nele venham a entrar mais tarde aqueles que agora optaram por ficar de fora.
Um dos grandes desafios que se colocam para que este acordo possa dar os frutos desejados relaciona-se com a forma como será estabelecida a quota a que cada país terá direito nos diversos produtos que produz, sabendo-se que dentro dos blocos regionais esse sempre foi um problema praticamente inultrapassável, uma vez que esbarra na intransigência de cada um tentar tirar o melhor para si, sem cuidar de ter em atenção o interesse global.
Até agora o que tem sucedido é que todos os acordos de comércio assinados entre países e blocos africanos funcionaram bem no papel, mas muito mal quando chegou a vez de os aplicar na prática.
O que se espera é que essas más experiências anteriores tenham sido um factor tido em conta pelos mentores deste novo acordo, limando devidamente as arestas para que ele não encalhe na habitual burocracia africana, que tem sido também responsável pela morte de muitos projectos aparentemente saudáveis.
Em tempos de grave crise económica internacional, a união terá que ser cada vez mais a fórmula de criar a força suficiente para vencer obstáculos quase diários que enfraquecem ainda mais aqueles que, já à partida, estão numa situação de alguma fragilidade.
É evidente que acordos deste tipo só podem ter sucesso se houver vontade política dos governos envolvidos em resolver alguns dos problemas estruturais, como são o melhoramento das estradas e o apoio a um empresariado, sobretudo agrícola, que não sabe muito bem como funciona este tipo de negócio.
Para início de conversa parece claro que existe já a vontade política de fazer as coisas avançar e dar a este projecto entre três das regiões africanas pernas para que possa andar e, mais tarde, incluir países de outros grupos regionais que agora mostraram não estar ainda preparados para responder a este desafio de união.
Como sempre, do sucesso inicial do projecto dependerá a sua sobrevivência e eventual reforço com a entrada de novos parceiros, transformando-se, desse modo, numa resposta aos desafios de agora e resolvendo no interior do próprio continente alguns dos muitos problemas com que África, infelizmente, ainda hoje vive.
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