O
ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva é a vítima deste ódio no atual momento
histórico
Edson
Luiz Netto, São Paulo – Correio do Brasil, opinião
Não
é a primeira vez que um líder popular, progressista ou de esquerda sofre ações
per-secutórias no Brasil, mesmo em plena vigência de um regime democrático.
Getúlio Vargas, em 1954 e João Goulart, em 1964 são dois exemplos notórios do
ódio que as elites brasileiras direcionam àqueles que ousam contrariar, ainda
que minimamente, seus interesses. O ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva é a
vítima deste ódio no atual momento histórico.
Depois
de conduzir o país ao seu melhor período econômico desde o final dos anos
60/início dos anos 70 (o chamado “milagre econômico”) e de ter promovido a
maior mobilidade social da história, com mais de 30 milhões de brasileiros
saindo da linha da extrema pobreza, depois de retirar o Brasil do mapa da fome
das Nações Unidas, depois de ter ampliado como nunca as oportunidades de
emprego, de consumo e educacionais para pobres e negros, depois de ter colocado
o Brasil entre as principais nações do mundo, Lula passou a sofrer uma
ignominiosa perseguição por parte daqueles que perderam seus privilégios com a
ascensão de pessoas de outros estratos sociais, agora também partícipes e
usufruidores dos aspectos positivos do capitalismo brasileiro (embora o Brasil
ainda seja um dos países mais desiguais do mundo).
Essa
perseguição, que foi ganhando corpo através do ódio destilado pelas redes
sociais, foi alimentada pelo vergonhoso e deletério comportamento dos
principais meios de comunicação do país (Rede Globo, Folha de S. Paulo, O
Estado de São Paulo, Veja etc.) que passaram a criminalizar Lula e o Partido
dos Trabalhadores, poupando deliberadamente (e até mesmo escondendo) casos de
corrupção envolvendo partidos de oposição (PSDB, DEM). O objetivo claro deste
maniqueísmo foi o de criar um clima de luta do bem contra o mal (no que, em
certo sentido, parece que as forças reacionárias estão tendo êxito).
Foi
esse clima de luta do bem contra o mal que permitiu que a Polícia Federal,
Ministério Público Federal e Justiça Federal atropelassem o ordenamento
jurídico, a sensatez e mesmo o simples respeito a um ex-presidente da
República, determinando sua condução coercitiva – inclusive com um inadmissível
aparato bélico – para prestar depoimento na condição de investigado pela
Operação Lava Jato. Também contribuiu para que três promotores paulistas à
procura de notoriedade, inseridos num ambiente partidarizado, cometessem o
despautério de pedir a prisão preventiva de Lula em ação penal relacionada ao
Condomínio Solaris, no Guarujá, alegando conveniência da instrução criminal,
pois o ex-presidente estaria recebendo até mesmo “defesa pública” de seus
apoiadores!
É
claro que num Estado Democrático de Direito ninguém está acima da lei. Se há
suspeitas sobre as gestões do ex-presidente Lula, investigações devem ser
feitas (como de fato estão sendo), como deveriam ter ocorrido sobre as inúmeras
denúncias de corrupção relacionadas ao processo de privatizações durante os
governos de Fernando Henrique Cardoso e sobre as denúncias envolvendo o senador
Aécio Neves na própria Operação Lava Jato (Aécio foi citado por cinco delações
como beneficiário de esquemas de corrupção; um dos delatores afirmou que Aécio
“era o mais chato para cobrar propina”). Estranhamente, todo o complexo da
Operação Lava Jato não se interessa em investigar tais denúncias,
concentrando-se exclusivamente naquelas relacionadas ao PT e seus aliados.
Se
ninguém está acima da lei, também não está excluído dela e, ainda que ocorram
investigações contra o ex-presidente Lula no âmbito da Operação Lava Jato, seus
direitos de cidadania devem ser preservados, assim como a de qualquer cidadão
brasileiro. A condução coercitiva de Lula não se justifica em hipótese nenhuma
e, seguramente, somente ocorreu para produzir seu espetacular constrangimento
transmitido ao vivo pelas redes de televisão. Foi, sem dúvida, um ato político
dos integrantes da Operação Lava Jato, jamais um ato calcado no conjunto de
normas jurídicas vigentes em nosso país.
O
ato político da condução coercitiva de Lula demonstra claramente que os
integrantes da Operação Lava Jato estão distantes da necessária imparcialidade
para conduzir o processo investigatório, colocando-se mais como representantes
da casa-grande na caça aos negros rebeldes (ou ao ex-sindicalista que ousou
tentar mudar o status quo deste país com políticas públicas de inclusão social
e econômica, valorização do trabalho e do mercado interno). No mesmo sentido o
desastrado pedido de prisão formulado pelos três promotores paulistas.
Importante
setor da elite brasileira pensa que ainda está na casa-grande e pode expressar
livremente seu ódio e os ofendidos têm que baixar a cabeça e manter-se
serenos. É com este conceito que submeteram Lula a um deliberado
constrangimento, tratando-o como um mero meliante. Não importa que Lula tenha
sido presidente do Brasil, para os senhores da casa-grande brasileira, ele não
passa de um simples nordestino retirante que veio para São Paulo e teve a
oportunidade da ganhar a vida como metalúrgico.
Contudo,
no curso da história a violência impingida a Lula não ficará impune. A imediata
reação que seus companheiros de luta e setores da sociedade brasileira
desencadearam sinaliza que a casa-grande não terá vida fácil em seu intento de
mudar o Brasil para que tudo permaneça como sempre esteve.
Como
ninguém está acima da lei, também ninguém pode pretender estar acima de seu
povo, sejam os bem preparados integrantes da Polícia Federal, os presumidamente
intocáveis membros do Ministério Público Federal , o incensado juiz Sérgio
Moro, ou qualquer um que se ponha contra as lutas populares pela construção de
uma sociedade livre, justa e solidária.
Finalizamos
lembrando os versos de Pablo Milanes, na bela Canción por la unidad
latinoamericana: “A história é um carro alegre, cheio de um povo contente, que
atropela indiferente todo aquele que a negue”.
*Edson
Luiz Netto, é advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de Jaguariúna e
Região, especialista em Economia do Trabalho e Sindicalismo pelo Instituto de
Economia da Unicamp
Sem comentários:
Enviar um comentário