terça-feira, 15 de março de 2016

É UMA ARMADILHA, DRAGHI



Mariana Mortágua – Jornal de Notícias, opinião

Devia caber aos bancos centrais a preocupação com todos os aspetos da economia - incluindo o emprego e a distribuição de riqueza. Apesar disto, o Banco Central Europeu só tem um mandato: manter a inflação em 2%. Durante a maior parte da sua vida, o seu papel foi assim impedir, através da subida das taxas de juro, que os preços aumentassem mais de 2%.

O que é que acontece quando a preocupação se inverte e, em vez de tentar controlar a inflação, o BCE é chamado a promover a subida de preços e estimular o crescimento económico? É aí que estamos.

Desde a crise financeira que as economias europeias e, em certa medida, também a americana, mostram sinais de estagnação e sérios riscos de deflação. Em deflação, ou seja, com a queda generalizada dos preços e salários, as dívidas tornam-se proporcionalmente maiores e as dificuldades económicas agravam-se. Não admira que o BCE tente evitá-la a todo o custo.

A questão é: será que a descida das taxas de juro para valores negativos, acrescida da continuada injeção de milhares de milhões de euros no sistema financeiro vai resolver o problema? Estou quase certa que não.

Ao injetar dinheiro barato a rodos no sistema, Draghi assume que a falta de crescimento económico se deve a um problema de liquidez. Não é verdade.

O problema é que as economias estão deprimidas pela austeridade, sobre-endividadas e sem capacidade de investimento (sobretudo público).

Por outro lado, também os bancos estão cheios de ativos entretanto desvalorizados - não querem dar crédito barato, mas sim reduzir o tamanho dos seus balanços e fazer investimentos rentáveis.

O risco, e quem o diz são nomes como Olivier Blanchard (ex-economista chefe no FMI) e Larry Summers (ex-ministro do Tesouro dos EUA), é o de estar simplesmente a alimentar novas bolhas especulativas.

Draghi está preso àquilo a que Keynes chamava a "armadilha da liquidez", sem admitir que a solução, mais que monetária, está na capacidade de estímulo orçamental e na reorientação estratégica do papel da Banca. É o que acontece quando o dogma ideológico se sobrepõe à racionalidade.

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