Governo
moçambicano vai ao Parlamento explicar dívidas multimilionárias que não
constavam nas contas públicas. Três organizações não-governamentais
moçambicanas exigem a responsabilização dos autores dos empréstimos.
O
Governo moçambicano vai à Assembleia da República esta quarta (08.06) e
quinta-feira (09.06) prestar esclarecimentos sobre dívidas de 1,4 mil milhões
de euros que não constavam das contas públicas.
Organizações
da sociedade civil rejeitam que o país seja obrigado a pagar as dívidas das
três polémicas empresas privadas Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM),
Mozambique Asset Management (MAM) e ProIndicus, contraídas entre 2013 e 2014
pelo anterior Executivo. O Fórum de Monitoria do Orçamento, o Grupo Moçambicano
da Dívida e a Coligação Transparência e Justiça Fiscal lembram que as dívidas
foram contraídas sem o aval do Parlamento e exigem, por isso, a
responsabilização dos autores dos empréstimos.
As
três organizações não-governamentais (ONG) consideram que o Estado agiu de
forma inconstitucional, violando a alínea p) do número 2 do artigo 179 da
Constituição, segundo a qual é da exclusiva competência do Parlamento
"autorizar o Governo, definindo as condições gerais, a contrair ou a
conceder empréstimos, a realizar outras operações de crédito, por período
superior a um exercício económico e a estabelecer o limite máximo dos avales a
conceder pelo Estado."
A
DW África conversou com Paula Monjane, coordenadora do grupo das ONG.
DW
África: Que exigências fazem ao Governo moçambicano?
Paula
Monjane (PM): Como cidadãos moçambicanos, nós não aceitamos pagar essa
dívida. Exigimos do Governo que faça uma publicação em fontes abertas e de
maior acesso de toda a informação relacionada com a dívida pública, para que
todos os moçambicanos tenham essa informação. Num segundo aspecto em relação ao
Governo, queremos uma explicação pública e detalhada sobre as reais implicações
desta dívida no seu bolso.
O
terceiro aspecto que esperamos do Governo é um plano de ação com medidas
monitoráveis pelo público sobre como responsabilizar os autores das
inconstitucionalidades e ilegalidades da concessão dos avales do Estado a
empresas privadas. Também esperamos do Governo a apresentação pública e
detalhada das medidas de austeridade conducentes à superação da atual crise
económica e da dívida. Por causa da dívida em particular, parceiros de
cooperação cortaram o apoio programático. Então, há uma necessidade clara de
Moçambique dizer como vai racionalizar a despesa.
O
quinto aspecto para o Governo é a indicação pública e detalhada de medidas a
adotar em caso de impossibilidade de as empresas saldarem as dívidas nos prazos
e montantes previamente acordados, quem são ou serão os financiadores, com que
montantes e em que condições. Nós também exigimos da Assembleia da República,
que é a representante dos cidadãos, que impeça a legalização e transformação
das dívidas da ProIndicus e da MAM em dívidas soberanas. Exigimos também ao
Parlamento a preparação e aprovação de uma lei de responsabilização fiscal para
infratores da lei orçamental. O que acontece é que há um limite de avales que o
Governo pode dar em cada ano fiscal. Entretanto, a lei é omissa em dizer que
responsabilização se dá em caso de infração.
DW
África: Caso não sejam cumpridas as vossas recomendações, teriam como entrar
com alguma ação contra o Governo, como sociedade civil?
PM: No
devido momento, iremos pronunciar-nos sobre o que iremos fazer, mas temos ainda
fé que as instituições moçambicanas possam fazer alguma coisa. Portanto, não
estamos a dirigir-nos apenas ao Governo, mas também a outras instituições do
Estado, incluindo as instituições soberanas como o Parlamento, instituições
judiciais. E acreditamos que elas ainda possam trabalhar e que terão um papel
fundamental nesse processo. Se isso não acontecer, depois vamos pronunciar-nos
sobre como achamos que devemos atuar.
DW
África: Até agora há várias entidades a fazer pressão para isso. E um resultado
ou uma resposta concreta até agora não houve.
PM: Exato.
Nós vamos escutar e acompanhar atentamente o debate entre no Parlamento sobre a
dívida pública, nos dias 8 e 9 de junho, e esperamos que o Governo tome uma
atitude, principalmente sobre o assunto de uma auditoria a estas dívidas. E
esperamos que haja alguma coisa. Se isso não acontecer, nós devidamente iremos
contactar e informar o que iremos fazer. De certeza que não vamos parar por
aqui. Como moçambicanos, a nossa intenção não é apenas fazer um comunicado para
dizer que consta, mas que realmente não paguemos as dívidas, porque isso
custa-nos no bolso e no bolso dos nossos irmãos.
Nádia
Issufo – Deutsche Welle
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