Martinho Júnior, Luanda
1
– Cuba, as comunidades cubanas espalhadas pelo mundo e muitos sectores
progressistas dos países onde essas comunidades estão implantadas, comemoraram
o 26 de Julho de 2016 com a convicção de quão têm sido justas e sensíveis para
os povos as trilhas de internacionalismo e solidariedade distendidas pelo povo
cubano e sua revolução, em benefícios dos mais oprimidos da Terra.
Em
Cuba o acto central ocorreu em Sancti Spíritus, atendendo aos progressos
registados naquela região em relação ao último ano, no que diz respeito ao
turismo, aos programas agrícolas das culturas de arroz, à produção de alimentos
e aos avanços sociais.
Em
Angola a data foi também assinalada no âmbito da estreita conexão histórica
entre a Revolução Cubana e o Movimento de Libertação em África, pois há
identidade comum, nos seus múltiplos e complexos significados, entre os pilares
que constituíram o 26 de Julho, Dia da Rebeldia e o 4 de Fevereiro que deu
início à Luta Armada contra o colonialismo português por parte do MPLA.
A
indissolúvel amizade Angola-Cuba tem tudo que ver com essa saga comum, forjada
em momentos difíceis e sacrificados, sempre marcados por decisões rebeldes,
corajosas e decisivas, em benefício dos povos, que se refletem até hoje.
2
– A decisão que levou ao assalto ao quartel Moncada em 1953 tendo o Comandante
Fidel de Castro à frente dos rebeldes revolucionários cubanos, teve e tem muito
que ver com muitas outras decisões que foram tomadas pela Revolução Cubana e
pelo Movimento de Libertação em África, muitas delas em comum, ao longo de
largas décadas.
Em
Angola este 26 de Julho foi justamente comemorado com algumas iniciativas
conjuntas entre as comunidades cubanas em cada Província e alguns Governos
Provinciais ciosos da história do país e menos envolvidos nos impactos
desmobilizadores da terapia neoliberal.
O
Governo Provincial de Luanda associou-se às comemorações do 26 de Julho e no
seu programa, para além do acto solene e cultural de 26 de Julho no Cine
Tivoli, houve visitas ao monumento que assinala a vitória de Quifangondo e ao
Memorial Agostinho Neto.
Em
Luanda o acto central realizou-se no cinema Tivoli, sito ao Bairro Azul, à
Samba, com casa cheia, com intervenções que salientaram muitos aspectos do
trajecto comum sucedâneo do 26 de Julho de 1953 e do 4 de Fevereiro de 1961 e
com finalização músico cultural que integrou interpretações da Orquestra
Sinfónica Infanto-Juvenil do Libolo e duma banda cubana.
3 – Uma das decisões comuns historicamente mais marcantes entre Angola e Cuba, resultou da Operação Carlota, imediatamente antes da independência angolana e da constituição da República Popular de Angola.
Para
além de garantir a independência, era necessário que a nova República ganhasse
sustentabilidade económica e financeira, ainda que numa conjuntura tão hostil
como a que se registou em prejuízo de Angola em finais de 1975.
Para
esse efeito foi o Comandante Fidel de Castro que insistiu na necessidade de
defender Cabinda, para onde se deslocaram importantes contingentes de
instrutores das Forças Armadas Revolucionárias de Cuba, sob comando General de
Corpo de Exército, Ramón Espinosa Martin, que se implicaram imediatamente na
formação das Brigadas das FAPLA e na defesa do território face ao ataque das
Forces Armées Zairoises e mercenários brancos, em artificioso suporte da FLEC.
No
seu depoimento no seu livro “La batalla de Cabinda”, o General Ramón Espinosa
Martin explica:
“Para
as FAR, Angola é um teatro de operações não explorado, ao contrário de Cabinda,
essa sim, familiar.
Conhecem
a geografia do enclave, a ambição do Zaíre na sua anexação e a riqueza
petrolífera, decisiva nos primeiros anos para a emergência do estado
independente.
Valorizando
essas características, o Comandante-em-Chefe indica que Cabinda requer uma
atenção especial.
Isso
explicou o número de instrutores enviados para aquela Província, quase metade
do total, assim como o reforço em artilharia de diversos calibres.
A
distribuição desigual de instrutores e o armamento pesado não foi, de momento,
compreendido pela direcção das FAPLA, que expressa – o fundamental é salvar
Luanda (…) se perdermos Cabinda recuperá-la-emos depois (…).
Fidel
discorreu em profundidade – se por acaso se perde Cabinda, será muito difícil
recuperá-la e Cabinda é a base económica imediata para o nascente estado
independente.
Há
que salvar Cabinda e Luanda”…
O
Presidente Agostinho Neto concordou em pleno com o argumento do Comandante
Fidel de Castro e o MPLA reagiu a contento, impedindo inclusive as manobras do
então Governador do Distrito, Themudo Barata, um oficial português que depois
do 25 de Abril deu cobertura a uma outra solução para o enclave.
4
– As decisões tomadas então foram de ordem estratégica e influem ainda hoje na
conjuntura interna de Angola:
-
O Presidente Agostinho Neto decidiu a implantação de blocos no onshore e
offshore angolano de produção de petróleo e gás, atraindo a essa fórmula as
poderosas multinacionais interessadas a longo prazo na exploração do crude
angolano;
-
As multinacionais permitiram a gestação de “lobbies” a favor de
Angola, junto aos governos onde estavam e estão implantados seus interesses de
raiz;
-
A derrota das SADF na Operação Argon, que visava destruir Malembo em Cabinda,
possibilitou assim uma reviravolta na posição norte-americana em relação às
suas apreciações e abordagens para com a África Austral e Angola;
-
A persistente influência das multinacionais norte-americanas contribuiu para o
reconhecimento do governo angolano por parte dos Estados Unidos;
-
O governo angolano tem procurado a todo o transe manter o sector energético
como um sustentáculo de desenvolvimento indispensável para a promoção da paz em
Angola, no Golfo da Guiné e na Região Central dos Grandes Lagos.
Estes
ganhos em benefício de Angola e de seu povo, capazes de dar origem a alargados
consensos, de outra maneira teriam sido muito mais difíceis de obter e por
isso, reconhecer as decisões estratégicas que foram tomadas em 1975 pelo
Comandante Fidel de Castro no âmbito da Operação Carlota como da Libertação de
Angola e pelos Presidentes Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos que se
refletem até aos nossos dias, fazem parte da cultura do rumo que se conseguiu
conferir a Angola, em relação ao qual é imprescindível dar-se continuidade.
A
SONANGOL, no âmbito do estado angolano e de seus interesses estratégicos, foi
afetada quer pelo choque, quer pela terapia neoliberal, perdendo-se a certa
altura, a possibilidade duma gestão rigorosa, digna e respeitadora de todo o
povo angolano, ao ponto de, por exemplo, contribuir para o esbanjamento, o luxo
inadequado, a corrupção e até um certo “apartheid social”, com a criação
de condomínios que fomentam elites mal paradas, cujo comportamento pode colocar
em causa o próprio rumo de Angola.
A defesa do estado angolano honrando a história e esse rumo, obriga que seus servidores sejam muito mais rigorosos na gestão da “coisa pública”, avaliando os impactos negativos que redundam das políticas do choque e da terapia neoliberal, a fim de com isso saber-se “separar o trigo do joio”.
Efetivamente,
muitos que desempenharam ou desempenham cargos relevantes no estado angolano
têm demonstrado que não honram o estado angolano, nem a história de seu país,
nem com dignidade dão sequência à saga da Libertação Nacional em benefício de
todo o povo angolano.
A
ausência de rigor, fazendo prevalecer interesses pessoais ou de grupo, quantas
vezes ferindo as próprias leis em vigor, constituem a outra face da moeda da
desestabilização de que Angola tem sido vítima antes e depois de 2002 a esta
parte!
É
esse “joio” comprometido quantas vezes com interesses vindos do
exterior, que fornece o combustível que alguns, sob a bandeira da luta contra a
corrupção, utilizam de facto contra o estado angolano, sintomaticamente a
partir do exterior e com barricadas mais evidentes em Portugal (por tabela na
União Europeia) e no Brasil!
As
decisões estratégicas assumidas por Angola a partir do 4 de Fevereiro e de Cuba
a partir daquele já longínquo 26 de Julho, merecem ser honradas hoje no vigor
de medidas que, ao defender os interesses legítimos dos estados angolano e
cubano, defendendo a amizade entre os dois povos, defendam os interesses de
cada um deles e o rumo rigoroso que se nos impõe hoje em função da trilha de
Libertação dos povos oprimidos de todo o mundo!
*Reportagem
fotográfica do acto central comemorativo do 26 de Julho, Dia da Rebeldia, em
Angola (cine Tivoli, em Luanda).
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