Manuel
Carvalho da Silva* - Jornal de Notícias, opinião
As
expectativas confirmaram-se: os dados divulgados esta semana pelo INE
mostram-nos que o emprego aumentou e o desemprego diminuiu. Se analisarmos o
crescimento do emprego comparando as médias anuais de 2016 com as de 2015,
conclui-se que foram criados 56,5 mil empregos em termos líquidos; se a
comparação for feita entre os valores dos quartos trimestres de 2016 e de 2015,
o número obtido sobe para 82,1 mil postos de trabalho líquidos. Trata-se, sem
dúvida, de um resultado positivo.
Contudo,
estamos ainda longe do nível de emprego que tínhamos antes da crise (menos 131
mil postos de trabalho), a população ativa continuou a diminuir, a recuperação
do emprego acompanhou bem o crescimento económico mas este foi ainda muito
ligeiro. O emprego criado é frágil, como nos confirmam o aumento das
precariedades laborais e a persistência de baixos salários. Não há avanços na
articulação entre a melhoria do SMN e a efetivação da contratação coletiva. As
renumerações médias continuam abaixo dos valores que tínhamos antes da crise
que, como sabemos, foram diminuídos por políticas demolidoras do Governo
PSD/CDS e da troika e devem ser repostos.
Os
trabalhadores portugueses, em particular os jovens, continuam encurralados
entre uma elevada taxa de desemprego, uma diminuta proteção no desemprego, a
oferta de emprego com baixa remuneração, a ocupação de empregos e relações de
trabalho marcados por incertezas e inseguranças (aproximadamente quatro em cada
cinco novos contratos são precários) que lhes atrofiam a vida e travam o
desenvolvimento do país.
Sem
sobrevalorizar os jovens diplomados em relação aos outros jovens ou ao comum
dos trabalhadores, mas tendo presente que o país precisa de fixar os mais
qualificados, importa olhar com atenção para o que se vem passando com estes:
i) no período entre 2011 e 2015, a remuneração média de jovens com instrução
superior caiu 128 euros, valor muito acima da queda absoluta e relativa de
qualquer outra camada (ver excelente artigo de Miguel Chaves e Mariana G.
Alves, "Le Monde Diplomatique", edição portuguesa, fev. 2017) e
mantém-se baixa; ii) é conhecida a frágil capacidade da maioria das empresas
portuguesas para contratarem jovens altamente qualificados e o último ano não
apresenta sinais significativos de mudança; iii) a formação mais elevada não
serve apenas para responder às necessidades do sistema económico, mas também
para qualificar e dar eficácia à Administração Pública e a áreas estratégicas
de desenvolvimento que não se estimulam pela ação do mercado; iv) ora, a
Administração Pública ainda não recuperou o seu nível salarial e está infestada
de precariedades, as carreiras continuam congeladas, a investigação é mal paga
e vive de vínculos precários, um amplo conjunto de atividades sociais,
culturais e outras é desvalorizado. A todas estas fragilidades, acresce a
vulnerabilidade que pode surgir a partir de choques externos vindos das
incertezas que se vivem no plano europeu e mundial.
O
relançamento do emprego só será consistente com políticas de reforço de
investimento, desde logo público; com progressiva melhoria dos rendimentos que
favoreçam o consumo privado, em particular dos mais pobres; com medidas bem
formuladas para combate à precariedade que, como está sobejamente comprovado,
se transforma aceleradamente em desemprego em contextos económicos ou políticos
menos favoráveis; com sinais e práticas que travem os fatores que estão na
origem da diminuição da população ativa.
Entretanto,
é urgente proceder-se a uma análise séria e a um debate crítico das políticas
de emprego, em particular das chamadas políticas ativas, hoje dispersas por
cerca de 200 medidas e programas geradoras de um emaranhado labiríntico, que
faz perder eficácia e desorienta as pessoas que a elas precisam de recorrer.
Sem criar ilusões que erradamente colocam tais políticas como solução para
todos os problemas do mercado de trabalho, há que desviá-las da lógica do
aprofundamento da flexibilização do trabalho e da harmonização regressiva das
condições da sua prestação, e voltá-las para a valorização de um modelo de
desenvolvimento com qualificações sérias e dignidade para quem trabalha.
*
Investigador e professor universitário
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