sábado, 31 de março de 2018

Manuel de Araújo lamenta "recuo" na democracia moçambicana


O autarca de Quelimane, no centro de Moçambique, condena o rapto e agressão ao jornalista Ericino de Salema, esta semana. Manuel de Araújo, do MDM, pede justificações ao partido no poder, a FRELIMO.

Manuel de Araújo, do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), condena de forma veemente o sequestro e o espancamento, na terça-feira (27.03), do jornalista moçambicano Ericino de Salema.

É um ato "macabro", que mostra "a tendência de recuo na democracia moçambicana", diz Araújo em entrevista à DW África. "Parece que damos dois passos à frente e, depois, um passo atrás, porque este não é um caso isolado."

O autarca da cidade de Quelimane, na província da Zambézia, lembra o rapto do comentador político e académico José Jaime Macuane, em maio de 2016, e o assassinato de Mahamudo Amurane, edil da terceira maior cidade de Moçambique, Nampula, em outubro de 2017. E aponta o dedo ao partido no poder, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).

"O profissionalismo com que estes atos são realizados e a impunidade são duas marcas que mostram quem é o mandante - portanto, que vem do seio do partido FRELIMO, sem margem para dúvidas, porque, caso contrário, as instituições de Justiça teriam agido de uma forma mais profissional e mais célere", comenta Manuel de Araújo.

O edil de Quelimane acrescenta que estes atos constituem uma forma de ameaçar e de silenciar o pensamento independente, nomeadamente a liberdade de opinião, de expressão e de manifestação.

Eleições e desmilitarização

A propósito das últimas eleições intercalares em Nampula, o autarca considera que foram "livres e justas", apesar de ter havido alguns constrangimentos, nomeadamente tentativas de fraude pela FRELIMO, "prontamente desmanteladas".

"Há evidências de que a FRELIMO tem recorrido sistematicamente a métodos fraudulentos para se poder manter no poder, quer nas autárquicas, quer nas legislativas, quer nas presidenciais. Acho que essa é uma prática que deve ser condenada não só pelos moçambicanos, mas por todos os amigos de Moçambique, todos aqueles amantes da democracia no mundo inteiro."

Apesar de os partidos com assento parlamentar já terem chegado a um entendimento a propósito do novo modelo de eleição para governadores provinciais, em 2019, e autarcas, este ano, Manuel de Araújo critica a lentidão nas negociações de paz entre a FRELIMO e a maior força da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) - para o edil, o elemento fundamental nas conversações é a desmilitarização.

"Deu-se um passo [positivo], é verdade. Mas ainda há muito por fazer. Primeiro, é preciso consolidar; segundo, o fenómeno dos esquadrões da morte, que tem o apadrinhamento do partido FRELIMO e do Governo, é algo que deve ser discutido, debatido e eliminado. E os responsáveis devem ser trazidos à barra da Justiça."

Dívidas e transparência

Outra inquietação de Manuel de Araújo prende-se com as dificuldades nas negociações para a reestruturação da dívida pública moçambicana.

O autarca dá razão aos credores, que não aceitaram as condições propostas pelo Governo moçambicano, porque entende que "tem de haver transparência".

O edil considera que o Governo moçambicano não está a ser sério nestas negociações, fazendo propostas inaceitáveis nos termos em que foram apresentadas em Londres. Entretanto, avisa: "Aqueles que do lado moçambicano assim o fizeram, violando a Constituição da República de forma deliberada - não levando ao Parlamento o pacote que ultrapassava os limites dos empréstimos - devem ser responsabilizados por isso. Por outro lado, aqueles que facilitaram esses empréstimos também não podem ficar impunes."

Manuel de Araújo falou à DW África pouco antes de receber, esta quarta-feira (28.03), na Sociedade de Geografia de Lisboa, o Prémio MIL - Personalidade Lusófona, atribuído pelo Movimento Internacional Lusófono. Manuel de Araújo dedicou o galardão aos munícipes da cidade de Quelimane "pelo trabalho abnegado que têm desenvolvido para a melhoria das suas próprias condições de vida".

João Carlos (Lisboa) | Deutsche Welle

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