sexta-feira, 9 de março de 2018

MOÇAMBIQUE | Apoio da UE ao combate à corrupção é alvo de questionamento


Plano estratégico de combate à corrupção lançado nesta quarta-feira (07.03.) não convence Venâncio Mondlane. O analista considera que solução passa mais por operacionalizações e vontade política do que por estratégias.

Moçambique perdeu seis pontos, entre 2015 e 2017, no Índice de Perceção de Corrupção compilado pela organização Transparência Internacional, apresentado há duas semanas. O índice de 2017 cresceu e abrange 183 países, com Moçambique a ocupar o 157.º lugar. E a União Europeia vai ajudar o país no combate à corrupção com 9,7 milhões de euros. O seu representante em Moçambique, Stergios Varvaroussis, disse que o valor será usada no setor da Justiça, envolvendo as associações profissionais, sistema da justiça, sociedade civil e a comunicação social. O representante explica que "o programa prevê intervir nas escolas, reforçando o mecanismo de prevenção, os chamados ´grupos anticorrupção`, que o Gabinete Central de Combate à Corrupção está a implementar com o Ministério de Educação". Conversamos com o analista político e deputado do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), segunda maior força da oposição, Venâncio Mondlane sobre a situação da corrupção no país.

DW África: A estratégia ora aprovada reveste-se de algum simbolismo, se tomarmos em conta a crise financeira em que o país se encontra supostamente também por causa da corrupção...

Venâncio Mondlane (VM): Em termos de quadro legal o país nunca foi deficitário, o que o país tem em falta é um quadro institucional, falta de pessoal qualificado e sobretudo podemos falar de vontade política para que do quadro legal que temos fazer-se um pouco mais para o combate à corrupção. Sob o ponto de vista prático um plano estratégico é um conjunto de linhas de intenções a médio e longo prazo. O plano estratégico por si só não operacionaliza o combate à corrupção.

DW África: Os discursos de combate à corrupção têm aumentado por parte do Governo, em especial por parte do Presidente Filipe Nyusi, e já há algumas ações em relação a isso com julgamentos de altos funcionários do Estado. Mas ainda não há um processo em relação ao caso mais controverso que o país vive que são as dívidas ocultas. Parece que há uma tendência de se andar a volta do caso, mas não se vai adentro...

VM: A grande questão que temos, é que os poucos casos são usados como exemplo de combate à corrupção é aquilo que na linguagem corrente se pode chamar de "peixe miúdo". E penso que um sinal que o Governo e os sistema de Justiça de um  combate à corrupção sério seria justamente naqueles casos que nós sabemos que tiveram maior impacto, sobretudo na nossa economia nacional. Estamos a atravessar uma crise económica e financeira, o país está mergulhado numa profunda crise relacionada com casos de corrupção e não há uma resposta de um sistema de Justiça em relação à isso de uma forma transversal vamos dizer que o nosso sistema de Justiça está de tal maneira comprometido e não tem muita margem de manobra se não houver uma reforma total e completa para poder funcionar.

DW África: A União Europeia vai apoiar o combate à corrupção com 9,7 milhões de euros. Isso abre espaço para que essa organização possa interferir ou influenciar em assuntos nacionais, como por exemplo casos envolvendo altos funcionários do Estado?

VM: Não sou muito a favor que questões que tem a ver com a estratégia interna de combate ao crime seja dependente do financiamento exterior, porque são questões tão cruciais para a vida pública e nacional e [por isso] devíamos ter uma orçamento próprio, devia ser o Orçamento Geral do Estado a financiar uma estratégia nacional de combate à corrupção. Isso demonstraria um comprometimento nacional efetivo para se combater a corrupção. O que acontece é que, normalmente quando o financiamento é do exterior um combate à corrupção acaba resvalando naquilo que se diz na gíria, "só para o inglês ver". Não é hipótese de se fazer um combate efetivo quando apenas se vai fazendo estratégias e planos para apenas responder a uma pressão exterior. Penso que tem de haver uma pressão mais interna, e este é um chamamento a todos os moçambicanos, é que a pressão interna é muito mais importante que a pressão externa. Olhe para o caso de Angola, não precisam de grandes planos, estão a dar sinais muito evidentes em menos de sete ou oito meses de governação [com João Lourenço na Presidência], estão a dar passos que não deram nas últimas décadas. A vontade política, o brio profissional de quem está a frente do processo, a independência, a autonomia dos juízes e procuradores é muito mais importante que esse amontoado de papéis.

Nádia Issufo | Deutsche Welle

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