sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Como a ultra-direita quer dominar a Europa - Castells


Steve Bannon tira proveito da crise política e amplia sua articulação internacional. Objetivo: minar o que resta de políticas solidárias e restaurar as tradições intolerantes e retrógradas do continente.

Manuel Castells | Outras Palavras | Tradução: Marco Weissheimer, no Sul21

As eleições para o Parlamento Europeu, no dia 26 de maio, são decisivas para o projeto da integração europeia. Os ultranacionalistas em ascensão definiram como objetivo a constituição de um bloco parlamentar (um terço das cadeiras) capaz de obstruir as políticas europeias comuns que, junto com sua presença em diversos governos, possa reverter a Europa a um sistema de nações limitadas em sua colaboração a acordos específicos, sempre priorizando os interesses nacionais. Também defendem a redução drástica da imigração, o enfrentamento com o Islã em defesa da Cristandade e a restauração do patriarcado tradicional, eliminando a proteção aos direitos de homossexuais e mulheres. O que era uma tendência em toda a Europa, exemplificada na Espanha pelo Vox e por um setor do PP, está convertendo-se em um projeto coordenado. Prepara-se para esses dias, em Bruxelas, o lançamento de uma fundação denominada “O Movimento”, impulsionada por Steve Bannon, que foi estrategista de Trump, eficiente diretor de sua campanha presidencial e assessor especial na Casa Branca.

Seu enfrentamento pessoal com a família do presidente, que ele considera cheia de golpistas, o levou a ruptura com Trump e com a bilionária família Mercer, financiadora de sua empresa midiática Breitbart News, propagandista do supremacismo branco. Sem abandonar a política estadunidense, na qual ainda conta com apoios na “direita alternativa”, Bannon decidiu estender sua cruzada a Europa, aproveitando o crescimento da extrema direita e apostando em uma mobilização das nações cristãs para salvar os valores da civilização ocidental. Ele se instalou em Bruxelas, protegido pela extrema direita flamenca, em particular pelo político Mischael Modrikamen, que forneceu-lhe apoio logístico. Com isso começou sua peregrinação pelo Velho Continente para construir uma base ideológica e organizativa comum. No espaço de um ano, as adesões explícitas a seu projeto são suficientemente importantes para torná-lo crível.

Começando por Matteo Salvini, vice-presidente e homem forte do governo italiano, e Viktor Orban, o primeiro-ministro húngaro, xenófobo e anti-europeu. Além disso, tem relação próxima com Marine Le Pen e já discursou em assembleias da Frente Nacional. Ele falou também aos “coletes amarelos”, cuja mobilização foi qualificada por Salvini como “o princípio de uma nova Europa”. Na Espanha, apoia explicitamente o Vox, e já conversou com Bardaji, um de seus dirigentes, que viajou a Bruxelas para incorporar-se a esta aliança. Na Holanda conta com a cumplicidade de Geert Wilders, o dirigente xenófobo holandês cujo partido se converteu na segunda força do parlamento. Na Itália, os “Fratelli d’Italia”, formação neofascista aliada da Liga do Norte, também entrou no clube.

Naturalmente, Bannon conta com vínculos profundos na frente pró-Brexit, no Reino Unido, e, em particular, com Boris Johnson, a quem apoiou quando estava na Casa Branca. Na Alemanha, ele se reuniu com Alice Weidel, dirigente da “Alternativa pela Alemanha”, com uma projeção de 15% de votos para as eleições europeias. Também cultivou contatos com os assessores do ultranacionalista primeiro-ministro polaco, e com formações de extrema-direita na República Tcheca, Finlândia, Dinamarca, Noruega e Suécia, ainda que, nestes casos, não tenha formalizado ainda nenhuma colaboração.

O que Bannon pode oferecer? Em princípio, não financiamento, porque as leis eleitorais europeias proíbem a injeção de fundos estrangeiros nas campanhas. Sua contribuição, até agora, é sua experiência e conhecimento de sistemas tecnológicos de prospectiva e manipulação eleitoral que tão bem funcionaram nos Estados Unidos, em particular na produção de desinformação nas redes sociais. Mas, sobretudo, está construindo uma rede de contatos e de elaboração estratégica cuja efetividade provém da sinergia entre seus participantes.

O projeto de Bannon é mais ambicioso, porém, e pretende ir até o que ele acredita ser a raiz do problema: a defesa dos valores religiosos e morais da civilização judaico-cristã. Neste projeto, tem forjado alianças com o setor tradicionalista da Igreja católica e, em particular, com os poderosos cardeais Burke (EUA) e Martino (Itália), que estão liderando abertamente a rebelião doutrinal contra Francisco. A convergência entre Bannon, um católico divorciado três vezes, e o irredentismo dos cardeais tem uma expressão organizativa e territorial: o Instituto pela Dignidade Humana, criado em 2008 em Roma pelo britânico Benjamin Harnwell, ajudante do líder conservador britânico e europarlamentar Nirj Deva, bilionário católico de origem cingalesa e diretor do Bow Group, um influente think tank conservador inglês, anti-europeu e católico fundamentalista. Deva preside o comitê internacional do Instituto, cujo Conselho Assessor é dirigido pelo cardeal Burke e cujo presidente honorário é o cardeal Martino.

Em 2018, Harnwell obteve do governo italiano o aluguel por tempo indeterminado da Cartuja de Trisulti, localizada a 130 quilômetros a sudeste de Roma, monumento histórico que está sendo reabilitado para acolher programas e atividades destinadas à exaltação da Cristandade. O principal projeto do Instituto é a criação de uma Academia para o Ocidente Judaico-Cristão, acolhendo duzentos alunos que serão selecionados entre os movimentos nacionalistas europeus, a partir de 2020. Bannon, amigo do cardeal Burke desde 2016, como assessor especial do Instituto, está preparando o currículo da formação e selecionando os ativistas que receberão essa formação que será, ao mesmo tempo, religiosa, política e tecnológica.

De onde vem o dinheiro para o Instituto e, sobretudo, para “O Movimento”? Esse é um véu espesso que ainda não se conseguiu rasgar. Em relação ao Instituto, há doações do político Luca Volonte, investigado pelo recebimento de fundos do Azerbaijão. Mas é provável que Deva tenha utilizado sua rede global de negócios para apoiar seu protegido e seus amigos do Vaticano. Quanto a Bannon, ainda que ele diga que o dinheiro vem de sua fortuna pessoal, é provável que tenha tecido uma rede oculta de milionários xenófobos e racistas, que veem nele sua última esperança de supremacia.

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Governo timorense quer abrir nova frequência para ligação aérea entre Díli e Bali


Díli, 25 jan (Lusa) -- O Governo timorense autorizou uma nova companhia aérea a operar na rota entre Díli e a Indonésia como medida para aumentar a competitividade na ligação e reduzir os preços, disse à Lusa a responsável do regulador do setor.

"Já aprovámos a abertura de uma nova frequência para ter um outro operador na ligação com a Indonésia", disse à Lusa Rosália Ximenes Varela presidente do Conselho de Administração da Autoridade de Aviação Civil de Timor-Leste (AACTL).

"Timor-Leste não tem aviões próprios por isso precisamos de recorrer a voos de outros países", explicou.

Rosália Varela disse que a autorização permitirá voos para Kupang e Bali e que espera que essas rotas possam "começar em breve".

Os comentários surgem perante o aumento da preocupação em Timor-Leste relativamente aos preços cada vez mais elevados das ligações aéreas para o país.

Em particular no caso da ligação entre Díli e Bali, a mais movimentada do país, cujos preços mais que duplicaram nos últimos meses, estando a ser vendidos a preços que variam entre os 400 e os 650, ida e volta.

Sem companhia área própria, Timor-Leste depende de empresas de outros países para as suas ligações aéreas sendo que, atualmente, o país é servido por três monopólios, uma para cada um dos destinos.

Em concreto a australiana Air North (do grupo Qantas) na ligação até Darwin, as indonésias Nam Air, Sriwijaya e Citilink (todas do grupo Garuda) na ligação a Bali e, no caso da ligação até Singapura, voos da Air Timor feitos em formato 'charter' com aviões da SilkAir, do grupo Singapore Airlines.

"Estamos preocupados com o assunto e a ver o que podemos fazer", disse Rosália Varela.

Questionado pela Lusa sobre o assunto, o primeiro-ministro Taur Matan Ruak também admitiu à Lusa preocupação, recordando que o Governo "defende o mercado livre" onde o preço é determinado pela oferta e procura.

"É o mercado que determina. Quando há muita procura o preço aumenta. Quando há menos procura o preço baixa. Pior ainda quando não há competição", disse.

"É uma questão que vai ser discutida, esperamos encontrar uma solução. Não acredito que seja tão simples como a gente pensa, mas espero que consigamos chegar a uma solução", disse.

Uma das soluções, mas também uma das opções mais complexas tem sido a possibilidade de Timor-Leste ter uma empresa aérea nacional.

Florêncio Sanches, diretor executivo do Serviço de Registo e Verificação Empresarial (SERVE), disse à Lusa que tem havido interesse crescente nessa possibilidade, mostrando-se disponível para ajudar no diálogo com o Governo.

"Cinco empresas contactaram-nos manifestando interesse em estabelecer uma companhia área neste país. Ainda estão na fase de consultas", disse à Lusa.

"Não é só complicado, mas é arriscado também. Mas temos que fazer qualquer coisa nesta área. São empresas de vários países que estão a estudar isso, algumas são empresas aéreas outras são investidores disponíveis para apostar no setor", explicou.

"Alguns querem voar para Hong Kong, Sydney, Jacarta e depois daí para outras ligações", disse.

Rosália Varela disse que, até ao momento, ainda não deu entrada na AACTL qualquer pedido, mas que o regulador está disponível para ajudar qualquer empresa aérea.

"Estamos abertos a essas propostas, mas até ao momento ainda não recebemos qualquer proposta ou candidatura. Estamos sempre preparados para trabalhar com qualquer empresa que queira trabalhar com Timor-Leste", disse.  

ASP // JPF

Presidente timorense inicia programa para plantar um milhão de árvores até 2022


Díli, 25 jan (Lusa) -- O Presidente da República timorense iniciou hoje a campanha "Um cidadão, uma árvore" com o objetivo de liderar um esforço para plantar um milhão de árvores até ao final do seu mandato, em 2022.

"Este slogan pretende chamar a atenção de todos para o papel de cada cidadão como uma força coesa, capaz de expressar a vontade coletiva: florestar o nosso país para garantir um ambiente são e saudável para as gerações atuais e futuras", afirmou Francisco Guterres Lu-Olo.

"Em qualquer país do mundo, um futuro próspero e saudável significa viver num ambiente 'verde' e diversificado, seja nas montanhas ou nas planícies, nos ribeiros, nas margens dos lagos e nas zonas costeiras", disse ainda.

A campanha foi hoje lançada em três zonas dos arredores da capital timorense - Tasi Tolu, Gólgota e Marabia -- numa cerimónia na qual participaram várias individualidades nacionais e internacionais e representantes de diversas estruturas da sociedade civil.

As primeiras de um grupo de 3.600 árvores começaram hoje a ser semeadas nas zonas abrangidas, com o processo de plantação a continuar agora de foram regular.

Envolvendo várias instituições do país, a campanha começa, para já, nas três zonas de Díli, mas será progressivamente ampliada.

Cada uma das áreas escolhidas tem "um significado especial" para Timor-Leste: Tasi Tolu porque foi a zona foi visitada há 30 anos pelo papa João Paulo II e Golgata por ali estar a gruta de N.ª Senhora, recordou Lu-Olo.

"No entanto, estas duas áreas correm o risco de perderem a sua beleza natural. Existem já várias zonas desflorestadas, tendo-se verificado desabamento de terras devido ao corte de árvores para fazer face às necessidades diárias da população", disse.

Marabia, por seu lado, foi um local importante da resistência à ocupação indonésia, tendo sido ali que "os guerrilheiros deram sinal de que a luta pela libertação nacional continuava viva".

"O primeiro sinal surgiu a 10 de junho de 1980 com o ataque em Marabia que precedeu a primeira conferência para a reorganização da Resistência Nacional em 1981 em Maubai, na região militar central", disse.

"Este local histórico merece, por isso, a nossa atenção especial. Também aqui se tem verificado desabamento de terras devido ao corte indiscriminado e abusivo de árvores. É nosso dever florestar e restaurar o esplendor de Marabia. Futuramente, Marabia fará parte dos roteiros de turismo histórico", afirmou.

Lu-Olo saudou os vários grupos da sociedade civil timorense que, nos últimos tempos, têm intensificado os esforços para lidar com os vários problemas ambientais em Timor-Leste.

A desflorestação das zonas montanhosas timorenses continua bastante elevada, com as famílias a recorrerem às árvores como combustível para cozinhar ou como material para casas e outras estruturas.

Esse processo, a par de uma construção desordenada, especialmente nas montanhas em redor de Díli, tem agravado a erosão, com toneladas de terra a serem arrastadas para as zonas baixas em períodos de chuvas fortes.

"A partir de hoje, esperamos que cada cidadão se comprometa ainda mais a honrar este grande compromisso: plantar uma árvore e cuidar dessa árvore até ter as suas raízes bem firmes na terra e os seus ramos carregados de folhas", disse.

"Desafiamos todos os cidadãos, de todas as idades, homens e mulheres, a plantarem árvores em locais que lhes permitam prestar os cuidados necessários ao longo das diferentes fases de crescimento", afirmou, referindo que a campanha vai chegar a todas as aldeias do país.

ASP // JMC

Macau é o território lusófono com maior índice de liberdade económica


Macau, China, 25 jan (Lusa) - A economia de Macau é a mais livre dos territórios lusófonos e ocupa a nona posição entre as regiões da Ásia-Pacífico, de acordo com o relatório anual da Heritage Foundation, divulgado hoje.

O Índice de Liberdade Económica 2019 coloca Macau no 34.º lugar no 'ranking', com 71 pontos, bem acima do restante universo lusófono: Cabo Verde (73.º), São Tomé e Príncipe (134.º), Guiné-Bissau (135.º), Brasil (150.º), Angola (156.º), Moçambique (163.º), e Timor-Leste (172.º).

Macau está também à frente de Portugal, que ocupa este ano o 62.º lugar.

Por outro lado, entre as 43 regiões da Ásia-Pacífico, o pequeno território que viveu mais de 400 anos sob administração portuguesa aparece em nono, a seguir a Hong Kong, Singapura, Nova Zelândia, Austrália, Taiwan, Malásia, Coreia do Sul e Japão.

Hong Kong lidera o 'ranking', contrastando fortemente com a China continental, que ocupa o 100.º lugar na lista que contempla a economia de 180 países. A Venezuela surge no penúltimo posto, à frente apenas da Coreia do Norte.

O Índice de Liberdade Económica distribui os países por cinco secções: "livres" (80 a 100 pontos), "quase livres" (70 a 79,9), "moderadamente livres" (60 a 69,9), "maioritariamente não livres" (50 a 59,9) e "reprimidos" (40 a 49,9).

De acordo com a Autoridade Monetária de Macau, a região tem vindo a ser classificada, nos últimos 11 anos, como uma economia "moderadamente livre".

FST // JH

Moçambique | Sociedade civil lança nova petição contra dívidas ocultas


Organizações da sociedade civil moçambicana recolhem assinaturas para pedir ao Conselho Constitucional do país a anulação e declaração da inconstitucionalidade de parte das dívidas ocultas do Estado.

"Que seja declarado nulo, por violação da lei em sentido amplo, o art.º 1 da resolução da Assembleia da República que aprova a Conta Geral do Estado referente ao exercício económico de 2015", lê-se na petição lançada pelo Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO) e pelo Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) de Moçambique, divulgada esta sexta-feira (25.01).

Aquela Conta Geral do Estado é a que inclui nas contas públicas as dívidas não declaradas que uma investigação judicial norte-americana revelou no início deste ano terem servido para enriquecimento pessoal de vários suspeitos que montaram um esquema de corrupção e branqueamento de capitais.

O pedido da sociedade civil diz respeito aos empréstimos concedidos a empresas de fachada de segurança marítima, ProIndicus e MAM, que correspondem a 60% das chamadas "dívidas ocultas", no total de dois mil milhões de dólares.

Esta ação exclui a Ematum, outra suposta empresa, ligada às pescas, mas cuja dívida foi transformada em títulos da dívida ("eurobonds”) transacionados em mercados internacionais e sobre os quais Moçambique se encontra em incumprimento.

Em 2017, o FMO já tinha pedido que o Conselho Constitucional se pronunciasse sobre a legalidade da Conta Geral do Estado de 2015, mas não obteve resposta.

Organizações contra as dívidas

A ação do FMO e IESE surge depois o Centro de Integridade Pública (CIP), outra organização da sociedade civil, ter lançado há uma semana a campanha "Eu não pago as dívidas ocultas".

O CIP ofereceu "t-shirts" com a frase estampada e quem as veste, incluindo diversas figuras públicas, tem publicado mensagens nas redes sociais contra a negociação de Moçambique com os credores das dívidas.

As autoridades confiscaram parte das camisolas a quem saía da sede do CIP na segunda-feira, classificando a campanha como uma manifestação ilegal, ao mesmo tempo que o primeiro-ministro, Carlos Agostinho do Rosário, referiu que o Governo não está a pagar as dívidas ocultas.

O governante acrescentou esta semana que as revelações feitas pela investigação norte-americana "trazem novos elementos para o diálogo com os credores".

O ex-ministro das Finanças de Moçambique, Manuel Chang, três ex-banqueiros do Credit Suisse e um intermediário da empresa naval Privinvest foram detidos em diferentes países desde 29 de dezembro a pedido da Justiça norte-americana, que se prepara para julgar o caso por ter passado por bancos de Nova Iorque.

Agência Lusa, tms | em Deutsche Welle

"Morte de Andre Hanekon deixa autoridades moçambicanas em situação díficil"


A morte do sul-africano acusado de organizar ataques armados em Cabo Delgado pode afetar as relações entre Moçambique África do Sul, considera analista. E a autópsia foi feita hoje (24.01.) sem o consentimento da viúva.

Depois de uma detenção irregular, segundo a lei moçambicana, efetuada por militares na província nortenha de Cabo Delgado e após subsequente detenção pela polícia, o empresário sul-africano Andre Hanekon acabou por perder a vida no Hospital Provincial de Pemba.

No dia 19 de janeiro teve convulsões, o que obrigou a sua evacuação para o hospital e no dia 23 morreu.

"Quando entrou no hospital, a primeira suspeita do médico foi de que tinha sido envenenado", conta a viúva Francis Hanekon:

O Ministério Público acusava Andrew Hanekon de ser o financiador, logístico e coordenador dos ataques armados contra aldeias de Cabo Delgado. Segundo as autoridades, o objetivo era "criar instabilidade para impedir a exploração de gás natural na província. Mas a sua esposa refuta as acusações.

E Francis Hanekon sublinha que na altura da detenção, em outubro de 2018, Andre Hanekon não tinha nenhum problema de saúde: "Nada, nada, nada... Não tomava medicamentos para nada. [Gozava de boa saúde], trabalhava todos so dias com os trabalhadores. Só apanhava malária de vez em quando, mas de resto não tinha problemas. Não tinha diabetes, não tinha nada."

Autópsia sem autorização da viúva

E já nesta quinta-feira (24.01.) as autoridades fizeram a autópsia, a contra-gosto da viúva, deixando-a mais afetada: "Ouvi que o Hospital de Pemba já fez a autópsia sem a minha autorização. O Governo sozinho já fez autopsia sem que eu tenha assinado autorização para isso."

Esta morte acontece depois das autoridades sul-africanas terem prontamente pedido esclarecimentos a contra-parte moçambicana. Inclusivamente o caso foi um dos temas centrais da visita que o Presidente da África do Sul fez à Moçambique no dia 14 e janeiro.
Cyril Ramaphosa e o Presidente moçambicano Filipe Nyusi frisaram a necessidade de se aguardar pelo curso normal da justiça e deixar as instituições competentes realizarem o seu trabalho no âmbito da separação de poderes.

Relações África do Sul - Moçambique afetadas

Será que a morte de Hanekon afetará as relações  entre Moçambique e a África do Sul? Silvestre Baessa é especialista em boa governação e responde: "Penso que é um revés muito grande. Quando uma figura desta natureza, que é acusada de ser a promotora de uma ação de violência contra um Estado, morre nas mãos das autoridades desse país é um revés muito grande."

O especialista lembra que "é obrigação do Estado moçambicano zelar pela integridade física, mesmo numa situação em que o cidadão estrangeiro está a ser investigado por crimes que tenham sido cometido nesse país. E olhando para a idade e para o tempo de permanência na cadeia era de se esperar que as autoridades tivessem tomado medidas adicionais de proteção. E isso acaba afetando as relações entre dois estados."

E Baessa ressalta: "Creio que sobretudo para a África do Sul pelo envolvimento do Governo sul-africano ao tentar perceber a ligação de um cidadão seu que vivia em Moçambique há mais de 25 anos e que tinha uma folha limpa até então, isso fere essas relações, até que ponto já é discutível."

O Ministério Público alega que foram encontradas na casa de Andre Hanekon material que prova o seu envolvimento nas incursões armadas - armas brancas, pólvora e arcos e flechas.

Para Silvestre Baessa o caso Hanekon é o espelho do grande desafio que as autoridades moçambicanas têm em acusar ou condenar supostos envolvidos no caso dos ataques em Cabo Delgado. E o especialista em boa governação recorda que julgamentos anteriores relativos aos ataques mostraram uma qualidade fraca em termos de provas.

Autoridades moçambicanas em situação delicada

Como ficam as autoridades na sequência da morte de Hanekon? "O facto da qualidade das provas que são apresentadas serem extremamente fracas, de estar numa situação ilegal em que foram violados todos os outros direitos em termos do que são as regras de direito em relação a isso, e depois tem o facto de ter morrido sob custódia policial. Esses três elementos colocam as autoridades moçambicanas numa situação, de muita fragilidade", responde Baessa.

E finalizando o especialista em boa governação diz que "não há muita confianças nas instituições nem em relação ao sistema de segurança em proteger prisioneiros, assumindo que ele era um, porque foi preso num contexto de semi-guerra. Então, isso coloca o país numa situação muito mais complicada."

Os ataques de homens armados até aqui não devidamente identificados começaram em outubro de 2017 e já fizeram aproximadamente 200 mortos. Também há danos materiais resultantes de incêndios de casas perpetrados pelos atacantes. Embora as forças de defesa e segurança estejam na região não têm conseguido impedir as suas ações.

Nádia Issufo | Deutsche Welle

Na foto: Cyril Ramaphosa (esq.) e Filipe Nyusi

Generais e oficiais vão manifestar-se em Luanda na segunda-feira


Em causa, subsídios retirados há vários anos das suas pensões de reforma

Luanda poderá ser na segunda-feira, 28, palco de uma manifestação inédita de dezenas de oficiais reformados das Forças Armadas Angolanas (FAA) em protesto contra a retirada de alguns subsídios das suas pensões de reforma.

Desde 2009, vários oficiais generais, superiores e subalternos, viúvas e órfãos de guerra viram os seus subsídios cortados pela caixa social das FAA.

O caso foi a tribunal que ordenou o pagamento dos valores aos pensionistas mas até agora nada de dinheiro.

Nesta quinta-Feira, 24, os oficiais generais decidiram em reunião que vão manifestar-se diante o tribunal da Maianga em Luanda.

Jose Alberto Nelson
Limukeno, general reformado e presidente da Associação dos ex-Oficiais Generais, Superiores e Subalternos Reformados, disse que haverá uma concentração em frente à sede da sua organização e depois uma marcha até ao tribunal para “exigir justiça”.

Os ex-oficiais dizem que esgotaram todas as formas para resolução do problema.
"Várias cartas já foram escritas a José Eduardo dos Santos e João Lourenço e nada”, concluiu aquele general.

Aborto continua a provocar debate na sociedade angolana


Nova legislação foi aprovada esta semana

A Assembleia Nacional angolana aprovou, em definitivo, nesta semana o novo Código Penal, que mantém a criminalização do aborto, embora com algumas excepções.

Após a entrada em vigor da legislação, a interrupção da gravidez é consentida em caso de perigo de morte ou de lesão grave para a mãe, nos caso do feto ser inviável e de violação sexual ou quando o bebé possa vir a sofrer de doença grave ou malformação incuráveis.

A interrupção, de acordo com cada situação, pode acontecer nos primeiros quatro ou seus meses de gravidez.

A UNITA, maior partido na oposição em Angola, diz que apesar de ter votado a favor do novo Código Penal, "em nenhuma circunstância aprova a legalização do aborto", enquanto o MPLA, no poder, diz ser a favor das "excepções sobre a penalização do aborto".

As posições também estão divididas entre as organizações da sociedade civil.

Ondjango Feminista, organização cívica que se manifestou durante o ano passado contra a criminalização do aborto, diz que o novo Código Penal alcançou alguns avanços, mas que “a luta é a despenalização total do aborto”, como reitera Paula Sebastião da Ondjango Feminista.

Opinião contrária tem Igreja Católica, para a qual, diz o padre Pio Wakussanga “a medida penal é muito pequena e que tudo que a Igreja defende é para a importância da vida”.
A Igreja Nova Apostólica pronunciou-se igualmente contra aprovação do aborto, apesar de respeitar as opções das demais pessoas sobre a matéria.

Coque Mukuta | VOA | Foto: Parlamento angolano

Cabo Verde não tira melhor proveito do comércio com os Estados Unidos, diz embaixador Veiga


O embaixador de Cabo Verde nos Estados Unidos, Carlos Veiga, diz que o seu país ainda não tira melhor proveito do acordo de livre comércio “ AGOA”, que permite a colocação de produtos africanos no mercado americano com isenção aduaneira.

Após a abertura da conferência “As relações Cabo Verde – Estados Unidos, 200 anos depois”, realçou a necessidade do país produzir para exportar, aproveitamento as oportunidades que AGOA proporciona.

Veiga enfatiza também a necessidade do país conhecer melhor e absorver as capacidades da diáspora, com particular enfoque para os Estados Unidos da América, país que acolhe a maior comunidade cabo-verdiana no estrangeiro.

Sobre a emigração no momento em que a administração Trump aperta o cerco nesse capítulo, Veiga disse que a comunidade cabo-verdiana está integrada e continua a contribuir nas diferentes esferas do país.

Quanto à deportação, o embaixador explica que a actual administração está mais incisiva na aplicação da lei, facto que torna cada vez mais importante jogar-se na prevenção, evitando a que sobretudo os jovens caiam em situações de conflito com a lei dos EUA.

Acompanhe:



Eugénio Teixeira | VOA

"Lei que garante mulheres na política não é respeitada na Guiné-Bissau"


A pouco mais de um mês das legislativas, o Conselho das Mulheres e Raparigas da Guiné-Bissau acusa os partidos políticos de não cumprirem a lei de quota, que prevê a presença de 36% das mulheres na política.

O Supremo Tribunal de Justiça já notificou os partidos políticos e respetivos candidatos a deputados a corrigir as falhas nos dossiês, incluindo o número de mulheres nas listas das candidaturas, que até agora não correspondem aos 36% previstos pela lei das quotas, em vigor na Guiné-Bissau.

No entanto, alguns partidos que já entregaram as candidaturas, referentes às eleições legislativas de 10 de março, afirmaram à DW África que cumprem, na medida do possível, a lei e que não podem forçar ou colocar mulheres se as mesmas não querem participar nas listas.

Já Alberto Nambeia, líder do Partido da Renovação Social (PRS), assegurou que o partido está disposto a corrigir as falhas nos dossiês. 

Com a promulgação da lei das quotas pelo Presidente guineense, José Mário Vaz, a 4 de Dezembro, a Guiné-Bissau passou a fazer parte do grupo composto por mais de 80 países, que adotaram medidas corretivas e temporárias para fazer avançar a participação das mulheres na politica e nas esferas de decisão. 

À DW África, Francisca Vaz, uma das vozes do Conselho das Mulheres e Raparigas Guineenses, confirma que nenhum dos 24 partidos políticos cumpriu com a lei na lista dos candidatos a deputados em apreciação no Supremo Tribunal de Justiça, pelo que têm até final da próxima semana para corrigir. 

"Neste momento, existem candidaturas, mas nenhum partido atingiu a percentagem que nós exigimos, e que hoje está publicada como lei no boletim oficial do Estado. Dentro de poucos dias, iremos ao Supremo Tribunal questionar como está o processo, porque sabemos que nenhum partido cumpriu a lei e estamos preocupadas com isso. Estamos a trabalhar e vamos reagir sobre isso". 

Consequências pesadas aos incumpridores da lei

Francisca Vaz avisa, desde já, que o incumprimento da lei trará pesadas consequências aos partidos políticos durante as eleições legislativas de 10 de março. Segundo a porta-voz, o fato das listas ainda serem provisórias, permite aos partidos fazer as devidas correções no imediato. 

O Conselho das Mulheres e Raparigas Guineenses realiza-se nos próximos dias 29 e 30 de janeiro, em Bissau. O segundo forúm terá como foco a paz, sob o lema – Mulheres Unidas na luta pela Reconciliação, Paz e Desenvolvimento. Francisca Vaz, coordenadora do Conselho, adiantou que um dos temas de destaque, será a implementação da Lei da Paridade.

"Contamos com a participação de 400 mulheres, que vêm de todo o território nacional, e 100 convidados nacionais e estrangeiros. Neste segundo fórum, o ambiente é outro. A conjuntura é de pré-campanha eleitoral e por isso, iremos analisar a problemática da Lei da Paridade, a ver se os partidos políticos estão conscientes que a devem cumprir".

Outro dos temas que estará em discussão é a Lei da Terra, que é "uma das grandes preocupações das mulheres".  Francisa Vaz acresentou ainda que serão discutidos "aspetos económicos, nomeadamente o empoderamento económico da mulher guineense" e também, "o código de conduta eleitoral, com o objetivo de promover e impulsionar o bem-estar sustentável na Guiné-Bissau". 

Justiça prepara-se para anunciar candidatos 

Entretanto, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Paulo Sanhá, garantiu que, na próxima semana, será divulgada a lista definitiva e oficial dos candidatos a deputados aprovadas pela instância máxima da Justiça, que está a analisar ao detalhe as candidaturas dos 24 partidos. 

Por outro lado, a Comissão Nacional de Eleições garante que estão reunidas as condições do pleito se realizar dentro da data prevista e aguarda pela afixação da lista dos candidatos, para proceder ao sorteio dos partidos para posicionamento nos boletins de voto e, finalmente, divulgar os cadernos eleitorais.

Braima Darame (Bissau) | Deutsche Welle

Portugal | A Avenida da Liberdade não é para negros


"A Opinião" de Fernanda Câncio, na Manhã TSF

Segunda-feira aconteceram duas coisas que não me lembro de ter alguma vez visto em Lisboa.

A primeira foi uma manifestação maioritariamente de jovens negros, unidos na indignação face a um episódio de violência policial num bairro periférico. Uma manifestação convocada em horas, sem intervenção de qualquer associação ou movimento institucional, que quis mostrar-se ao país e ocupar o centro da capital num protesto contra o racismo e a brutalidade da polícia.

A segunda foi o facto de a polícia ter dispersado uma manifestação com balas de borracha.

Ambas estas coisas são, creio, estreias absolutas. No entanto, nenhuma delas foi relevada como tal. É estranho.

A ausência de representação e de participação política da população negra portuguesa é uma evidência inquestionável. Perante uma excepção a esse silêncio e invisibilidade, seria de esperar que os media a valorizassem. Mas o que vimos foi a manifestação ser tratada como um desacato, uma acção delinquente, não como o marco cívico que é. E a violência que a esmagou a ser apresentada como proporcional, justificada, evidente na sua necessidade. Porquê?

Teriam os media assumido de igual modo a veracidade da versão policial e a necessidade de uma repressão tão violenta se os manifestantes fossem outros? Que sabiam, aliás, os media daqueles manifestantes, a não ser que eram maioritariamente negros?

Por serem negros e por se tratar de uma manifestação de repúdio em relação à intervenção da PSP no bairro da Jamaica, foram descritos em todo o lado como "moradores do bairro da Jamaica". Sabemos a que é que moradores de bairros ditos "problemáticos" equivalem no léxico geral: "marginais"; "perigosos"; "criminosos". É essa a leitura cromática automática: uma leitura que ajuda a aceitar a versão da polícia - a de que foi "obrigada" a disparar porque lhe atiraram pedras. Afinal, que outra coisa iriam os "jovens dos bairros" fazer ao centro da capital senão distúrbios?

Nenhum jornalista estava presente quando o apedrejamento alegadamente ocorreu; nenhum jornalista viu. Mas os jornalistas afirmaram como se tivessem visto. Tornou-se a verdade oficial, mesmo surgindo relatos de manifestantes a contestá-la.

Perante uma manifestação contra a actuação da PSP e o racismo institucional, uma manifestação que pedia justiça, os media resolveram, assim, sem sequer um mínimo de investigação, de questionamento, de justiça, que a actuação da PSP contra essa manifestação, usando meios coercivos extraordinários, se justificou sem qualquer dúvida.

Jovens negros saíram à rua para falar, para dizer, para gritar, para fazer política. Para serem vistos, tidos em conta. E os media escolheram ignorá-los.

Escolhemos não os ver, não os ouvir. Escolhemos não lhes dar sequer o benefício da dúvida. Como nas lojas em que, quando entram, são de imediato seguidos pelos seguranças, dissemos-lhes que o centro da capital, a Avenida da Liberdade, o lugar de todos os protestos, não é para eles.

Que voltem ao silêncio, à invisibilidade, à revolta surda. Que voltem à raiva e ao desânimo. Que voltem à humilhação quotidiana, ao «preto, vai para a tua terra«. A bem ou a tiro.

Fernanda Câncio | TSF | opinião

Portugal | Deputados "mentiram sabendo que estavam a mentir"


O homem que presidiu à primeira Comissão de Inquérito à CGD dispara em várias direções. Acusa deputados de faltarem à verdade e afirma que os estudos sobre as necessidades do banco público foram feitos pelo Banco de Portugal com a ajuda de Mário Centeno. Matos Correia afirma ainda que a Caixa "não é uma extensão do Ministério das Finanças".

"Nunca imaginei que o nível de mentira que ouvi no Parlamento atingisse aquilo que atingiu hoje. Ouvi um conjunto de colegas meus a mentir sabendo que estavam a mentir apenas para branquearem a sua posição". É assim que José Matos Correia descreve o debate desta quinta-feira sobre as irregularidades na Caixa Geral de Depósitos (CGD). E não se coíbe de dar como exemplo a deputada bloquista, Mariana Mortágua, "quando tentou salvaguardar a posição do Bloco de Esquerda, que esteve desde o início a bloquear o funcionamento a Comissão de Inquérito".

"Havia interesse em acabar com a Comissão de Inquérito o mais depressa possível"

José Matos Correia, deputado do PSD, ex-secretário-geral do partido, presidiu à primeira Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou os negócios da Caixa Geral de Depósitos (CGD), em 2016. Viria a demitir-se, meses mais tarde, por não concordar com o facto de ter ficado fora do objeto da Comissão o processo de recapitalização da CGD. Por outro lado, expressou discordância com a forma como esse argumento serviu para travar requerimentos potestativos do PSD e do CDS. Um tema que recordou à TSF, no Às Onze no Café de São Bento. "Foi-se percebendo que havia, de facto, um interesse em acabar com a Comissão Parlamentar de Inquérito o mais depressa possível".

Por isso, é categórico: "Fiquei muito mal impressionado com a CPI a que presidi. Foi a primeira e será a última. Assisti, em direto, ao suicídio do BE e do PCP. O problema na CPI foi não criar ruturas na geringonça." O mesmo não pode dizer da atuação da CMVM e do Banco de Portugal, a quem tece elogios: "Eles fizeram o que tinham que fazer. Foram corretíssimos na defesa do sigilo bancário".

"BdP deve desencadear processo de perda de idoneidade"

Mas ao regulador, deixa ainda um conselho: o Banco de Portugal "tem a possibilidade de desencadear um processo de perda de idoneidade, para gerir bancos, de pessoas que tenham praticados atos gravemente lesivos à CGD", apesar da forma como todo o processo tem sido gerido "anular completamente a responsabilidade política".

Matos Correia afirma que o problema não é o "voyeurismo da direita", como acusou o Ministro das Finanças, Mário Centeno. O problema, refere o deputado social-democrata, é toda a gente ter acesso ao relatório menos os deputados. "Os contribuintes têm o direito de saber o que aconteceu e como aconteceu", ou não fosse a CGD um banco do Estado.

"A Caixa Geral de Depósitos não é uma extensão do Ministério das Finanças"

Por ser um banco público, Matos Correia defende ainda que a CGD tem que ser gerida como tal, ou seja, reconhece que tem de ter um conjunto de prioridades que não a façam confundir com um banco comercial normal. Mas deixa um aviso: "A Caixa Geral de Depósitos não é uma extensão do Ministério das Finanças". Agora, uma coisa é certa: "O Estado enquanto acionista deve ser capaz de garantir a orientação estratégica do banco", refere.

Depois da injeção de capital de quatro mil milhões de euros, a Caixa teve que fechar balcões, aumentar comissões - até sobre pensionistas -, vender negócios e concorrer com os privados em pé de igualdade.

A versão preliminar da auditoria revelou graves irregularidades, principalmente entre 2005 e 2010. E sobre este ponto, Matos Correia atira ainda mais uma acha para a fogueira: "Os estudos sobre as necessidades da CGD foram feitos pelo BdP e com a ajuda do gabinete de Mário Centeno."

Sandra Xavier | TSF

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Portugal | Moradores do bairro da Jamaica protestam esta sexta-feira em frente à Câmara do Seixal


António Tonga, membro do Coletivo Consciência Negra, explicou que o objetivo do movimento é dar espaço à comunidade para mostrar que “os negros e as pessoas da periferia têm sido alvos em relação à questão policial e da falta de habitações dignas”

Associações e moradores do bairro da Jamaica protestam esta sexta-feira em frente à Câmara do Seixal, no distrito de Setúbal, contra a “brutalidade policial” e “por habitações dignas”.

Em declarações à Lusa, António Tonga, membro do Coletivo Consciência Negra, explicou que o objetivo do movimento é dar espaço à comunidade para mostrar que “os negros e as pessoas da periferia têm sido alvos em relação à questão policial e da falta de habitações dignas”.

O protesto vai decorrer em frente à Câmara do Seixal, pelas 16h00, e está a ser organizado por várias associações que estão “solidárias” com a população de Vale de Chícharos (conhecido como bairro da Jamaica), tais como o Coletivo Consciência Negra, a SOS Racismo, a Plataforma Gueto, a FEMAFRO e a Afrolis – Associação Cultura.

Contudo, a Associação de Desenvolvimento Social de Vale de Chícharos demarcou-se desta iniciativa, referindo, em comunicado, que agora se pretende “retomar as rotinas diárias e seguir em frente”.

“A câmara municipal tem uma palavra a dizer no que toca à atuação da polícia. Sabemos que a polícia não está sob tutela da câmara, mas enquanto órgão representante do Estado português tem de ter uma voz firme em relação à brutalidade policial, à violência desnecessária e à estigmatização da comunidade. Não tem como dissociar”, explicou António Tonga, do Coletivo Consciência Negra.

Numa resposta enviada à Lusa, a Câmara do Seixal esclareceu que o ambiente tem estado “completamente tranquilo” em Vale de Chícharos (bairro de habitação precária) e que “os esforços do município estão concentrados na resolução dos problemas habitacionais existentes”.

No domingo de manhã, a PSP foi chamada a Vale de Chícharos após ter sido alertada para “uma desordem entre duas mulheres”, o que resultou no ferimento, sem gravidade, de cinco civis e de um agente, segundo a força de segurança.

Devido a este incidente, seguiu-se uma manifestação em frente ao Ministério da Administração Interna, em Lisboa, que resultou em quatro detenções por apedrejamento aos agentes da PSP, de acordo com a polícia.

Contudo, em declarações à Lusa, vários moradores afirmaram que “não convocaram” manifestações ou protestos fora do concelho do Seixal.
António Tonga realçou que a manifestação de hoje é uma oportunidade para “protestar de forma pacífica”.

O Ministério Público e a PSP abriram inquéritos ao incidente no bairro.

Esta semana, a polícia tem reforçado o policiamento em várias zonas de Setúbal, Loures, Odivelas e Sintra, devido a incêndios a caixotes do lixo e viaturas.

No concelho de Setúbal foram lançados ‘cocktails Molotov’ contra uma esquadra e um autocarro foi incendiado.

A polícia indicou estar a investigar, dizendo não ter indícios de que estes atos de vandalismo estejam relacionados com a manifestação no centro de Lisboa.

Lusa | em Expresso | Foto: Rafael Marchante/Reuters

ÀS ARMAS?

Trump e o fantoche dos EUA Juan Guaidó, auto proclamado PR da Venezuela
Mais Venezuela no Curto do Expresso, assim como em toda a comunicação social global. O diálogo urge. Maduro deve tomar essa possibilidade em consideração a fim de evitar a guerra que dizimará milhares de venezuelanos e semeará ainda mais caos e miséria por entre o povo sofrido e refém dos EUA e do capitalismo global.

Não será cobardia poupar vidas se num entendimento for encontrado o processo de preservar a paz que permita a estabilidade na vivência dos da Pátria Bolivariana. ONU e países da América Latina devem colaborar em conversações que ponham travão aos criminosos da administração Trump, assim como à obstinação de Maduro. O meio-termo é urgente, a paz também, a independência e soberania da Venezuela ainda mais.

Os EUA não têm o direito internacional a seu favor nas suas acções de interferir na Venezuela como o está a fazer e, pior, planeia fazer. Maduro não deve deixar-se empurrar para extremos. A Venezuela e o seu povo é o mais importante, a soberania também.

Em vez de se apelar às armas importa apelar à paz. Que seja e aconteça.

Deixamos o Curto para ler. Valdemar Cruz é o jornalista de serviço. A cafeína está servida já aqui em baixo. Vá ler. (PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

Às armas, cidadãos!

Valdemar Cruz | Expresso

Um sopro de morte percorre as ruas de Caracas, na Venezuela. Há quem, como na revista Foreign Affairs, fale do suicídio de um país falido. O espetro da tragédia percorre os recantos de uma nação diabolizada. Ontem, na edição da tarde da SIC Notícias, a um investigador em Ciências Sociais da Universidade de Lisboa não lhe tremeu a voz quando vaticinou a existência de apenas duas possibilidades para a Venezuela: a guerra civil, ou massacres. Isto é, a morte, ou a morte.

Desgraçado país este para o qual tantos parecem apostar num futuro imediato feito de guerra entre homens e mulheres que, seja qual for o lado em que se posicionem, só quererão um quotidiano de paz e tranquilidade.

Não há narrativas fáceis para o que se passa há vários anos naquele país sul-americano, por muito que haja a tentação de tudo acantonar na habitual e simplista dicotomia bons e maus. Não há inocentes, na Venezuela. Não há, sequer, uma oposição. Há um conglomerado de oposições, quase sempre muito divididas como reflexo dos muitos e contraditórios interesses representados. E há um setor de extrema-direita, cada vez mais radicalizado,a assumir o palco, empurrado e alimentado por atores externos, cuja intervenção desejam.

A Venezuela vive uma situação política, social e económica desastrosa, seja quais forem as razões que cada um entenda privilegiar para justificar o caos instalado, com exponencial aumento da pobreza, colapso dos serviços públicos, hiperinflação e crescente violência nas ruas.

As chefias miliares declararam estar ao lado do Presidente da República, Nicolas Maduro, e deixaram clara a existência de “um golpe de Estado”. A situação é de uma gravidade extrema. No El País escreve-se que “a crise na Venezuela expõe a divisão internacional”, com os EUA a liderarem o apoio ao autoproclamado presidente, enquanto “China, Rússia e Turquia apoiam Maduro e a EU e a ONU apelam ao diálogo”.

Ontem à noite, enquanto na generalidade da imprensaportuguesa e internacional os grandes títulos continuavam focados nas múltiplas incidências do conflito, outros jornais, como o La Jornada, do México, ou “El Público”, de Espanha, avançavam com informações importantes para quem não está interessado em banhos de sangue. Maduro terá aceitado uma proposta dos governos do México e Uruguai para que sejam mediadores da abertura de uma nova linha de diálogo de modo a encontrar uma solução para a crise do país, tal como defendem a ONU e a UE.

Há muito em jogo no país que se estima possuir as maiores reservas de petróleo do mundo. Num artigo datado de Washington e intitulado “O martelo de Trump sobre Caracas”, escreve-se no El País que a política do presidente dos EUA na Venezuela, secundada, de resto, pelo chamado “Grupo de Lima” “tem consistido numa pressão em crescendo face à deriva autoritária de Maduro, deixando inclusive passar a ideia de uma intervenção militar”.

Quando ressalta a evidência de uma “ingerência externa em questões internas da Venezuela”, com o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, a apelar na prática a um golpe de Estado, e Mike Pompeo a dar instruções aos diplomatas norte-americanos para ignorarem as ordens de Maduro para abandonarem o país,teme-se o pior para um país onde residem 300 mil portugueses ou luso-descendentes.

Há o risco de vingar a tese muito defendida por vários setores extremistas de que não há diálogo possível. A ideia dos cidadãos em armas parece entusiasmar muita gente. Mas a ideia de cidadãos em armas ou do exército na rua a disparar indiscriminadamente será, não apenas uma tragédia, como a materialização do horror. E o horror é tudo o que sobre quando falta inteligência contra a intolerância.

OUTRAS NOTÍCIAS

Em 2017, mais de 11.100 mulheres foram atendidas na rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica. Umas 850 foram recolhidas em casas Abrigo, vistas como a última solução de atuação das autoridades perante casos de violência doméstica

Os pagamentos em atraso dos hospitais públicos aos fornecedores chegaram no ano passado aos 500 milhões de euros, após reforços de financiamento. Aqueles números correspondem a uma redução de 42% face a 2017, segundo dados oficiais.

Os enfermeiros terminam hoje uma greve de quatro diasconvocada pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP). Iniciada na passada terça-feira, a paralisação atinge hoje as regiões do Algarve, Alentejo e Açores, e visa protestar contra o fim das negociações relativas à carreira.

Os médicos portugueses e espanhóis querem leis que proíbam as terapias alternativas. Ordens portuguesa e espanhola afirmam que há cada vez mais doentes em situações graves pelo uso das “pseudoterapias”, noticia o JN.

Associações e moradores do bairro da Jamaica protestam hoje em frente à Câmara do Seixal, no distrito de Setúbal, contra o que classificam como “brutalidade policial” e “por habitações dignas”.

Os Xutos & Pontapés, a celebrarem 40 anos, editam hoje um novo álbum, intitulado “Duro”, que conta com temas gravados pelo guitarrista Zé Pedro e a participação de Capicua, Carlão e Jorge Palma

LÁ FORA

O Departamento de Estado norte-americano ordenou que todo o pessoal diplomático e funcionários federais "não essenciais" a trabalhar na Venezuela abandone o país. A administração de Donald Trump garante, porém, que não vai encerrar a sua embaixada nem os consulados no país.

O secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, noticia a Lusa, apelou hoje para que a Organização dos Estados Americanos (OEA) reconhecesse Juan Guaidó como “presidente interino da Venezuela”, sem contudo conseguir a unanimidade dos 34 membros ativos da entidade

O Senado norte-americano reprovou os planos concorrentes dos democratas e dos republicanos para terminar com o encerramento dos serviços do governo federal (o designado ‘shutdown’), que já dura há 35 dias, o mais longo de sempre.

A Nigéria declarou o “estado de epidemia” após a morte desde o início de janeiro, de 16 pessoas vítimas do vírus “Lassa”. Oito dos 37 estados do país estão já afetados por este vírus identificado em 1969, que provoca vómitos, dores musculares e, em casos mais graves, hemorragias e encefalites.

O deputado federal Jean Wyllys (do Partido Socialismo e Liberdade - PSOL), assumidamente homossexual, está fora do Brasil e não tenciona voltar, disse o próprio numa entrevista ao jornal Folha de São Paulo, na qual confessou ainda sentir-se em risco de vida devido às múltiplas ameaças que tem recebido.

A Procuradoria de Israel acusou um adolescente israelita de 16 anos de idade de homicídio voluntário. O jovem é acusado de atirar uma pedra a um carro que circulava a alta velocidade e matar uma mulher palestina. De acordo com a acusação, o suspeito visou deliberadamente o carro da família.

Um livro que terá pertencido a Adolf Hitler, e que os investigadores suspeitam ser um modelo para um Holocausto na América do Norte, foi adquirido pelo arquivo nacional do Canadá.

Termina hoje em Davos, uma estância nos Alpes suíços, o habitual encontro dos principais agentes do capitalismo mundial, que ali se reúnem desde 1971. Muito antes destes fóruns da elite financeira, Davos conquistou um espaço próprio por ser onde os doentes ricos da Europa tentavam curar-se da tuberculose, e onde muitos escritores famosos passaram temporadas. Foi lá que Robert Louis Stevenson acabou a “Ilha do Tesouro”, ou que Thomas Mann desenvolveu a ideia da sua “Montanha Mágica”, após uma visita de três semanas à sua mulher, que permaneceu em Davos um ano numa tentativa de se livrar da tuberculose.

Um autocarro que reproduz, à escala, a icónica escola da Bauhausconstruída por Walter Gropius em Dessau, na Alemanha, onde funcionou entre 1919 e 1923, está desde ontem em Berlim no âmbito de uma digressão que o levará a quatro cidades de diferentes continente. A iniciativa decorre no contexto do centésimo aniversário da Bauhaus, que este ano se celebra. Depois de Dessau e Berlim, o autocarro concebido pelo arquiteto Van Bo Le-Mentzel, passará por Kinshasa, na República Democrática do Congo, e Hong Kong. Ao longo de 10 meses haverá oportunidade apra a realização de simpósios, debates e conferências.

PRIMEIRAS PÁGINAS

Clubes burlam o Estado em subsídios de viagem – JN

Deputados europeus pressionam EU para derrubar Maduro – Público

(Venezuela) – “Salário mínimo dá para comprar uma caixa de ovos e um pedaço de carne” – I

Ministério da Saúde tem 114 imóveis desocupados – Negócios

Crimes da Caixa sem castigo – Correio da Manhã

Leõs amarram Renan – A Bola

Voltou o caos – O Jogo

Águia admitiu não jogar mais – Record

FRASES

“Os sindicatos sempre foram a organização mais importante da sociedade civil”. João Proença, presidente do conselho geral e de supervisão da ADSE no jornal I

“Não há muros que detenham a emigração”. António Vitorino, diretor-geral da Organização Internacional das Migrações, no Público

“Promove-se o ideologismo fácil, qualquer que seja o seu colorido político, o apelo à justiça sumária na praça pública, a suspeita gratuita generalizada sobre todas as instituições democráticas, o apelo ao imediatismo populista, e tudo aquilo que caracteriza, diariamente, a lição sistemática da produção colunística do novo Comissário”. Ruy Vieira Nery sobre a escolha pelo P.R. do colunista João Miguel Tavares para Comissário do Dia de Portugal

O QUE ANDO A VER

Num tempo de profunda berraria televisiva, marcada por um amontoado de programas feitos de nada e coisa nenhuma, a RTP 2 continua a surgir-nos como o oásis onde podemos beber a diferença, a curiosidade, a inquietação, a interrogação que nos faz seres pensantes e não apenas recetáculos acéfalos.

Só num canal virado para o serviço público, capaz de entender a televisão como um espaço por onde flui a inteligência, seria possível um programa como “O Sentido da Beleza”, transmitido às terças-feiras e em parte ainda disponível na RTP Play.

O que é a beleza? Eis uma das perguntas cruciais com que se tem defrontado o homem ao longo dos tempos. Escreveram-se tratados. Há infinitas reflexões filosóficas. Trilharam-se inúmeros caminhos à procura de uma resposta.

Há correspondência entre o belo e o feio? O que é belo aos olhos de alguns – um rosto, uma paisagem, uma obra de arte – pode configurar o horrendo aos olhos de outros? Saberá alguém definir exatamente o que é a beleza? Ou essa, e ainda bem, é uma impossibilidade absoluta?

O homem começou a procurar e a expressar o sentido de beleza mesmo antes de ter desenvolvido uma qualquer noção de linguagem. Nas cavernas encontramos as primeiras obras de arte alguma vez criadas pelo homem. Olhá-las, como olhar a reprodução do imaginário rosto de um homem ou mulher daqueles tempos primordiais, é perceber como os conceitos de beleza se modificaram ao longo dos tempos.

Há diferentes atitudes culturais perante a beleza, conforma o contexto geográfico, ou até social, em que nos encontremos. Mesmo com a galopante padronização ocidental a embrenhar-se no mundo todo, a noção de belo para um asiático ou para um africano contém ainda substanciais diferenças em relação à noção de belo de um europeu ou um norte-americano.

A série documental em seis episódios da responsabilidade de Massimo Brega e apresentada pelo escritor inglês Dominic Frisby coloca-nos perante o poder da beleza através de uma viagem á volta do mundo e das diversas noções de beleza, com o contributo de artistas, críticos de arte, filósofos e cientistas.

Com imagens belíssimas, o programa recorda-nos a cada instante como a beleza sempre esteve, está e continuará a estar no centro das preocupações humanas. Ou será por acaso que todos os dias são investidos milhões de euros por pessoas que querem tornar as coisas mais bonitas, ou querem elas próprias sentirem-se ou parecerem mais bonitas? E porque será que, segundo vários estudos, as pessoas mais atraente ganham, em média, mais 12,5% do que as pessoas com aparência normal?


É tudo por hoje. Tenha um bom dia à volta das muitas leitura sproporcionadas pelas diferentes plataformas do Expresso.

Dos EUA | "Quintal das traseiras" a ferro e fogo

Michael Pompeu já deu instruções aos seus vassalos sobre como quer a guerra contra a Venezuela
José Goulão

A guerra conduzida pelos Estados Unidos contra a Venezuela está em marcha. Independentemente dos contornos militares que vier a assumir, o pretexto político já foi definido – a suposta "ilegitimidade" do novo mandato de Nicolás Maduro –, os encontros conspirativos regionais sucedem-se e as provocações belicistas também, enquanto as pressões diplomáticas se intensificam. Porém, nem tudo poderá correr de feição para os promotores da agressão: a juntar à disponibilidade da Venezuela para resistir ganha forma a possibilidade de a Rússia vir a estabelecer uma base aeronaval permanente em zona insular do território venezuelano.

A velha doutrina de Washington sobre o domínio "do quintal das traseiras" – as Américas Central e do Sul – reactivada a partir de 2008 com uma série de golpes políticos e diplomáticos, sob fundo militar, parece caminhar sobre rodas. Uns atrás dos outros, os governos latino-americanos que opuseram a soberania à subserviência desaparecem do mapa e os seus sucessores representam agora postos avançados contra os que falta abater: a "troika da tirania", definição estabelecida em Washington para englobar Venezuela, Nicarágua e Cuba; e a Bolívia, que aguarda novo assalto.

A partir do momento em que se completou no Brasil o processo golpista iniciado em 2016 e os novos dirigentes do país mostraram, em curtos dias, absoluta disponibilidade para se assumirem como servos coloniais, a guerra contra os países renitentes vai sendo afinada, tendo como próximo objectivo a Venezuela.

A escolha nada tem de surpreendente, trata-se do país que tem referenciadas as principais reservas de hidrocarbonetos do mundo, superiores às da própria Arábia Saudita, circunstância que, em Washington e arredores, é absolutamente incompatível com uma política de soberania nacional.

Conspiração em Brasília e Bogotá 

Viajando pelo "quintal" para abençoar a posse de Jair Bolsonaro, o secretário de Estado norte-americano e ex-patrão da CIA, Michael Pompeo, concentrou-se em activas reuniões de bastidores.

Com o novo presidente brasileiro estabeleceu os próximos passos do que será a "luta contra os regimes autoritários de Venezuela e Cuba". Antes ainda de serem empossados, os novos dirigentes brasileiros tinham multiplicado sinais dando conta da sua vontade de desempenharem um papel principal numa intervenção contra a Venezuela. O vice-presidente e general Hamilton Mourão terá exagerado até no entusiasmo, pelo menos em termos de "timing", oferecendo-se para enviar "uma força de paz" com destino a Caracas.

A seguir, Pompeo viajou para Bogotá, Colômbia, ao encontro de outro chefe fascista, Iván Duque, com quem delineou o "isolamento diplomático" da Venezuela.

Kerch reproduzido na Guiana

Por essa altura, primeiros dias de Janeiro, estava em desenvolvimento uma provocação no terreno, aliás a fazer lembrar metodologicamente a que foi tentada pelo fascismo ucraniano contra a Rússia, em 25 de Novembro, no Estreito de Kerch.

Em 22 de Dezembro de 2018, a Marinha venezuelana vira-se forçada a expulsar das suas águas territoriais dois navios ao serviço da Exxon Mobil, o principal fornecedor de combustíveis do Pentágono, que ali faziam prospecção de hidrocarbonetos sem terem sido convidados.

Essa atitude de Caracas em defesa da soberania venezuelana foi qualificada, em 4 de Janeiro, como "uma provocação da Venezuela que põe em causa a segurança colectiva", no artigo 9º da declaração resultante da reunião do chamado Grupo de Lima, a etapa seguinte do périplo de Pompeo.

Os membros do Grupo de Lima, uma entidade informal constituída por fiéis seguidores regionais das estratégias delineadas por Washington, assumiram esta posição partindo do princípio de que os intrometidos navios estariam em actividade em águas territoriais disputadas entre a Guiana (ex-Guiana Britânica) e a Venezuela.

Existe, na verdade, uma indefinição de estatuto relativa a um território florestal não habitado de 160 mil quilómetros quadrados e que resultou do facto de os colonizadores britânicos e espanhóis não terem estabelecido esse sector de fronteira entre as Guianas Britânica e Espanhola, hoje território venezuelano.

O contencioso esteve praticamente congelado entre o século XIX e 2015 – houve um acordo que deixou o assunto entre parêntesis em Genebra, em 1966 – até que surgiram indícios fortes da existência de hidrocarbonetos nas águas territoriais correspondentes a essa zona por definir.

Porém, em 9 de Janeiro, o presidente da Venezuela provou, durante uma conferência de imprensa de âmbito internacional, que os navios da Exxon Mobil não estavam em águas disputadas, mas sim em águas venezuelanas na foz do rio Orenoco. Maduro apresentou várias provas: a posição exacta em que se encontravam os navios, reveladas por um dos capitães durante conversações com a Marinha venezuelana; o qual admitiu ainda possuir apenas uma autorização escrita do governo da Guiana, que aliás fora derrubado na véspera através de um estranho episódio: o deputado governamental que assegurava a maioria votou contra o executivo numa moção de censura e a seguir fugiu do país, refugiando-se no Canadá.

O presidente Nicolás Maduro exigiu então, na sequência da apresentação destas provas, que o Grupo de Lima retirasse o artigo 9º do seu comunicado, o que acabou por acontecer, embora com votos contrários do governo fascista paraguaio e, significativamente, do Canadá.

Doutrina agressiva

Apesar desse recuo, o Grupo de Lima, regido por Pompeo, deixou estabelecida a sua doutrina agressiva contra a Venezuela ao postular a "ilegitimidade" do novo mandato de Maduro, porque resultante de eleições que não devem ser consideradas por terem tido 54% de abstenções, alegadamente devido a um boicote por sectores da oposição fascista dirigida de Washington.

Ora as abstenções de 54% são comuns nas eleições presidenciais norte-americanas, mesmo sem que haja, como houve na Venezuela, ameaças contra votantes, sabotagem de meios de transporte e outras situações anómalas.

E 54% foi a abstenção ocorrida, semanas antes, nas eleições que entronizaram Sebastián Piñera, discípulo de Pinochet, como presidente do Chile. Sensivelmente na mesma ocasião foi detectada mais uma gigantesca fraude na eleição de Juan Hernandez nas Honduras, de tal modo que os Estados Unidos e a própria e domesticada Organização dos Estados Americanos (OEA) demoraram mais de um mês a reconhecê-la.

E que dizer do Brasil, onde as eleições presidenciais se realizaram depois de encarcerado e impedido de concorrer o candidato que, segundo as sondagens, tinha a eleição praticamente assegurada?

A "ilegitimidade" de Maduro, estabelecida apesar da coexistência de cenários deste tipo, vai ser, doravante, o combustível das acções de guerra contra a Venezuela. 
Eis que se fala da Rússia

Não é novidade que a campanha contra a Venezuela tem um contexto mais abrangente. Os Estados Unidos confirmam-no ao colectivizarem os objectivos, de modo a englobarem também Cuba, a Nicarágua, a Bolívia, Estados que não prescindem da sua soberania e seguem caminhos próprios de desenvolvimento.

Não se trata apenas, porém, de abater regimes insubmissos. A estratégia global dos Estados Unidos e aliados implica o reforço de mecanismos de dominação de âmbito militar regional que desencorajem a formação de governos independentes e com pouca vocação para acatar as ordens emanadas do Norte. A intensa actividade do Comando Sul (SouthCom) do Pentágono, a reactivação da Quarta Esquadra norte-americana, os exercícios militares gigantescos e provocatórios são sinais permanentes a fazer lembrar que a guerra está em marcha.

Além disso, o Reino Unido prepara-se para juntar à ocupação militar das Malvinas argentinas a criação, a breve prazo, de uma base aeronaval na região das Caraíbas. Provavelmente na Guiana, admitindo-se que a ebulição política em que este país mergulhou, em 21 de Dezembro, não seja desenquadrada desse objectivo de Londres – e que o Canadá tenha ajudado.

No contexto geral, porém, também é certo que os países que apostam na soberania política e económica, como a Venezuela, têm diversificado as suas relações com nações e regiões de outros continentes. Pelo que os interesses dos Estados Unidos e aliados no "quintal das traseiras" de Washington não são os únicos no terreno. Outros foram sendo estabelecidos, oriundos de outras regiões.

As relações entre Caracas e Moscovo têm-se aprofundado, do mesmo modo que as da Venezuela com a China. Não sendo de ignorar também o volume de investimento que Pequim tenciona fazer num novo canal interoceânico, alternativo ao do Panamá, a abrir na Nicarágua.

Além disso, como é de conhecimento geral, a relação de forças mundial está em mudança significativa – a própria supremacia militar é hoje muito mais repartida.

Daí que esteja a ganhar forma a possibilidade de a Rússia vir a construir uma base aeronaval na ilha de Orchila, em território da Venezuela, a mesma onde o presidente Hugo Chávez esteve encarcerado durante algumas horas, em 2002, enquanto decorria a tentativa de golpe de Estado coordenada pela administração de George W. Bush.

Uma base na qual Moscovo encara a possibilidade de estacionar bombardeiros estratégicos, o que traz à memória as angústias vividas pelo establishment de Washington por ocasião da chamada "crise dos mísseis" em Cuba, em 1962.

Pelo que, por muitas razões, e mais esta, uma guerra na América Latina iniciada com uma agressão dos Estados Unidos e colónias contra a Venezuela soberana pode não ser uma simples e vingativa degola de inocentes. 

16/Janeiro/2019

O original encontra-se em www.oladooculto.com/noticias.php?id=202

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

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