sábado, 8 de abril de 2023

Angola | CABINDA A COBIÇADA E SUA DEFESA – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

No início de 1975 Agostinho Neto denunciou manobras políticas e militares que visavam anexar Cabinda à República do Zaire (RDC). O líder do MPLA disse que a província estava a ser cobiçada pelos inimigos de Angola. E mais uma vez lembrou às autoridades portuguesas que tinham a responsabilidade de defender as fronteiras e a integridade do território. Como foi feito em Novembro de 1974, quando tropas zairenses escondidas na Frente de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC) tentaram tomar o poder, com o auxílio do governador e comandante militar português, brigadeiro Temudo Barata.

NO dia 22 de Outubro de 1974, o MPLA e o MFA (quarto movimento de libertação de Angola) assinaram um cessar-fogo em Cabinda. Os oficiais da CIA e Mobutu desvalorizaram este acontecimento porque Temudo Barata tinha garantido que a província (então distrito) seria anexada ao Zaire. Enganaram-se. Combatentes do MPLA e do MFA, em Novembro de 1974, acabaram com a aventura secessionista. Prenderam o governador e comandante militar mais os seus oficiais. Foram expulsos do território. E as autoridades portuguesas assinaram um documento no qual se comprometeram a ilegalizar a FLEC. O que foi cumprido. 

O Doutor Lucas Ngonda disse à TPA que Mobutu não gostava de Holden Roberto porque o líder da FNLA não colaborou com o ditador para ocupar Cabinda já que “O Zaire não tinha acesso ao mar e precisava daquele território”. Falsificação grosseira. Na sequência da Conferência de Berlim, a França “roubou” a Portugal o porto de Ponta Negra. A Bélgica também debicou o seu pedaço mas não tudo o que queria. As grandes potências europeias pediram a Portugal para ceder ao rei belga (o então Estado Livro do Congo era sua propriedade pessoal…) uma parcela que permitisse o acesso ao mar. E isso foi feito. Os belgas ficaram com os portos de Banana, Boma e Matadi que pertenciam à colónia de Angola.

Mais território já não ficou de borla. Bruxelas e Lisboa assinaram o Tratado de Loanda segundo o qual Portugal cedeu à Bélgica o vale do rio Mpozo e a Bélgica transferiu para a soberania portuguesa a chamada Bota do Dilolo: Todo o território da Lunda até ao Cazombo. De facto tem uma forma de bota alta. 

Senhor Doutor Lucas Ngonda. Mobutu já tinha uma saída para o mar à custa de Angola. E a cedência do Vale do Mpozo fez de Cabinda um enclave. Convêm não falsificar a História de Angola. E é preciso saber do que se fala. Porque a FNLA ajudou Mobutu na tentativa de anexar Cabinda. Na Grande Batalha do Ntó os invasores estrangeiros traziam tropas do ELNA! Falharam. Foram estrondosamente derrotados. 

Cabinda continua Angola porque em Outubro de 1974 os movimentos de libertação MPLA e MFA decidiram defender a província com unhas e dentes. Recordo aqui a figura do coronel Fontão, comandante militar português. Cabinda continuou Angola porque a província era dirigida por figuras extraordinárias: Pedro Mafia Tonha Pedalé e a sua equipa política constituída por homens da dimensão de Evaristo Kimba, Jorge Tchimpuati ou Zé Manel. Grandes comandantes: Zacarias Pinto (Bolingô), Eurico Gonçalves, Delfim de Castro, Pedro Benga Lima (Foguetão), Max Merengue. E os combatentes da nova geração: Pedro Sebastião, Bornito de Sousa ou João Manuel Gonçalves Lourenço, hoje Presidente da República.   

Cabinda, a cobiçada, hoje continua a ser Angola porque esses angolanos de excepção lutaram em sua defesa. Nunca se esqueçam que a artilharia zairense de longo alcance matou o comandante Gilberto Teixeira da Silva (Gika) na época comissário político do Estado-Maior Geral das FAPLA. Cabinda, a cobiçada, hoje continua a ser Angola porque o General Ramón Espinosa estava ao comando dos combatentes internacionalistas cubanos. Porque o médico Rodolfo Puente Ferro montou no território serviços de saúde exemplares. Porque homens como o major Otero ou os jornalistas Eloy Concepcion Perez, Emílio ou Muñoa lutaram pela Pátria Angolana. 

Mobutu falhou a anexação de Cabinda porque o MPLA tinha criado no território um laboratório de quadros no início dos anos 60. Holden Roberto ajudou Mobutu a amputar a Pátria Angolana. Foi derrotado. Hoje a UNITA vende a província a troco de um punhado de votos. A CASA-CE fez o mesmo. Já desapareceu. O Galo Negro também vai desaparecer. Um partido político que se serve de marginais para tomar o poder está condenado ao fracasso.

Aqui passo para o senhor Eugénio Manuvakola. Em declarações à TPA provou que a UNITA é mesmo uma seita com tiques de associação de malfeitores. Ele apareceu como o líder de uma ala anti belicista. Mas para desculpar os belicistas de Savimbi disse agora que em 1992 a guerra após as eleições aconteceu “porque existiam três exércitos no terreno: As FALA, as FAPLA e as FAA”. Nasceram na mentira, cresceram na falsificação e vão morrer ajoelhados ante a imagem de Jonas Savimbi. Até tu, Manuvakola!

Tu sabes que a UNITA voltou para a guerra porque perdeu as eleições. Tu sabes que não desarmou como devia desarmar para cumprir o Acordo de Bicesse. Tu sabes que os serviços secretos da África do Sul e dos EUA criaram bases no Cuando Cubango onde foram escondidos os melhores militares e as melhores armas das FALA. Tu sabes que 15 dias depois da divulgação dos resultados eleitorais essa tropa já tinha ocupado praticamente todo o país. Tu sabes que as FAPLA foram mesmo extintas. Tu sabes que mal tomaram posse, os generais das Forças Armadas Angolanas (FAA) oriundos da UNITA desertaram. E de repente ficaste sem memória e semeias aldrabices. Gente sem carácter jamais se reconciliará com a decência. 

Os traficantes de ossadas dos assassinos de 27 de Maio de 1977 vão agora ler uma declaração de Mário Pinto de Andrade ao Diário de Lisboa, no dia 30 de Junho de 1977, mais de um mês depois do golpe. Quem pediu perdão aos assassinos e implicitamente condenou os assassinados, leia também com atenção:

“Considero-me sempre um militante do MPLA. Em primeiro lugar lamento profundamente a expressão criminosa e facínora que tomou a intentona de 27 de Maio, devido ao oportunismo e ambições políticas do grupo de Nito Alves e que levou à perda irreparável de comandantes e camaradas tão determinantes na luta de libertação nacional. Estou de acordo com as decisões tomadas pelo Bureau Político do MPLA e com as declarações do camarada presidente Agostinho Neto. Todos nós esperamos que o MPLA saia reforçado desta prova. Reconhecemos que o MPLA, temperado neste tipo de luta, vai com certeza triunfar mais uma vez sobre todas as formas de oportunismo político, mascaradas de verbalismo esquerdista”.

* Jornalista

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