quinta-feira, 14 de junho de 2012

A CAPITULAÇÃO EMINENTE DE MERKEL



Ana Sá Lopes – i online, editorial

A Alemanha reconhece que lucra mais com o euro do que os outros países

Frau Merkel voltou ontem a vender títulos da dívida pública a juros negativos. Tradução em linguagem comum: os investidores pagam à Alemanha a honra de investir o seu dinheiro na dívida do país mais forte da zona euro. É que a Alemanha, ao contrário do que o cidadão comum poderá pensar, também faz parte do terrível clube dos países endividados: a dívida pública da Alemanha representa cerca de 81% do PIB, enquanto aqui ao lado, em Espanha, se fica pelos 68,5% – isto antes do resgate que vai fazer disparar a dívida pública espanhola, como aconteceu na Grécia e em Portugal.

Mas chegou o momento da verdade: a queda de Espanha e a queda iminente de Itália no abismo vão obrigar a Europa, finalmente, a agir. Foi fácil e até divertido brincar com os países pobres, como Portugal, a Irlanda ou a Grécia, mas é impossível humilhar a terceira e a quarta economias da zona euro. A correlação de forças agora mudou – não é por acaso que ontem o ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble, veio dizer que a Alemanha “lucra mais com o euro que todos os outros países”.

A declaração pública poderá representar um ponto de viragem estrutural na forma como a Alemanha gere a crise do euro. Provavelmente prévio conhecedor da iminente mudança de posição da chanceler Merkel, Durão Barroso juntou-se ontem aos que pressionam publicamente Berlim: “Não sei se a urgência é hoje claramente compreendida por todas as capitais”, disse ontem o presidente da Comissão, que protagonizou um dos mais dramáticos apelos a uma mudança na zona euro. Entretanto, depois de semanas de pressão para evitar que os gregos dêem a maioria à coligação de esquerda radical Syriza, também ontem se assistiu a uma mudança de discurso. Ainda antes de se consumar a vitória do partido que quer denunciar o acordo com a troika, os responsáveis europeus já começam a admitir a flexibilização das condições impostas à Grécia. E o discurso de Schäuble sobre as eleições gregas esteve ontem a anos-luz daquele que fez antes das eleições de 7 de Maio – para o ministro alemão a Grécia vai continuar no euro, ganhe quem ganhar no domingo.

A iminente capitulação de Berlim é ditada por factores económicos – a Alemanha, como disse Schäuble, lucra muito com o euro e ficará pior com a sua implosão. Mas a política ajudou: a vitória de Hollande e a ameaça da vitória do Syriza fizeram mais pelo euro que os últimos 20 conselhos europeus.

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