Presidente da Corte
chama “mensalão” de “projeto de poder ideológico-partidário de inspiração
patrimonialista”, sob controle do PT, para “aliciar partidos e parlamentares”,
visando continuidade no poder “muito além de dois períodos quadrienais
sucessivos”. Celso de Mello chamou esquema de “assalto à administração
pública”. Réus condenados estavam ao PP, PL, PTB e PMDB.
Vinicius Mansur –
Carta Maior
Brasília - Na
30º sessão do julgamento da Ação Penal 470, o chamado “mensalão”, o Supremo
Tribunal Federal (STF) concluiu o item da acusação que inclui os réus ligados
aos partidos PP, PL (atual PR), PTB e PMDB condenando 12 e absolvendo apenas 1.
Este resultado já estava praticamente confirmado após a 29º sessão, na última
quinta-feira. Chamaram mesmo a atenção as falas contundentes dos ministros
Marco Aurelio Mello, Celso de Mello e Ayres Britto contra a corrupção. Os dois
últimos dedicaram praticamente toda sua fala para condenar a prática,
anunciando ao final que subscreveriam o voto, na íntegra, do ministro relator,
Joaquim Barbosa.
O presidente do STF, Ayres Britto, classificou o “mensalão” como “projeto de
poder ideológico-partidário de inspiração patrimonialista, viabilizado pela
arrecadação criminosa de recursos públicos e privados para aliciar partidos e
corromper parlamentares e líderes partidários”, “projeto de continuísmo
governamental para muito além de dois períodos quadrienais sucessivos”, tudo
isto sob “controle metodológico e domínio funcional do Partido dos
Trabalhadores”, disse.
O presidente também criticou “penalistas e politólogos” que taxam de
“pré-democráticos os juízes e tribunais judiciários que não se dobram a
longevidade e força” do caixa 2 e das alianças partidárias nele baseadas, “tão
realisticamente comuns na tradição político-parlamentar brasileira”, para
“assegurar a governabilidade das chefias executivas do nosso país”.
Sem fazer menções a episódios de corrupção anteriores, Britto chamou esta
cultura política brasileira de “costumes autóctones”, “processados a margem de
toda juridicidade”, “atentatórios” da qualidade da vida política do país,
responsáveis por redesenhar “o perfil ideológico ou politico-filosófico
diretamente saído de cada eleição” e por acarretar em “indistinção entre Estado
em partido, com sério risco de o primeiro se colocar a serviço deste último e
não o contrário”.
Celso de Mello começou seu voto defendendo a Corte das críticas que vem
recebendo e disse que “o STF não está revendo orientações jurisprudenciais,
muito menos flexibilizando direitos e garantias individuais”.
Em seguida, o decano afirmou que a denúncia do Ministério Público comprovou
“eventos delituosos impregnados de extrema gravidade e imputou aos réus ações
moralmente inescrupulosas e penalmente ilícitas, que culminaram, a partir de um
projeto criminoso por eles concebido e executado, em um verdadeiro assalto à
administração pública”. O ministro chegou a colocar em dúvida as decisões
tomadas pela Câmara dos Deputados à época do “mensalão” e afirmou que “é ato
indigno e criminoso do parlamentar que comercializa o voto em troca de dinheiro
ou outra vantagem”.
O ministro Marco Aurelio Mello também defendeu que o dinheiro operacionalizado
pelo publicitário Marcos Valério serviu para a compra de sustentação política
no Congresso, afastando a hipótese de caixa 2 para campanhas eleitorais. Um
tanto quanto confuso, porém, Marco Aurelio disse que “muito embora a
verificação se faça no campo de uma certa ambiguidade, houve, sem dúvida
alguma, a partir da entrega dos numerários, atos de ofício, nas diversas
votações procedidas na Câmara dos Deputados”. O ministro apontou que o esquema
serviu para aprovar determinadas reformas, “sofrendo com isso a própria
sociedade brasileira”.
Condenações
Pelos crimes de corrupção passiva, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
foram condenados os ex-deputados Pedro Corrêa (PP-PE) , o ex-assessor do PP,
João Cláudio Genú, o deputado Valdemar da Costa Neto (atual PR-SP) e o
ex-tesoureiro do PP, Jacinto Lamas.
O deputado Pedro Henry (PP-MT), os ex-deputados Bispo Rodrigues (PL-RJ),
Roberto Jefferson (PTB-RJ), Romeu Queiroz (PTB-MG) e o ex-dirigente do PTB,
Emerson Palmieri, foram condenados por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Henry foi inocentado do crime de formação de quadrilha.
Os dois sócios da corretora de valores Bônus Banval, Enivaldo Quadrado e Breno
Fischberg, foram condenados por lavagem de dinheiro. Entretanto, quanto ao
crime de formação de quadrilha, Quadrado foi condenado e Fischberg absolvido.
O atual prefeito de Jandaia do Sul (PR) e ex-deputado, José Borba (PMDB-PR,)
foi condenado por corrupção passiva, mas foi protagonista do primeiro caso de
empate neste julgamento quanto à acusação de lavagem de dinheiro. O presidente
do STF, Ayres Britto, afirmou que a decisão sobre o caso acontecerá no final do
julgamento. Até lá os ministros podem mudar de voto. Caso o empate permaneça, a
Corte ainda não sabe qual critério adotar. Segundo a tradição do direito penal,
o empate favorece ao réu. Outra possibilidade é o presidente do tribunal
decidir com um voto de minerva.
O ex-assessor do PL, Antônio Lamas, foi absolvido porque o próprio acusador, o
Ministério Público Federal (MPF) apontou falta de provas.
Continuidade
O julgamento da Ação Penal 470 continuará na próxima quarta-feira (3) com a
leitura do voto do relator sobre o crime de corrupção ativa, no qual estão
imputados os petistas José Dirceu, José Genuíno e Delúbio Soares. Também são
acusados neste capítulo da denúncia o ex-ministro dos Transportes, Anderson
Adauto (PMDB), os publicitários Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon
Hollerbach; o advogado e sócio de Valério, Rogério Tolentino; a ex-diretora
financeira da agência de publicidade SMP&B, Simone Vasconcelos; e a
funcionária subordinada a Vasconcelos, Geiza Dias.
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