Deutsche Welle
Manifestantes
protestam contra lei que reduz número de dias em que bandeira britânica é
hasteada. Confrontos violentos na capital da Irlanda do Norte são utilizados
por grupos militantes em causa própria, acusa polícia.
Na madrugada desta
terça-feira (08/01), policiais e manifestantes travaram, pela quinta noite
consecutiva, violentos confrontos nas ruas de Belfast, capital da Irlanda do
Norte, unica nação constituinte do Reino Unido não situada na Grã-Bretanha. A
polícia empregou canhões de água e balas de borracha contra manifestantes.
Os tumultos
começaram depois que cerca de 250 protestantes pró-Reino Unido se encontraram
com católicos republicanos – favoráveis à união com a República da Irlanda –
depois de um protesto pacífico que reuniu cerca de mil pessoas em frente à
prefeitura da cidade nesta segunda-feira. A polícia tentou apartar os grupos,
enquanto manifestantes jogavam pedras e bombas incendiárias contra as forças de
segurança.
No domingo, 50
policiais ficaram feridos e pelo menos 70 suspeitos de incitar a violência
foram presos. Esta é a pior onda de confrontos na região desde que um acordo de
paz em 1998 pôs fim a três décadas de conflito.
Tijolos, garrafas,
balas
Durante todo o fim
de semana, Belfast foi palco de violentos confrontos. No sábado, foram
disparados tiros contra a polícia, e um homem de 38 anos foi preso por
tentativa de homicídio. Manifestantes também revidaram com tijolos e garrafas.
Protestos na
capital da parte norte da ilha irlandesa, região pertencente ao Reino Unido,
têm ocorrido seguidamente desde que o conselho municipal da cidade, de maioria
republicana, decidiu, no dia 3 de dezembro, não hastear mais a bandeira
britânica diariamente em prédios públicos, mas somente em determinados dias do
ano, como no aniversário da rainha.
A decisão foi
tomada depois que partidos unionistas, que apoiam a união da Irlanda do Norte
com o Reino Unido, perderam sua maioria no conselho municipal nas eleições de
junho de 2012. "O equilíbrio da população de Belfast mudou, agora você tem
tantos unionistas quanto nacionalistas", disse Liam Clarke, editor de
política do jornal norte-irlandês Belfast Telegraph, em entrevista à DW.
"Os
nacionalistas, que lutaram para que bandeira britânica deixasse de ser hasteada
diariamente, finalmente aceitaram um acordo prevendo o hasteamento da bandeira
com menos frequência", disse Clarke. Mas sindicalistas distribuíram panfletos
incentivando os cidadãos a protestar. "Foi aí que tudo começou. A situação
ficou fora de controle muito rapidamente."
Militantes
exploraram os protestos
"Grupos
militantes pró-britânicos aproveitam a oportunidade e agora estão explorando os
protestos para atingir seus próprios fins", apontou a polícia
norte-irlandesa. Já em dezembro, a polícia acusou grupos militantes de ajudarem
a orquestrar a primeira onda de violência.
Os ataques recentes
mostraram agora que esse é, claramente, o caso atual. "O que isso
demonstra é que paramilitares se apossaram do problema e agora já apontam suas
armas contra a polícia", acusou Terry Spence, presidente da Federação de
Polícia da Irlanda do Norte (PNFI), em entrevista à rádio BBC.
"Membros da
UVF [Força Voluntária do Urster, na sigla em inglês] têm sido vistos nos
protestos", confirmou o jornalista Liam Clarke, em entrevista à DW, acrescentando
que coquetéis molotov foram usados por
eles. Essas armas são consideradas uma espécie de assinatura da organização.
Tanto a UVF como o
Ulster Freedom Fighters, outro grupo militante nacionalista, cessaram ações
hostis em 2007. "Depois que assinaram o acordo de paz, seus estoques de
armas foram desativados. Mas algumas armas permanecem em mãos de
dissidentes", afirma Clarke.
Reunião urgente dos
partidos políticos
Os líderes
políticos condenaram os recentes confrontos. "A violência grave vista nas
ruas de Belfast Leste nas últimas três noites deve ser condenada da forma mais
severa possível", declarou no domingo David Ford, líder do Partido da
Aliança, que apoiou em dezembro a decisão de limitar o hasteamento da bandeira
britânica em edifícios públicos a 17 dias por ano, e não mais diariamente.
"Não só houve
destruição grave de propriedades, mas os moradores locais foram amedrontados e
policiais ficaram feridos. E parece certo que agora existe um envolvimento
paramilitar significativo." Ford convocou uma reunião urgente de líderes
partidários para esta semana, no intuito de "mostrar um compromisso
verdadeiro com a construção de um futuro comum."
"Mas isso não
significa uma renegociação do Acordo da Sexta-Feira Santa, que terminou com
décadas de violentos conflitos na Irlanda do Norte", pondera o analista
político Liam Clarke. "Existe um pouco a preocupação de que a questão
católico-protestante tenha sido envolvida nesse problema. Mas não acho que
estamos em uma situação em que eu diria que o processo de paz está em
perigo."
Ele observa que as
últimas manifestações atraíram apenas pequenas multidões. "Não se trata de
um levante em massa. Se você perguntar à maioria dos protestantes e unionistas,
eles provavelmente irão dizer, 'sim, eu acho que a bandeira deve ser hasteada'.
Eles diriam que não há razão alguma para tirá-la mas, ao mesmo tempo, a maioria
diria também, 'estou de saco cheio dessas manifestações, porque não consigo
chegar em casa à noite'. Eles não querem tumultos, mas há uma minoria que
quer."
Sentimento de
desigualdade
No entanto, os
especialistas concordam que as desigualdades percebidas entre os dois lados, em
termos de investimentos e infraestrutura, são a base do descontentamento.
Muitos moradores de subúrbios protestantes, em particular, se sentem em
desvantagem, de acordo com Clarke. "Os organizadores dos protestos afirmam
isso, eles mesmos dizem que não protestam apenas contra a questão da bandeira.
Há um sentimento de que os nacionalistas têm feito melhor, que são melhores que
os líderes unionistas em tirar proveito da partilha de poderes do acordo."
Oportunidades de
emprego são escassas na Irlanda do Norte, devido à crise econômica. Clarke
acredita que os recentes conflitos são preocupantes por poderem perturbar ainda
mais o desenvolvimento econômico. "Eles têm sido noticiados em lugares
como a Alemanha, os EUA e em todo o mundo, e isso possivelmente vai assustar
turistas e investidores. Esse é o dano real que os tumultos estão causando."
Autora: Nina Haase
(md) - Revisão: Francis França
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