Eduardo Oliveira
Silva – Jornal i, opinião
O documento do FMI
não deve desviar as atenções do Orçamento de 2013
Todo o burro come
palha, é preciso é saber dar-lha.
O ditado popular
parece ter esquecido apenas que o burro pode dar coices violentos. Mais coisa
menos coisa, foi isto que aconteceu com o relatório do FMI. Em primeiro lugar,
o documento é violentíssimo, mas igual a outros que foram feitos sobre
Portugal, a Grécia e mais uns quantos países. É também uma evidência que o
conteúdo é maximalista e que portanto tudo aquilo é um objectivo último, e não
uma coisa que se faça já, nem sequer numa década.
O que se passou com
o relatório é que uma luminária da estratégia política decidiu passá-lo para a
imprensa, que naturalmente o leu da forma mais radical, seguindo a prática
jornalística de que as boas notícias não são notícia. O tumulto foi tal que
Carlos Moedas teve de ir a correr para, em simultâneo, dizer que nem todo o
conteúdo era um dado adquirido e defender o documento, que mais parecia saído
da pluma de Ferraz da Costa, enquanto o CDS se demarcava e o líder, Paulo
Portas, nada dizia, eventualmente por estar em hibernação.
Num ápice
instalou-se o pânico face ao alastramento de uma onda de indignação que
ameaçava tomar as proporções do 15 de Setembro, a ponto de não se perceber
porque é que os movimentos políticos ditos de cidadania não aproveitaram logo
as redes sociais para convocar mais uma manifestação inorgânica.
A melhor indicação
do susto foi o próprio Passos Coelho ter sido obrigado a dizer que o relatório
não é uma bíblia nem o ponto de chegada do governo, quando na realidade todos
sabem que é.
Mas afinal o que
queria o pequeno Maquiavel que sub-repticiamente libertou o documento, que teve
a colaboração activa do governo e contraria a análise imediata feita pela
presidente do FMI na entrevista que deu há apenas oito dias?
As ideias eram
duas. Em primeiro lugar, desviar a atenção da questão essencial, que deve
preocupar todos, mas mesmo todos os portugueses: o que vai fazer o Tribunal
Constitucional com o Orçamento do Estado? Ao atirar com o relatório para a rua
julgava-se que o burro se distraía com aquela palha, o que de facto aconteceu
durante umas horas, até que desatou aos coices e foi preciso acalmá-lo. A
estratégia correu mal e quase rebentava com o governo, o que deveria conduzir a
uma revisão definitiva da comunicação do primeiro-ministro, já que a do governo
nunca existiu.
A segunda ideia era
um remake daquela célebre frase de Sócrates quando cinicamente profetizou que
ainda havíamos de ter saudades do PEC IV. Face ao relatório do FMI na sua
versão publicada e mais catastrofista, qualquer cidadão diz com alívio que,
para evitar aquela verdadeira tragédia grega, venha antes o Orçamento de 2013
que o governo apresentou e que Cavaco e as oposições enviaram para fiscalização
sucessiva.
Quem for lúcido não
pode evidentemente cair na esparrela. Uma coisa é um relatório do FMI para o
futuro e outra é um Orçamento para o imediato, o que é bem mais importante.
Convém não perder o norte nem a noção das prioridades.
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