Emir Sader – Carta Maior,
em Blog do Emir
Como é uma
democracia em que os candidatos concorrem de forma absolutamente desigual? Em
que uns conseguem ocupar incontáveis espaços de propaganda, enquanto outros não
conseguem sequer informar que são candidatos?
O Congresso deveria ser o espelho da sociedade. Enquanto os governos refletem
as maiorias, os parlamentos deveriam representar todos os setores a sociedade,
na sua devida medida.
Não é o que acontece e isso corrompe a democracia. Os lobbies povoam o Congresso,
na medida dos recursos milionários com que fizeram suas campanhas. Basta
mencionar que o agronegócio tem uma imensa bancada, enquanto há apenas dois
representantes dos trabalhadores rurais no Congresso. Olhemos para a estrutura
rural para ver quantos são os trabalhadores e quantos os proprietários rurais,
para nos darmos conta do falseamento da representação parlamentar.
Entre a sociedade realmente existente e sua representação no Congresso se
interpõe o poder do dinheiro, com toda a desigualdade econômica da nossa
sociedade, que se reflete na imensa diferença entre a capacidade dos ricos e
dos pobres de se representar ali.
Se a isso somamos o monopólio privado da mídia – ele também reflexo da
desigualdade econômica –, completamos um quadro de concorrência absolutamente
desleal e desigual nas eleições que escolhem os que deveriam ser os
representantes fiéis da sociedade.
O Congresso representa, assim, uma minoria, porque uma parte importante dos
seus parlamentares se elege e reelege baseada no poder do dinheiro, na riqueza
das campanhas, na propriedade e na presença nos meios privados de comunicação.
O princípio mais geral da democracia é “uma pessoa, um voto”. Mas esse
princípio é desvirtuado pelo poder, totalmente desproporcional, de influência
que o dinheiro permite a uns sobre os outros. Basta constatar que a renda média
dos parlamentares é incomensuravelmente maior do que a da média dos brasileiros.
Um Congresso que não representa os brasileiros, povoado de lobbies, facilita o
trabalho dos que estão sempre empenhados em desmoralizar a política, os
partidos, os governos, o Estado, em favor da centralidade do mercado. Assim, o
financiamento privado sabota a democracia, a enfraquece, contribui para sua
desmoralização.
Os que estão a favor da continuidade do financiamento privado privilegiam o
poder do dinheiro, o domínio da riqueza sobre a democracia, sobre a
concorrência livre entre cidadãos. Democratizar é desmercantilizar, é debilitar
o poder do dinheiro sobre o sistema político.
O financiamento público de campanha não basta para garantir o bloqueio do poder
do dinheiro, mas ele é condição para que se regulamente essa forma de sabotar a
democracia. O financiamento privado é uma forma segura de impor o poder do
dinheiro sobre as campanhas e sobre as representações parlamentares.
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