Deutsche Welle
Presidente sérvio
surpreende ao ir à TV e pedir desculpas "de joelhos" pelo massacre de
1995, mas, ao evitar uso da palavra "genocídio" e usar discurso
aparentemente pré-preparado, gera desconfiança entre bósnios.
Um ano após
declarar, ao tomar posse como presidente da Sérvia, que “não houve genocídio em
Srebrenica”, Tomislav Nikolic voltou esta semana às manchetes dos jornais.
Desta vez, no entanto, para se desculpar pelo massacre de cerca de oito mil
muçulmanos bósnios em julho de 1995.
“De joelhos, eu
peço que a Sérvia seja perdoada pelo crime cometido em Srebrenica”, disse
Nikolic em entrevista a um canal bósnio transmitida na quinta-feira (25/04).
O massacre foi
considerado genocídio pelo Tribunal Penal Internacional para a Antiga
Iugoslávia, mas o presidente preferiu não usar o termo. Na entrevista, Nikolic
lembrou que o Estado não foi considerado culpado pelas mortes, e sim autores
isolados.
Nos dois países,
especula-se agora o que o presidente sérvio realmente quis dizer com a
declaração. A ambiguidade do discurso pareceu ser intencional, ou seja,
elaborada de forma a gerar diferentes interpretações, dependendo do ponto de
vista e da necessidade política.
A ativista Natasa
Kandic, fundadora da ONG de defesa dos direitos sérvios Fundo para os Direitos
Humanitários, destaca o valor da expressão “de joelhos” – algo que, afirma, até
então nunca havia sido dito na Sérvia.
“Sabemos que Willi
Brandt fez isso e, por isso, o pedido de desculpas é tão importante",
comenta, numa comparação com o gesto, em dezembro de 1970, do então chanceler
federal alemão em Varsóvia. “Não se deve prestar atenção se ele pronunciou ou
não a palavra genocídio, e sim enxergar a declaração como um todo, fazendo uma
ligação com o seu passado.”
Para muitos,
manobra política
O passado de
Nikolic o aponta como um ultranacionalista que negou crimes de guerra e se opôs
à extradição do líder sérvio Radovan Karadzic e seu principal comandante
militar, o general Ratko Mladic, para julgamento no Tribunal de Haia.
Porém, a aspiração
da Sérvia em fazer parte da União Europeia o fez adotar um discurso mais
moderado. E é nesse contexto que o ativista dos direitos humanos e advogado
Srda Popovic, interpreta a mais recente declaração do presidente:
“Esse pedido de
desculpas foi feito próximo às negociações da Sérvia com a União Europeia. Eu
acho que ele não foi sincero. É apenas uma manobra política e, por isso, ela
não foi vista na Bósnia de forma honesta.”
As primeiras
reações na Bósnia estão de acordo com o discurso do ativista. Mesmo confiante,
o presidente sérvio parece não ter convencido no país vizinho. Durante a
entrevista, pareceu adotar um discurso pré-pronto e sua linguagem corporal não
estava em conformidade com os crimes atrozes pelos quais se desculpava. Falou
da desumanidade dos responsáveis pelo massacre e usou a expressão "de
joelhos", mas jamais deixou a relaxada posição na cadeira em que
sentava-se.
“A questão não é
ajoelhar e pedir perdão. As famílias das vítimas de crimes de guerra precisam
de honestidade e arrependimento sincero. E elas querem ouvir do presidente
sérvio e da Sérvia o termo 'genocídio'. A palavra 'crime', por exemplo, é usada
quando uma bolsa é roubada”, diz a presidente da “Associação de Mães de
Srebrenica”, Munira Subasic.
Outras desculpas
A mesma opinião é
compartilhada por políticos da Bósnia. Dragan Cavic, do Partido Democrata da
República Sérvia (a parte sérvia da Bósnia), acredita que a entrevista foi uma
tentativa de aliviar as relações com os muçulmanos bósnios. Zeljko Komsic,
membro croata da tripartida presidência da Bósnia e Herzegovina, limitou-se a
dizer que espera que a declaração de Nikolić "ajude a melhorar as relações
na região".
Nikolić não é o
primeiro líder da região a se desculpar pelos crimes de guerra. Seu antecessor,
Boris Tadic, pediu desculpas em 2004 durante visita a Saravejo pelos crimes dos
sérvios contra os muçulmanos bósnios e, três anos mais tarde, pelos crimes de
guerra cometidos contra os croatas. Seu exemplo foi seguido pelo presidente
croata, Ivo Josipovic, que também se desculpou com os bósnios e os sérvios por
crimes de guerra.
A realidade é que a
série de pedidos de desculpas não é, necessariamente, um ato de redenção – seja
por se referirem a apenas uma parcela dos crimes de guerra, pela falta de
sinceridade dos políticos ou por não representarem a opinião da maioria. Pelo
menos para os bósnios, o "Willi Brandt dos Bálcãs" ainda não apareceu.
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