sábado, 27 de abril de 2013

Portugal - 1.º DE MAIO: TRABALHO, LIBERDADE, DIGNIDADE




Carvalho da Silva – Jornal de Notícias, opinião

Marcos históricos na vida das nossas sociedades, como o 25 de Abril de 1974 ou o 1 de Maio, são vividos com a emoção que advém da memória dos grandes acontecimentos, ainda que não vividos, das conquistas de direitos e liberdades que sustentaram as nossas vidas enquanto trabalhadores, pessoas e cidadãos.

Em muitos portugueses e portuguesas hoje essa emoção tende a esbater-se perante a realidade vivida quotidianamente, perante os danos do austeritarismo que coloca mais de 20% dos trabalhadores portugueses no desemprego, que inferniza a vida no trabalho, na família e na sociedade, que condena à pobreza. A convivência com os nossos mais próximos amargura-nos a esperança de um futuro que faça jus às lutas do passado. Nuvens pesadas carregam a vida do nosso amigo, familiar ou vizinho; amanhã o que impede que seja a nossa?

Esta frustração e desânimo são inevitáveis perante as loucuras da avalanche de políticas ruinosas de um governo que traiu o povo e o país, perante a atuação do presidente da República que desgraçadamente sanciona essas políticas, perante instâncias europeias e internacionais que nos querem sugar até ao limite das nossas forças. Atiram-nos para um modo de viver que vorazmente abraça o imediato, o agora sem saída. Ora, dias como o 1.o de Maio, em que recordamos o que de melhor nos identifica como um povo, como projeto civilizacional, conferem fundo histórico à nossa existência.

Com Abril e Maio o que foi conseguido foi mais que a liberdade de expressão, de reunião, de organização sindical e política. Foi mais do que o direito a escolher livremente os governantes. Abril e Maio trouxeram muito mais. Trouxeram liberdade a sério: saúde, educação, habitação, dignidade no trabalho, cidadania, independência e soberania para os portugueses e para outros povos que a ditadura subjugava.

O Serviço Nacional de Saúde, a Escola Pública, a Segurança Social, a consagração legal da dignidade e da segurança no trabalho transformaram Portugal e fizeram-nos esquecer a dureza de um passado de carências extremas, de humilhações, de muros intransponíveis entre classes sociais, de pungentes despedidas de famílias a caminho da emigração forçada, ou de militares que partiam para uma guerra colonial sem sentido.

Jamais esquecerei a imensa alegria da minha mãe - mulher do campo quase analfabeta e absolutamente distante de qualquer intervenção política - após o 25 de Abril, perante a constatação de que os seus filhos mais novos já não iriam para a guerra colonial. Hoje é preciso relembrar a importância da paz e da soberania, pois a divisão dicotómica e a brutal austeridade seguidas na UE são geradoras de perigos iminentes.

As liberdades positivas e prenhes de dignidade humana, que o Estado social garante, estão em risco. A pretexto de emergências financeiras causadas pela atuação tirana da finança desregrada anunciam-se cortes. Cortes onde mais dói. Não nas adiposidades dos credores, das PPP, de empresas monopolistas e de consultores do Governo, precisamente nos direitos sociais fundamentais que dão conteúdo ao Estado social construído com Abril. Amputar o Estado social, reduzi-lo a mínimos, é reduzir brutalmente a liberdade que Abril trouxe.

Nestes dias é mais clara a necessidade de na memória sermos capazes de construir de novo, reinventar, ir além do passado. Para fazer futuro, e (re)conquistar liberdades e direitos é preciso ação. Estar na rua. Assumir compromissos de combate, de luta social e política capazes de derrubar o atual Governo e as políticas de austeridade de uma U.E. que se está a negar como projeto dos povos europeus, da paz e da solidariedade.

Como expressa a CGTP-IN no seu manifesto "Os trabalhadores, o povo e o país estão perante a mais vil e monstruosa operação de saque económico e de terrorismo social". É necessário uma grande participação dos trabalhadores nas manifestações sindicais do próximo dia 1 de Maio, que se realizam por todo o país.

Sobre cada um de nós recai a responsabilidade de recriar o futuro. O direito último de que não podemos jamais abdicar.

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