João Pedro Henriques
- Diário de Notícias
Cavaco Silva fez do
seu discurso na sessão solene do 25 de abril um claríssimo libelo contra a
emergência de uma crise política e a realização de eleições antecipadas - o que
levou aliás a que fosse várias vezes aplaudido pelas bancadas do PSD e do CDS.
"Reafirmo a
minha profunda convição de que Portugal não está em condições de juntar uma
grave crise política à crise económica e social em que está mergulhado.
Regrederíamos para uma situação pior do que aquela em que nos
encontramos", disse o Presidente da República.
Enfurecendo a
oposição - que já o acusou de ter feito um discurso "partidário" -
Cavaco Silva afirmou que "se prevalecer uma lógica de crispação política
em torno de questões que pouco dizem aos portugueses, de nada valerá ganhar ou
perder eleições, de nada valerá integrar o Governo ou estar na oposição".
"É essencial
que, de uma vez por todas, se compreenda que a conflitualidade permanente e a
ausência de consensos irão penalizar os próprios agentes políticos mas, acima
de tudo, irão afetar gravemente o interesse nacional, agravando a situação dos
que não têm emprego ou dos que foram lesados nos seus rendimentos e
comprometendo por muitos e muitos anos o futuro das novas gerações",
sublinhou - recolhendo aqui, de novo, aplausos da maioria PSD/CDS.
Cavaco Silva fez um
balanço dos dois anos de memorando mas, mais do que isso, tentou por todos os
meios enfatizar as exigências que se continuarão a impôr depois de Portugal
regressar aos mercados.
Determinando já
para o Governo pós troika uma agenda política, disse que "sejam quais
forem os calendários" e "os resultados das [próximas] eleições",
o futuro de Portugal implicará "uma estratégia de médio prazo que tenha em
atenção os grandes desafios que iremos enfrentar mesmo depois de concluído o
Programa de Assistência em vigor".
Ou, dito de outra
forma: "Os nossos agentes políticos, económicos e sociais têm de estar
conscientes que deverão atuar num horizonte temporal mais amplo do que aquele
que resulta dos calendários".
Cavaco Silva foi
mesmo ao ponto de, implicitamente, sugerir a um Governo pós troika a prioridade
de ter uma base maioritária de apoio: "Nessa altura, o País tem de estar
em condições estruturais de credibilidade e governabilidade capazes de garantir
a confiança das instituições da UE e dos mercados financeiros, pelo que, no
plano político, é imperioso preservar a capacidade de gerar consensos em torno
do caminho a seguir para alcançar os grandes objetivos nacionais".
E agitou o fantasma
de um segundo resgate. "O País não pode afastar-se de uma linha de rumo de
sustentabilidade das finanças públicas, de estabilidade do sistema financeiro e
de controlo das contas externas. A não ser assim, seríamos obrigados, se as
instituições internacionais estivessem na disposição de o fazer, a um novo recurso
à ajuda externa, e dessa vez, muito provavelmente, em condições mais duras e
exigentes do que aquelas que atualmente tantos sacrifícios impõem aos
portugueses".
Cavaco Silva
revelou-se ainda muito crítico com a receita do memorando troika, admitindo neste
"falhas nas estimativas" sobre os efeitos recessivos que teria,
"superiores ao previsto". "Alguns dos pressupostos do Programa
não se revelaram ajustados à evolução da realidade, o que suscita a
interrogação sobre se a 'troika' não os deveria ter em conta mais cedo."
Esse "impacto
recessivo" somado a uma "revisão, para pior, da conjuntura
internacional" têm - segundo constatou - "afetado de forma muito
significativa o esforço da consolidação orçamental", nomeadamente no
défice e na dívida pública.
Neste contexto, o
Presidente recomendou explicitamente ao Governo que no próximo Orçamento de
Estado não volta a apostar num "enorme aumento de impostos".
""Seria conveniente que o Orçamento do Estado deixasse de ser um
instrumento para alterações do sistema fiscal", disse, depois de
reconhecer que o país já vive uma "fadiga da austeridade". Também
aconselhou medidas "urgentes" de "relançamento da economia"
- e isto "para que a cura não acabe por matar o doente".
Antes do Presidente
da República, discursaram os representantes dos partidos. À esquerda foram
pedidas eleições antecipadas - embora com o PS numa formulação (de Alberto
Costa) mais suave, visto ter falado apenas na necessidade de "um novo
curso político". À direita, Carlos Abreu Amorim (PSD) e Cecília Meireles
(CDS) sublinharam a necessidade de "consensos".
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