Mário Soares – Diário
de Notícias, opinião
Já várias vezes
escrevi que não aprecio o político Durão Barroso. Porque acho que a sua ambição
o perde e o seu País para ele não conta. Percebi isso quando ele era
primeiro--ministro e numa reunião nos Açores, com o Presidente Bush e, salvo
erro, o então primeiro-ministro José Maria Aznar e Tony Blair, resolveram
iniciar uma guerra no Iraque, completamente inútil, onde morreram milhares de
pessoas.
Depois, ainda sendo
primeiro-ministro de Portugal, quando percebeu que podia ir para Bruxelas, como
Presidente da Comissão Europeia, deixou o Governo de Portugal, sem mais nem
menos. Antes, António Guterres, quando era primeiro-ministro, recusou quando
lhe fizeram a mesma proposta.
Onde, desde então,
esteve quase dez anos, que estão agora a terminar, mas que lhe foram fatais.
Não podia ter sido pior nem mais atacado. Portugal, durante essa década, não
lhe interessou grande coisa, a não ser nos últimos meses. Fiel da chanceler
Merkel, nos primeiros momentos, acabou por se zangar com ela ou vice-versa. Com
a França, de Sarkozy, nem se fala. O Le Monde destruiu-o durante três números.
Mais: arrasou-o! E a América de Barack Obama também nunca o apreciou. Sem falar
dos deputados europeus e de outros dirigentes da União Europeia.
Depois teve a
ambição de ir para a ONU, como secretário-geral, mas percebeu a tempo que não
tinha a menor possibilidade. Então, como já está a arranjar as malas, resolveu
vir para Portugal. Para quê?
Discípulo e amigo
do atual Presidente Cavaco Silva, não deve afirmar que quer ser candidato à Presidência
da República, com dois anos de antecedência do final de mandato do Presidente.
Seria mal compreendido.
Então, resolveu
aproximar-se do Governo. Foi desagradável para o Tribunal Constitucional, o que
não devia ter feito, dadas as funções que ainda exercia, ignorando a pobreza
indescritível em que vive este país e a destruição, pela venda, de tudo o que é
valioso.
Sabe perfeitamente
que o atual Governo só se ocupa do dinheiro e da troika, a quem paga. E que a
austeridade, uma chaga insuportável para todos os países que dela são vítimas,
só leva as populações ao empobrecimento, ao desespero, à emigração e à
criminalidade. Mas isso que lhe importa? Que haja tantos portugueses sem
dinheiro, a dormir nas ruas e a comer apenas o que a Cáritas (que tem sido tão
importante) e outras obras sociais lhes dão.
No Expresso de
sábado passado, Durão Barroso resolveu dar uma entrevista onde figura uma
caricatura extraordinária dele, da autoria de Hélder Oliveira, feita pela
inteligente jornalista Ângela Silva, que lhe perguntou, cito: "Durão
Barroso ensaia o regresso à política portuguesa convicto de que, no momento
oportuno, vai conseguir ser Presidente?" Mas foi tão inoportuno na
resposta ambígua que só criou problemas.
É sabido que não
gosta de Passos Coelho e a inversa também será verdadeira. Mas vir levantar
inoportunamente o caso do BPN em que tantos dos considerados culpados estão em
liberdade e nunca foram julgados, é de alguém que perdeu a habilidade política.
Será que ainda é
amigo do Presidente Cavaco Silva ou já não é? Tenho as minhas dúvidas. Visto
que todo o País sabe que o Presidente tem algo a ver com o caso do BPN. É o que
parece. Como voltar ao problema e porquê? Ou então está sem jeito e habilidade
política...
Além disso, fez o
que me parece infame ao tentar incriminar Vítor Constâncio, que é um homem
impoluto, de reconhecida dignidade e inteligência, atual vice-presidente do
Banco Central Europeu. Como disse Marcelo Rebelo de Sousa, "deu um tiro no
seu próprio pé". Digo mais: parece alguém que perdeu o senso político... O
Eixo do Mal, também a esse propósito, comentou com enorme crítica esse facto.
Vale a pena ouvir.
Vários portugueses
ilustres escreveram logo uma carta aberta em defesa de Vítor Constâncio. E
muito bem. Foram eles: Artur Santos Silva, José Silva Lopes, Rui Vilar, Teodora
Cardoso e Miguel Beleza. Honra lhes seja!
A verdade é que
sabendo tanto Durão Barroso do que se passou no BPN, a senhora
procuradora-geral da República, tem a obrigação de o ouvir e quanto antes.
Tanto mais que a maioria dos culpados nunca foi julgada...
Conheci Vítor
Constâncio logo a seguir ao 25 de Abril de 1974, quando aderiu ao PS. Entrou
pouco tempo depois no Secretariado Nacional do PS, foi ministro das Finanças e
secretário-geral do Partido Socialista. Várias vezes tivemos divergências, o
que é natural num partido democrático, como o PS. Mas isso nunca afetou a minha
admiração e amizade por ele. Contei há dias, numa sessão em que participei em
homenagem a Willy Brandt e Helmut Schmidt, que quando ele era ministro das
Finanças e eu primeiro-ministro, fomos juntos falar com Schmidt para melhorar a
situação económica portuguesa. No final, Schmidt, com a sua sabedoria,
disse-me: "Parabéns! Tens um dos melhores ministros das Finanças da
Europa." Nunca esqueci isso.
Mas além da sua
invulgar inteligência, Vítor Constâncio é um homem de bem com um extraordinário
sentido da dignidade. Como se pode admitir o que dele disse Durão Barroso? É de
pessoa perturbada pela sua ambição? Talvez. Mas é imperdoável.
PARA QUÊ MAIS UM
BANCO PÚBLICO?
Este Governo não
tem remédio, como tenho vindo a afirmar há mais de dois anos. Vai de mal a pior
e agora, sem dúvida, está no fim. Maio, o mais tardar, chega ao seu termo. Mas
se tiver um mínimo de sensatez e perceber que chega de corrupção, talvez saia
antes. Os ministros começam a estar impacientes. Porque se ficarem no País e
houver outro Governo, vai saber-se tudo o que se ignora, que é muitíssimo.Vem
isto a propósito da ideia peregrina de criar um novo banco público, já chamado
de Fomento. Para quê? Da parte de um Governo que já tem um banco público, que
se chama Caixa Geral de Depósitos e que começou por dizer que ia privatizar
tudo, por haver Estado a mais? Será que quer privatizar ou destruir a Caixa
Geral de Depósitos e ficar diretamente, através do novo banco, com os chamados
fundos estruturais europeus que recebemos da União Europeia e que são
avultados? É o que se pretende?
Seja como for, para
este Governo, o silêncio é a regra principal, e ficou-se a saber que vai criar
um novo banco público, sem explicar porquê nem para quê. Um Governo que começou
por afirmar que ia diminuir todas as gorduras do Estado...
Aqui entra o Senhor
Presidente da República, que é doutor em Finanças. Terá sido informado? E que
pensa, de tão grande dislate? Terão sido informados os bancos privados, que os
portugueses conhecem e têm neles algumas das suas pobres economias, dado que os
corruptos e os milionários, esses, têm o seu dinheiro nos bancos estrangeiros?
Ou nos offshores?
O Senhor Presidente
da República não pode ficar calado e, sendo como é, um perito em Finanças, tem
de dizer aos portugueses, e muitos votaram nele, o que se passa. Porque basta
de silêncio, que só faz sentido para esconder a corrupção.
Um Governo
populista (e não social-democrata como falsamente se intitula) agarra-se aos
mercados e à troika. Se não fosse o desejo de mais corrupção, nunca se deveria
querer criar mais um banco público. Foi, aliás, o que disse para ganhar as
eleições há dois anos e tal: tirar as gorduras ao Estado. Mas até agora estão a
fazer o contrário do que prometeram. Cada vez, querem mais gorduras.
O povo, apesar da
pobreza e de sermos hoje (em dois anos e tal) menos do que éramos, pensa,
percebe e sabe que esta situação não se pode manter. Ou como disseram os
militares: vai a bem ou vai a mal...
Se não percebe
isto, o Governo vai perder muito e ter um fim feio e sujo. Ou, talvez, o que
seria pior, violento. Tenho feito muitas chamadas de atenção para que não haja
violência. Mas que terá uma saída que não será bonita isso é o que parece mais
provável.
UM GOVERNO SEM
REMÉDIO
As manifestações
repetem-se quase todos os dias, contra o atual Governo. Mas este parece cego e
surdo. O que lhe interessa não são as pessoas - disse-o várias vezes - mas os
mercados usurários e o dinheiro que fica na mão, seguramente, de alguns
corruptos.
Quando o Governo
cair - o que vai acontecer dentro de, o mais tardar, um mês e pouco - tudo se
vai saber rapidamente. A verdade vem sempre à tona da água.
O País, em poucos
anos foi destruído. Mais de meio milhão de portugueses foram obrigados a sair
de Portugal, para arranjar emprego e muitos enviam, felizmente, dinheiro aos
seus velhos pais, cujas economias e pensões que levaram anos a juntar lhes
foram "roubadas" - é a palavra - pelo Governo.
Os velhos são os
que mais sofrem, sobretudo nas cidades, visto que na província não estão tão
mal, porque sempre têm umas batatas e umas galinhas, de vez em quando, para
comer. Mas a província está a ficar desertificada. Deixaram de ter os CTT, os
centros de saúde, para serem tratados, às vezes a quilómetros de distância, bem
como os tribunais, que em muitos locais foram eliminados.
Daí o desespero da
população que resta na província e nas cidades. As manifestações contra o
Governo repetem-se, quase todos os dias, cada vez com maior vigor. Mas para os
ministros e apaniguados, secretários de Estado, chefes de gabinete, etc., que
importa isso? A polícia cá está para os proteger, sobretudo a polícia de
intervenção, mas a maioria também sofre na pele - e as suas famílias - a
desgraça em que este Governo transformou deliberadamente o País, para dar
dinheiro à troika, mas não só, porque a troika também tem costas largas e
esconde muita coisa. E especialmente com a terrível austeridade, que só serve
para destruir os Estados. O Papa o disse.
Contudo, tenho dito
- e repito - maio vai ser um mês fatal para o Governo e para os seus
apaniguados. Alguns ainda não perceberam isso. E sobretudo com a ajuda da
mudança que vai ter lugar na União Europeia. Tudo ficará diferente. Os meus
leitores verão o que se vai passar na zona euro e em Portugal. Para o
primeiro-ministro isso já é considerado ser muito provável. É inteligente, como
se sabe. Por isso começou, em poucas palavras, a dar a entender o que se vai
passar, durante o mês de maio, mês de eleições para o Parlamento Europeu. E,
seguramente, também não lhe escapa que no mês em curso o fundamental são os
festejos do quadragésimo aniversário do 25 de Abril. E que a primeira versão
dos festejos do Governo era ridícula e imoral, aos olhos de toda a Europa, e
procurou emendá-la.
De resto, não pode
ignorar o que o seu pai, um médico muito respeitado, na reforma, cuja pensão
também foi cortada, lhe aconselhou com verdadeiro amor paternal. A questão é
como sair. Não será fácil. Mas que vai acontecer, vai...
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