sábado, 23 de agosto de 2014

Portugal: O BES EXPLICADO ÀS CRIANCINHAS




O dote para impingir a noiva é de quatro mil milhões

Paulo Chitas – Visão, opinião

Era inevitável. Uma família controlava um banco que usava para financiar outros negócios. Estes davam prejuízo mas a torneira nunca se fechava porque tinham a chave do cofre. O dinheiro não era deles: era dos clientes da instituição. Mas este era um banco escravo - só fazia e financiava o que os seus principais donos queriam. Algumas famílias dizem-se reféns da banca - este era um banco refém de uma família.

O banco era como uma loja de guloseimas. Um dia (quarta-feira, 30 de julho) percebeu-se que os frascos com os doces e os chocolates estavam vazios. Foram entregues aos filhos, aos primos, aos sobrinhos e ao próprio dono da loja para organizarem uma festa. Esperavam que esta fosse um sucesso mas a sala ficou vazia. Por isso, não conseguiram pagar as contas. Como o prejuízo da festa foi muito grande, ainda tiveram de ir às prateleiras buscar mais guloseimas para pagar o que faltava saldar. Quando se vez o inventário, as prateleiras estavam vazias. O gato tinha ido às filhós.

Os interessados em comprar uma parte da loja já não queriam pagar por ela o que valia mas já não vale. Embora tivesse uma bonita montra verde virada para a rua principal, perdeu metade do valor em menos de um minuto. Nos quatro meses em que se foi sabendo que de arromba a festa passou a rombo, o valor da loja caiu 85%. Se antes o dono a trocaria por uma mansão em Cascais, com jardim, criados e muitos quartos, agora nem por uma cabana de montanha. Talvez desse para um abrigo de pescadores nas praias de Grândola, de pobrezinhos.

Diz o presidente da associação de lojas de guloseimas que há interessados na loja. Mandou geri-la por um dos seus e quer pô-la à venda para ver o que se salva. É preciso pagar o açúcar, as amêndoas, os ovos e a baunilha aos fornecedores. Uma instituição assim, que durante tantos anos produziu, distribuiu e vendeu as mais doces guloseimas do país, e até da Suíça, do Luxemburgo e de Angola, não pode morrer inglória. E não pode arrastar consigo os fornecedores, os distribuidores, os que pagaram as encomendas mas nunca viram as guloseimas sobre a mesa. E a loja tem uma montra verde muito bonita.

Mas quererá alguém comprá-la? Não é como aquela noiva vestida com as mais belas sedas mas com joanetes pontiagudos a deformarem o sapato? Sob o belo chapéu de penas não vai ela careca? Consegue a maquilhagem esconder a verruga no lábio superior? Ou as luvas as unhas sujas?

O presidente da associação diz que sim, que há pretendentes. Mas o Silva, modesto e pouco habituado a guloseimas à sua mesa, não é parvo: suspeita que aquela noiva ninguém vai querer. O dote para a impingir é tão grande - quatro mil milhões, diz-se na rua. Como se vai tanto dinheiro juntar? Só se o povo se coletar pois tão grande maquia é difícil de arranjar. Mas como pedir aos que nunca provaram tais iguarias, que as paguem? Talvez dizendo que é um desígnio nacional, pois um país não pode ficar com uma noiva assim.

Moral da história: a loja tem uma montra verde muito bonita que dá para a rua principal.

*artigo de opinião em Visão de 1 de Agosto 2014

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