segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Merkel disposta a um dar castigo exemplar à Grécia para pôr a Europa na linha



Diogo Vaz Pinto – jornal i

Com o Syriza a liderar as sondagens a semanas das presidenciais, Berlim diz que desta vez não vai evitar que os gregos se lancem no abismo

O ABC da nova democracia proposta pela Alemanha aos restantes membros da zona euro está a ser explicada novamente aos piores alunos da Europa: os gregos. A primeira regra é que só há um caminho para o futuro e esse é o da austeridade. A chanceler Angela Merkel quis assegurar-se de que os alunos na última fila percebiam que não há margem para desvios, e sublinhou que se a Grécia escolher um governo que desafie a lei da austeridade, desta vez o país será deixado à sua sorte.

A notícia avançada ontem pela revista alemã "Der Spiegel", cita fontes junto do executivo de Merkel e reage a uma nova sondagem que coloca o Syriza na frente a três semanas das eleições antecipadas na Grécia. O partido da extrema-esquerda liderado por Alexis Tsipras insiste em reverter algumas das reformas que lhe foram impostas pelos credores internacionais e garante que vai renegociar o acordo de resgate.

O artigo do "Der Spiegel" foi ecoado pela imprensa europeia como se se tratasse de uma "radical mudança de opinião" ("El País") por parte de Merkel quanto ao futuro dos helenos, mas nos últimos dias algumas figuras ligadas ao governo alemão têm insistido que a Grécia perdeu importância no bloco do euro, não existindo já o risco de uma crise sistémica. Tanto a chanceler como o seu ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, estão confiantes de que o bloco fez progressos suficientes desde que a crise do euro culminou em 2012, e por isso entendem que a saída da Grécia poderá ser conduzida sem novas complicações. "O perigo de contágio é limitado pois se considera que Portugal e Irlanda estão já reabilitados", adiantou à publicação alemã uma fonte não identificada do governo.

Há cinco anos, quando estalou a crise na Grécia que fez temer um contágio que, em último caso, poderia representar o fim da zona euro, Merkel assumiu duas decisões importantes numa altura em que as instituições europeias revelaram uma total inabilidade de liderança a favor da União. Num tom categórico e que não admitia discussões, disse que a Grécia iria continuar na zona euro e determinou que os seus membros iriam adoptar uma drástica poupança e aumento das receitas fiscais, um desígnio que apesar de toda a contestação continua a vigorar.

Mas agora, com o Syriza na dianteira da corrida às presidenciais gregas do dia 25 de Janeiro, chegou a altura da cavalaria alemã entrar em cena para uma vez mais esmagar a ameaça esquerdista e devolver o controlo da situação aos bons alunos. A vantagem do partido de Tsipras não é muito significativa, e registou aliás uma ligeira diminuição. Uma sondagem publicada ontem pelo diário grego "Eleftheros Typos", coloca o Syriza com uma vantagem de 30,4% dos votos contra os 27,1% dos conservadores no poder do Nova Democracia.

GREXIT Na passada segunda-feira, Schäuble tinha já avisado a Grécia de que qualquer que fosse o executivo a emergir das próximas eleições não lhe seria dado espaço para se desobrigar das promessas feitas pelo actual executivo liderado por Antonio Samaras. Entretanto, contemplando um cenário em que os gregos desta vez não recuem no dia de ir às urnas, optando por uma via que ponha fim ao sufoco em que têm vivido, Berlim mostrou a força das suas convicções avançando já com o baptizado da eventual saída da Grécia do euro: "Grexit".

O semanário alemão destacava também que a zona euro está agora apetrechada com o fundo de resgate europeu, o chamado Mecanismo Europeu de Estabilidade, que é tido como um "efectivo" meio de resgate que se encontra já disponível para fazer frente a eventuais crises. Os grandes bancos, por sua vez, caem sob a alçada da união bancária. Assim, "deixou de predominar em Berlim e Bruxelas a teoria do efeito dominó que advertia para o perigo do fim da união monetária, na queda de um dos seus membros". A fé europeia está hoje do lado da chamada "teoria da cadeia", a ideia de que se o elo mais fraco da cadeia cai, esta fica mais forte.

Para o governo alemão, a expulsão grega pode mesmo tornar-se uma medida exemplar, pois chegou à conclusão de que não pode ceder à pressão da Grécia se quer manter na linha países como França e Itália. Numa altura em que há formações como a Frente Nacional, de Marine Le Pen, o Movimento 5 Estrelas, de Beppe Grillo, ou o Podemos, de Pablo Iglesias, que assumem preponderância na cena política europeia, Berlim precisa ilustrar para a turma inteira os perigos de pôr de lado as reformas que sancionou.

O "Der Spiegel" adianta que Merkel está meio inclinada para ignorar a ameaça que uma vez mais se ergue na Grécia contra as suas instruções. Na quarta-feira, numa entrevista ao jornal alemão "Rheinische Post", um membro do governo alemão, Michael Fuchs, disse que a Europa já não se sente obrigada a salvar a Grécia e que os políticos helenos perderam a margem para exercer "chantagem" sobre os seus parceiros no bloco monetário.

Como quem não quer a coisa, Berlim tem agora duas mensagens, uma velha e uma nova. A velha é de que se os gregos decidirem tomar as rédeas do seu destino, podem fazê-lo mas vão achá-lo no abismo. A nova é de que já não há vários pesos e medidas na zona euro; ou os seus membros seguem a Alemanha ou mais vale ir cada um à sua vida.

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