Posição
de evidência dentro do PT, percepção popular de que o presidente governa
sozinho e erros cometidos pela própria Dilma explicam por que ela virou alvo
central dos protestos, mesmo sem ser acusada na Lava Jato.
Por
que só Dilma? Apesar de nem figurar na lista de acusados na Operação Lava Jato
e de ter pautado sua gestão pelo combate à corrupção, a presidente Dilma
Rousseff foi o principal alvo dos manifestantes que saíram às ruas de várias
cidades brasileiras no domingo passado (15/03).
O
fato de os nomes dos presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara dos
Deputados, Eduardo Cunha, estarem na lista de políticos a serem investigados na
Operação Lava Jato, entregue pela Procuradoria-Geral da República ao Supremo
Tribunal Federal (STF), parece ter passado despercebido pela maioria dos
manifestantes.
A
denúncia de que o esquema de corrupção na Petrobras existe há pelo menos 15
anos também foi deixada de lado. Os protestos de 15 de março, que em tese
poderiam ser contra os representantes máximos do Executivo e do Legislativo,
bem como contra a disseminação da corrupção pela política brasileira,
voltaram-se contra a presidente. Por quê?
Figura
mais em evidência do PT
Para
especialistas ouvidos pela DW Brasil, um dos motivos centrais é o
descontentamento de boa parte dos brasileiros com o PT, que há mais de 12 anos
governa o país. Além do desgaste natural de quem está há tanto tempo no poder,
o partido se viu envolvido em escândalos de corrupção, como o mensalão, e é
apontado como um dos principais beneficiados pelo esquema de desvio de dinheiro
na Petrobras.
Dilma,
na condição de presidente da República, é hoje a figura mais em evidência do PT,
até mais do que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, maior líder do
partido. E, ao contrário de Lula, ocupa um cargo, para o qual foi eleita pela
população, e do qual pode ser afastada. Assim, é contra ela que a indignação de
muitos brasileiros se volta.
"A
Operação Lava Jato só exacerbou uma reação contrária, já existente, ao governo
do PT e à presidente Dilma", afirma a socióloga Vera Chaia, da PUC-SP. O
cientista político Pedro Floriano Ribeiro, da Universidade Federal de São
Carlos, é da mesma opinião. Para ele, os protestos só evidenciam o
descontentamento de uma parcela da população com o PT, principalmente em São Paulo.
O
sociólogo Marcelo Siqueira Ridenti, da Unicamp, acrescenta que os manifestantes
que saíram às ruas no último domingo eram sobretudo pessoas que não votaram no
PT, então era de se esperar que apenas Dilma e o PT fossem os alvos. "O
interesse dos manifestantes era atacar o partido que está no governo",
completa.
Sistema
presidencialista
Mas
a aversão ao PT não explica sozinha esse foco na figura de Dilma. Para os
especialistas, o sistema presidencialista brasileiro, extremamente concentrado
na figura do presidente, reforça uma percepção equivocada de que ele governa e
resolve tudo sozinho – bastaria, portanto, trocá-lo para solucionar os
problemas.
"É
natural que o presidente funcione como um para-raio, pois no sistema
presidencialista ele acaba encarnando toda a classe política. E como há uma
aversão muito grande e generalizada à classe política, e não só no Brasil, é
normal que a população jogue toda a sua 'raiva' contra a figura do
presidente", diz Ribeiro.
Por
esse raciocínio, um presidente de estilo durão e com pouco carisma, como é o
caso de Dilma, se torna ainda mais facilmente um alvo da insatisfação popular.
Quanto
ao Congresso, que tem 22 deputados federais e 12 senadores entre os
investigados na Lava Jato, Ribeiro é categórico: "Os parlamentares já tem
uma imagem tão negativa perante a população que um caso a mais ou a menos de
corrupção não afeta a sua imagem. Por isso, eles ficam em segundo plano, e todo
o foco da rejeição à classe política vai em direção à figura da
presidente."
Os
erros de Dilma
Há,
porém, alguns motivos justificados para que a presidente seja alvo da ira
popular. Chaia lembra que Dilma tem uma ligação recente com a Petrobras,
primeiro como presidente do Conselho de Administração da estatal entre 2003 e
2010, depois como presidente da República. A escolha de Graça Foster para o
comando da petrolífera foi uma decisão de Dilma. Ambas são amigas.
Após
as primeiras denúncias de irregularidades, a presidente demorou para mudar a
diretoria da estatal. Depois, o governo segurou a divulgação do balanço da
empresa no terceiro trimestre de 2014, que, mesmo sem considerar as perdas
causadas por corrupção, mostrou uma queda de 9,07% em seus lucros. Essas
decisões certamente não ajudaram a melhorar a imagem da presidente perante a
população.
"Houve
uma sequência de posicionamentos duvidosos do governo, como a manutenção da
Graça Foster na presidência da Petrobras, que depois se reverteram
negativamente para a própria presidente da República", avalia o cientista
político Alexandre Gouveia, da UnB.
Clarissa
Neher – Deutsche Welle
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