quarta-feira, 4 de março de 2015

Quando o PM timorense 'inspecionou' a gasolineira, e viu as 'manipulações' dos cupões



António Sampaio, da Agência Lusa

Díli, 04 mar (Lusa) - A entrada do carro com o chefe do Governo timorense na gasolineira em Balide, em Díli, surpreendeu tanto os jornalistas que o acompanhavam como os funcionários e clientes que não esperavam a comitiva.

Afinal desde o início da manhã que Rui Maria Araújo andava em inspeções a departamentos públicos - tinha acabado de visitar a Direção Geral do Património do Estado - e a gasolineira é, afinal, de uma empresa privada.

Rui Araújo sai do carro, é saudado pelos clientes e pergunta quem é o responsável e onde é o escritório.

Mas afinal não é o escritório que interessa. A pequena sala, meio escura e com duas secretárias - em cima de uma um computador, que até parece desligado, na outra um capacete de mota -, não tem ninguém.

O interesse é mesmo perto das bombas, onde uma microlet - as carrinhas de transporte público de Timor-Leste - um jipe e duas motas se estão a abastecer de "bensin".

E mais propriamente na caixa do dinheiro, uma gaveta de madeira gasta, onde estão notas de dólares americanos e o objetivo da visita: os cupões usados para abastecer as viaturas de toda a função pública.

"Gastamos milhões nisto. O Estado tem 6 mil e tal carros e 7 ou 8 mil motas. E isso são muitos milhões em manutenção e muitos milhões em combustível", conta o chefe do Governo à agência Lusa enquanto vai vendo os cupões na gaveta. E pede explicações sobre como funciona o sistema.

E, rapidamente, percebe as muitas falcatruas possíveis: não há registo de quilometragem, algumas vezes nem sequer se comprova que a matrícula escrita no cupão é de facto a que está a abastecer.

"Tás a ver? Eu posso chegar aqui com dois cupões de 20 dólares cada, meter só 20 dólares no carro e vender o outro, metendo o dinheiro ao bolso", explica o primeiro-ministro.

Rui Araújo governa desde o dia 16 de fevereiro e em menos de um mês já impôs um ritmo próprio que inclui verificar tudo do aparelho do Estado: como trabalha, quem trabalha, como interagem os serviços, o que se gasta, como se gasta e o que se desperdiça ou, acima de tudo, onde se pode melhorar.

"Temos que racionalizar os gastos da administração pública. Precisamos de mecanismos para garantir que a despesa é bem executada em defesa do interesse do Estado", explicou depois aos jornalistas.

"Este sistema dos cupões, por exemplo, tem muitas possibilidades de ser manipulado, na forma como é utilizado. Temos que rever isto. Em defesa do Estado e do povo", sublinha.

À semelhança do que faz semanalmente desde que tomou posse, Rui Araújo voltou hoje a dedicar a manhã a inspeções surpresa a departamentos do Governo.

As regras são sempre as mesmas: os jornalistas que queiram acompanhar as visitas têm que estar cedo no Palácio do Governo, o primeiro-ministro viaja com dois carros de escolta e nunca se sabe exatamente o destino.

"Hoje deve ser educação", comenta um jornalista depois de ver os dois titulares da pasta, o ministro Fernando La Sama de Araújo e a vice-ministra, Dulce Jesus Soares, do Palácio do Governo.

"Se calhar é a RTTL (a televisão e rádio pública) ", comenta outro.

Afinal foi dia de ver o parque móvel do Estado, perceber a dimensão desta componente dos gastos, perguntar como se alienam carros - os vários formatos de leilões.

E de visitar uma gasolineira.

ASP // JCS

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