quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Angola. POLÍCIA TEM O DEVER DE EVITAR O CAOS



Adelina Inácio – Jornal de Angola

O ministro do Interior deixou ontem claro, em conferência de imprensa, que a Polícia Nacional pode impedir manifestações que violem a Lei ou ponham em causa a paz e a estabilidade política e social.

Ângelo da Veiga Tavares, que falava a propósito do desempenho do sector ao longo dos 40 anos de Independência Nacional, disse que em alguns casos as manifestações já realizadas procuraram criar o confronto com as autoridades.

“Os órgãos de Polícia devem fazer cumprir a Lei. Quando uma manifestação vem fazer o apanágio à guerra, a Polícia pode a todo o momento impedir que ela se realize”, disse Ângelo da Veiga Tavares, para quem existe uma forte tendência para os promotores das manifestações olharem para a Lei apenas naquilo que lhes é particularmente favorável.

Segundo o ministro, as manifestações contra os órgãos de soberania surgem, desde o início, eivadas de vícios e violam o que estabelece a Lei das Manifestações, porque visam simplesmente ofender titulares destes órgãos.

Caso Luaty Beirão

O ministro criticou a atitude de Luaty Beirão, um dos cidadãos acusados do crime de praticar actos preparatórios de rebelião, por recorrer à greve de fome para justificar que o crime de que está acusado prevê liberdade provisória. Para Ângelo Tavares, o recluso simplesmente banalizou o bem vida, o que é reprovável.

O ministro do Interior reforçou a acusação que pesa sobre os “15 mais dois”, afirmando que, nas suas reuniões, estes estudavam, inclusive, a forma como iam fazer a incursão ao Palácio Presidencial para forçar o Presidente da República a renunciar ao cargo. Ângelo da Veiga Tavares sublinhou que era o próprio Luaty Beirão quem incentivava os outros companheiros a manterem-se firmes e focados no seu objectivo, nem que isso implicasse a morte.

"Persona non grata"

Ângelo Tavares revelou ainda que, no ano passado, o Estado angolano foi obrigado a convidar uma cidadã europeia a abandonar o país, por se ter comprovado que mantinha reuniões com os mesmos cidadãos agora detidos, nas quais “dava indicações claras” de que as manifestações que estavam a ser então preparadas deviam “provocar confrontos graves com a Polícia”, ao ponto de “causar mortes”. 

As indicações da cidadã europeia, cuja identidade e nacionalidade não foi avançada, davam conta que os desacatos deviam em média causar entre 20 e 25 mortos. “É por isso que em alguns casos a polícia prefere actuar de maneira a que as manifestações não atinjam um nível de confronto que corresponda aos reais intentos dos seus promotores”. Alguns cidadãos com estatuto de diplomatas instigavam pessoas para que entrassem em confronto com a polícia para resultar em mortes.

Fundos do exterior

O ministro revelou que nas suas reuniões, os indivíduos agora detidos e que algumas personalidades de maneira “nada ingénua” insistem que apenas liam um livro, também discutiam “como gerir apoios provenientes do exterior”. Estes indivíduos questionavam a idoneidade dos bancos comerciais angolanos e chegaram a considerar a realização de depósitos em bancos de países limítrofes.

Em alguns momentos das reuniões, estes indivíduos que aguardam julgamento em regime fechado, discutiam sobre como desmantelar o ministro, vice-ministro e todo o sistema de inteligência do país. 

“Tudo isso que estou a dizer existe e tem registo. Em momento próprio vai-se saber que o que se estava a passar era muito mais do que uma simples tentativa de manifestação, como algumas pessoas tentam fazer crer. Era algo bem diferente e no meu entender havia sim alguém, à sombra, a regimentar o estado de alma dos indivíduos para fins diferentes”, frisou.

Rafael Marques

Ainda sobre o caso Luaty Beirão, o detido que decidiu fazer greve de fome por considerar que as acusações que pesam sobre si lhe davam o direito de aguardar o julgamento em liberdade, o ministro revelou que alguns deputados da oposição juntaram-se aos esforços das autoridades para persuadir o recluso a interromper a greve de fome.

Segundo o ministro, o activista Rafael Marques manifestou interesse em recolher assinaturas dos demais detidos para levar a Luaty Beirão, de modo a demovê-lo, mas o suposto documento acabou por ser transformado na declaração do recluso, amplamente difundida nos media em Portugal sobre o fim da greve de fome.

“O que vocês viram foi o texto preparado pelo senhor Rafael Marques, assinado pelo Luaty e tornado público”, lembrou Ângelo Tavares, sublinhando que o activista, que durante anos representou a Fundação Open Society em Angola, disponibilizou-se em persuadir os detidos, no sentido de “mudarem o rumo, de revolucionários para Movimento de Liberdade de Expressão”.

“Nós acedemos a essa aparente manifestação de boa vontade expressa por ele, no sentido dele contribuir também para que a greve de fome terminasse”, disse o ministro.

Festas em segurança

O ministro do Interior garantiu estarem criadas todas as condições necessárias para o curso normal das festividades dos 40 anos de Independência Nacional, que têm nos dias 10 e 11 os momentos mais elevados. Ângelo Tavares afirmou que desde a proclamação da Independência Nacional, a 11 de Novembro de 1975, o Ministério do Interior e os seus órgãos sempre deram o seu contributo para salvaguardar a conquista da liberdade, defesa dos interesses do Estado e patrimoniais dos cidadãos. 

“O grande ganho do Ministério do Interior e todos os seus órgãos foi ter contribuído, ao lado das Forças Armadas, para a preservação da independência e integridade territorial”, disse Ângelo Tavares, referindo-se ao papel do sector durante os últimos 40 anos.  

O ministro reconheceu que, apesar de se estar a fazer um esforço para a melhoria do controlo das fronteiras do país, o sector que dirige tem ainda algumas debilidades no controlo eficaz das fronteiras. “O tamanho das fronteiras, quer terrestres quer marítima e fluvial, requer um esforço financeiro muito grande”, disse, antes de admitir que a imigração tem constituído uma preocupação do Executivo que, no entanto, tem feito esforços para o seu combate.

Combate ao terrorismo

Sobre o combate ao terrorismo e ao branqueamento de capitais, Ângelo Tavares lembrou que foram aprovados vários diplomas para conformar a legislação do país a convenções e tratados internacionais. 

O ministro referiu-se à Lei de Branqueamento de Capitais e Crimes Subjacentes e à Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, como dois diplomas fundamentais e ilustrativos da vontade do Executivo em conformar a legislação interna às boas práticas internacionais. No mesmo sentido, a criação de um grupo de trabalho que está a preparar as bases para o futuro Observatório de Combate ao Terrorismo.

“Dentro das nossas possibilidades, estamos a tentar levar o combate não só ao terrorismo, mas também a outros fenómenos como o tráfico de órgãos e de seres humanos, que embora de forma tímida, há indícios que fazem com que os órgãos de Polícia dediquem maior atenção”, disse.

Drogas e população prisional

Ângelo Tavares disse ainda que alguns jovens já fazem uso de drogas pesadas e que, apesar disso, Angola continua a ser considerado um país de trânsito, particularmente nos voos provenientes do Brasil. A Polícia tem estado atenta e procura não facilitar em relação às medidas de controlo. O ministro referiu que existe um número considerável de detidos e até de condenados por casos que envolvem drogas.  

Até ao momento, encontram-se nos estabelecimentos prisionais do país mais de 23 mil reclusos, dos quais 12 mil condenados e pouco mais de dez mil detidos. Um assunto que preocupa as autoridades angolanas, uma vez que são gastos valores elevados a nível do sistema penitenciário. Ângelo Tavares precisou que, em média, o Estado gasta 20 dólares diários por cada recluso.

O ministro do Interior mostrou-se preocupado com o tendencial aumento dos índices de criminalidade, particularmente no seio familiar. “Temos orientado a Polícia Nacional a adoptar medidas que melhorem a eficácia da acção policial no combate à criminalidade, de modo a tornar um facto o policiamento de proximidade”, frisou.

Disciplina na corporação

Quanto à disciplina no seio da Polícia Nacional, o ministro disse que o sector tem procurado ser cada vez mais exigente, reforçando as medidas disciplinares a todos os níveis. “No primeiro semestre deste ano foram demitidos 101 quadros dos órgãos do Ministério do Interior, quando em todo o ano passado foram 174. Ainda nos primeiros seis meses de 2015 foram despromovidos 66, mais dois que o total das despromoções em 2014. 

Em matéria de disciplina, o ministro falou ainda das multas e repreensões. “No primeiro semestre deste ano foram aplicadas 28 multas, quando o ano passado foram 114. Devido a actos deontologicamente reprováveis, com grau menor de gravidade, tivemos 98 repreensões, no primeiro semestre deste ano, enquanto o ano passado foram repreendidos 174”.

Fotografia: João Gomes

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