quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

EXEMPLOS DE TUNIS



 Rui Peralta, Luanda

Na Tunísia o fascismo islâmico tem como alvos principais, na sua acção de desestabilização, as forças de segurança (94 mortos e 220 feridos) e o turismo (65 turista mortos. Em termos globais, o Daesh (cuja estratégia é uma constelação de violências) tem como objectivo estabelecer o Califado nos territórios da Síria / Iraque e abrir agencia funerárias em todo o mundo islâmico, deixando as embaixadas (mas sem embaixadores, apenas adidos militares) para o Ocidente e para o Oriente não-islâmico.

O fascismo islâmico concebeu esta forma prática de matar sem hipocrisia, onde quer que seja, sendo o alvo qualquer um de nós. Isto torna-o um factor altamente favorável ao desenvolvimento de sentimento de medo na opinião pública que é de imediato explorado por dois sectores parasitários complementares (que aos poucos tornam-se um só, em metamorfose) que vêm neste sentimento uma oportunidade única de ampliarem o seu domínio: a indústria da segurança e as burocracias escleróticas que compõem as actuais seguranças de Estado. Estas últimas, para sobreviverem e impedirem a consubstanciação do Estado Democrático de Direito em novas formas alargadas e de participação democrática, tornam-se parceiras das primeiras (a industria da segurança), germinando um oligopólio que asfixiará o aprofundamento das fórmulas democráticas.

As liberdades e os direitos não podem ser suprimidos em nome da sacrossanta covardia da segurança e a democracia não pode ser subjugada á demagogia proclamada pelos novos arautos do totalitarismo que tentam impor á cidadania global o “modus vivendi” concentracionário. A hipocrisia em torno da “segurança que protege a liberdade” (estado de emergência, suspensão de direitos constitucionais, etc.) não é mais do que uma ampla e bem montada campanha de desestabilização cujo objectivo é debilitar as sociedades democráticas e implementar o apartheid social (tratando os mais pobres como animais, desfazendo as minorias culturais e étnicas e marginalizando o Islão no Ocidente, ou marginalizando xiitas no mundo islâmico, por exemplo, em nome da prevalência sunita, ou vice-versa).

O Califado assassino e o Estado francês ferido entendem-se perfeitamente e complementam-se. O mesmo ocorre com o Estado tunisino, um exemplo bem-sucedido de democracia criada por uma excepcional Primavera norte-africana (Os eurocêntricos dizem que é Árabe), localizado entre o gigante argelino e a destruturada Líbia. A Tunísia é um país pequeno, com grandes desníveis sociais, de economia débil e com um frágil equilíbrio politico. A transição democrática, bem-sucedida do ponto de vista político e institucional é, no entanto, frágil e necessita de tempo para se implementar de forma mais sólida.

O risco da Tunísia ser arrastada para o caos regional é enorme e o Estado tunisino, tal como o francês, adapta-se às novas realidades da insegurança através da demagogia barata (e lucrativa) do culto da segurança, da hipocrisia fascistóide do estado de emergência, a paranóia “territorialista” das fronteiras fechadas, da repressão policial, do militarismo e das declarações ora abertas, ora disfarçadas contra os Direitos Humanos, a Democracia e o Estado Democrático de Direito, feitas pelos “fazedores de opinião” e os “analistas” nos meios de propaganda social.

O terrorismo é um instrumento de implementação, a longo-prazo, de ditaduras. A curto-prazo prepara a ofensiva totalitária e a médio-prazo impede o funcionamento das instituições democráticas. Dois anos depois a Constituição tunisina, a única laica e democrática no Norte de África, proclama um poema homérico que muitos esqueceram. Sob o pretexto de combater o terrorismo foram promulgadas leis anticonstitucionais, como a lei antiterrorista, altamente restritiva das liberdades fundamentais, ou a lei da reconciliação que reabilita os empresários corruptos e mafiosos do antigo regime tunisino.

Mais grave, ainda, é o facto de o terror estar a minar a sociedade tunisina, paralisando a soberania popular e a liberdade individual, conforme demonstra um inquérito publicado pelo jornal al-Magrebe. Nesse inquérito cerca de 70% dos tunisinos estão dispostos a renunciar às liberdades e direitos básicos a troco de maior segurança. No meio da crise de valores democráticos, terroristas e antiterroristas entendem-se num ponto: mandar a Constituição para o lixo. A coligação governamental composta pelo Ennahda, (partido democrático islâmico) e por uma importante parcela da esquerda (laica) vê-se constrangida e instrumentalizada pela estratégia do fascismo islâmico. Os atentados sucedem-se com frequência cada vez maior e cada vez mais espectacular. As respostas são cada vez mais inoperantes.

O terrorismo espalha a tentação totalitária e o autoritarismo, afogando nas águas turvas os sonhos de liberdade, justiça e democracia que assumiu-se com a Primavera tunisina, em 2011. Por resolver permanecem os problemas da pobreza, da miséria, do desemprego e da humilhação social, ou sejam os problemas de classe. Os atentados apenas servem para perpetuar estes problemas impedindo a sua resolução.

E este cenário não é apenas uma questão tunisina. É um problema global que é colocada á democracia, ou melhor, ao processo de aprofundamento da democracia que implica a redistribuição equitativa dos direitos e liberdades - valores universais da humanidade - e da riqueza material. O exemplo do Premio Nobel da Paz, redistribuído por quatro personalidades tunisinas é um exemplo próprio de qualquer sociedade democrática e pacífica.

E, nesse sentido, Tunes é um (bom) exemplo…

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