Rui Peralta, Luanda
Na
Tunísia o fascismo islâmico tem como alvos principais, na sua acção de
desestabilização, as forças de segurança (94 mortos e 220 feridos) e o turismo
(65 turista mortos. Em termos globais, o Daesh (cuja estratégia é uma
constelação de violências) tem como objectivo estabelecer o Califado nos
territórios da Síria / Iraque e abrir agencia funerárias em todo o mundo
islâmico, deixando as embaixadas (mas sem embaixadores, apenas adidos
militares) para o Ocidente e para o Oriente não-islâmico.
O fascismo islâmico concebeu esta forma prática de matar sem hipocrisia, onde
quer que seja, sendo o alvo qualquer um de nós. Isto torna-o um factor
altamente favorável ao desenvolvimento de sentimento de medo na opinião pública
que é de imediato explorado por dois sectores parasitários complementares (que
aos poucos tornam-se um só, em metamorfose) que vêm neste sentimento uma
oportunidade única de ampliarem o seu domínio: a indústria da segurança e as
burocracias escleróticas que compõem as actuais seguranças de Estado. Estas
últimas, para sobreviverem e impedirem a consubstanciação do Estado Democrático
de Direito em novas formas alargadas e de participação democrática, tornam-se
parceiras das primeiras (a industria da segurança), germinando um oligopólio
que asfixiará o aprofundamento das fórmulas democráticas.
As liberdades e os direitos não podem ser suprimidos em nome da sacrossanta
covardia da segurança e a democracia não pode ser subjugada á demagogia
proclamada pelos novos arautos do totalitarismo que tentam impor á cidadania
global o “modus vivendi” concentracionário. A hipocrisia em torno da “segurança
que protege a liberdade” (estado de emergência, suspensão de direitos
constitucionais, etc.) não é mais do que uma ampla e bem montada campanha de
desestabilização cujo objectivo é debilitar as sociedades democráticas e
implementar o apartheid social (tratando os mais pobres como animais,
desfazendo as minorias culturais e étnicas e marginalizando o Islão no
Ocidente, ou marginalizando xiitas no mundo islâmico, por exemplo, em nome da
prevalência sunita, ou vice-versa).
O Califado assassino e o Estado francês ferido entendem-se perfeitamente e
complementam-se. O mesmo ocorre com o Estado tunisino, um exemplo bem-sucedido
de democracia criada por uma excepcional Primavera norte-africana (Os
eurocêntricos dizem que é Árabe), localizado entre o gigante argelino e a
destruturada Líbia. A Tunísia é um país pequeno, com grandes desníveis sociais,
de economia débil e com um frágil equilíbrio politico. A transição democrática,
bem-sucedida do ponto de vista político e institucional é, no entanto, frágil e
necessita de tempo para se implementar de forma mais sólida.
O risco da Tunísia ser arrastada para o caos regional é enorme e o Estado
tunisino, tal como o francês, adapta-se às novas realidades da insegurança
através da demagogia barata (e lucrativa) do culto da segurança, da hipocrisia
fascistóide do estado de emergência, a paranóia “territorialista” das fronteiras
fechadas, da repressão policial, do militarismo e das declarações ora abertas,
ora disfarçadas contra os Direitos Humanos, a Democracia e o Estado Democrático
de Direito, feitas pelos “fazedores de opinião” e os “analistas” nos meios de
propaganda social.
O terrorismo é um instrumento de implementação, a longo-prazo, de ditaduras. A
curto-prazo prepara a ofensiva totalitária e a médio-prazo impede o
funcionamento das instituições democráticas. Dois anos depois a Constituição
tunisina, a única laica e democrática no Norte de África, proclama um poema
homérico que muitos esqueceram. Sob o pretexto de combater o terrorismo foram
promulgadas leis anticonstitucionais, como a lei antiterrorista, altamente
restritiva das liberdades fundamentais, ou a lei da reconciliação que reabilita
os empresários corruptos e mafiosos do antigo regime tunisino.
Mais grave, ainda, é o facto de o terror estar a minar a sociedade tunisina,
paralisando a soberania popular e a liberdade individual, conforme demonstra um
inquérito publicado pelo jornal al-Magrebe. Nesse inquérito cerca de 70% dos
tunisinos estão dispostos a renunciar às liberdades e direitos básicos a troco
de maior segurança. No meio da crise de valores democráticos, terroristas e
antiterroristas entendem-se num ponto: mandar a Constituição para o lixo. A
coligação governamental composta pelo Ennahda, (partido democrático islâmico) e
por uma importante parcela da esquerda (laica) vê-se constrangida e
instrumentalizada pela estratégia do fascismo islâmico. Os atentados sucedem-se
com frequência cada vez maior e cada vez mais espectacular. As respostas são
cada vez mais inoperantes.
O
terrorismo espalha a tentação totalitária e o autoritarismo, afogando nas águas
turvas os sonhos de liberdade, justiça e democracia que assumiu-se com a
Primavera tunisina, em 2011. Por resolver permanecem os problemas da pobreza,
da miséria, do desemprego e da humilhação social, ou sejam os problemas de
classe. Os atentados apenas servem para perpetuar estes problemas impedindo a
sua resolução.
E
este cenário não é apenas uma questão tunisina. É um problema global que é
colocada á democracia, ou melhor, ao processo de aprofundamento da democracia
que implica a redistribuição equitativa dos direitos e liberdades - valores
universais da humanidade - e da riqueza material. O exemplo do Premio Nobel da
Paz, redistribuído por quatro personalidades tunisinas é um exemplo próprio de
qualquer sociedade democrática e pacífica.
E,
nesse sentido, Tunes é um (bom) exemplo…
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