Rui Peralta, Luanda
Existe
um “monstro devorador” real, criação sui generis do pesadelo organizacional. É
uma daquelas aberrações que tornaram-se norma (ou seja atingiu o estatuto de
normalidade) e que nos dias de hoje permanecem sobre os nossos direitos e
liberdades como uma espada de Démocles: a burocracia.
O
impulso de autoconservação obriga o Estado (seja ele qual for, desde o Estado
Total do fascismo e derivantes ultranacionalistas, até ao Estado Socialista com
as suas múltiplas variantes reais e irreais – estilo socialismo seculo XXI - de
capitalismo de Estado, ou o angélico Estado de Direito) a reunir á sua volta e
a entrelaçar o maior número possível de “interessados”. Dai ser uma referência
comum a afirmação: “A organização do Estado necessita de uma burocracia
numerosa e amplamente estruturada”. Comum e medíocre.
A
burocracia representa um importante coeficiente no cálculo dos esforços dos
grupos dominantes para se manterem no Poder. Esta necessidade cresce de forma
directamente proporcional á insatisfação, ou seja, está directamente
relacionada com a convicção, por parte dos indivíduos, que não existe
finalidade na ordem social vigente. A resposta – devido á necessidade de
assegurar o Poder – surge através da criação de uma vasta casta de
funcionários, directamente dependentes do Estado. Este amplo número de
funcionários assalariados tornam-se os maiores defensores do Estado.
As
tendências das economias do seculo XX resultaram num poderoso reforço do
Estado. Por parte deste existiu uma enorme oferta de emprego. Do lado dos
cidadãos existiu (e existe) uma procura superior á oferta. Por sua vez estes,
os cidadãos, vêm no funcionalismo público uma reforma garantida e uma velhice
mais segura.
A
enorme procura de empregos na função pública assenta na posição de insegurança
em que se encontram as classes médias, ameaçadas pelas características das
transformações económicas, esforçando-se para dar aos seus filhos um futuro
seguro. Esta insegurança da classe média é história antiga, pois os componentes
desta classe são sempre inseguros.
Esta
figura da classe média (dos muitos pontos que estão no topo da curva de Gauss)
não é um exclusivo do capitalismo. Existiam, em menor numero nos sistemas
tributários pré-capitalistas e foram sempre amedrontados. Com o advento do
capitalismo jogaram dentro das novas regras e continuaram a ser médias. Foram
alimentadas por mais uns tantos sectores, uns em movimento ascendente e outros
em movimento descendente. No século XIX, com a revolução industrial, foram
ameaçados pelo Capital e pelo movimento operário. Liberalismo e socialismo
foram seus inimigos – embora disputassem o seu voto e a sua influência – e o
fascismo (ou qualquer coisa que assente em Deus, Pátria e Autoridade, com umas
lagrimazitas em torno da Família) o seu paraíso.
Para
estes sectores o estado é o grande protector. Para o Estado estes sectores
constituem o seu maior fornecedor de leais guardiões. Fica assim estabelecida a
Santa Aliança em torno da Burocracia.
Leituras
aconselhadas
Michels,
R. Para uma sociologia dos Partidos políticos na democracia moderna Ed.
Antigona, Lisboa, 2001
Weber,
M. The theory of social and economic organisatio Oxford University
Press, 2007
Weber,
M. Economy and Society University of California Press, 1978