terça-feira, 15 de dezembro de 2015

PORTUGAL "DÁ CARTAS" NA CORRUPÇÃO



A LISTA DA TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL

Dos 15 casos de corrupção colocados a votação, quatro têm ligações mais ou menos diretas a Portugal

Paulo Chitas - Visão

Confesso que fiquei boquiaberto quando soube da lista que a organização Transparency International colocou a votação. Chama-se Unmask the Corrupt (Desmascarar os Corruptos) e consta de 15 casos colocados a votação pela organização não-governamental que se apresenta como uma coligação global contra a corrupção. As situações foram escolhidas pela sua magnitude, pelo facto de os seus protagonistas há muito escaparem a qualquer tipo de punição e porque, segundo a organização, são os que mais se aproxima do conceito de “grande corrupção”.

A minha estranheza não advém da existência de corrupção no mundo mas do facto de quatro dos 15 casos terem ligações, diretas ou indiretas, a Portugal. Vejamo-los, com base na apresentação feita pela Transparência Internacional:

Teodoro Nguema Obiang – Filho do presidente da Guiné Equatorial, é apresentado como tendo riqueza que em muito ultrapassa as suas legítimas fontes de rendimento. Em 1988 foi nomeado pelo pai ministro da agricultura e das florestas e em 2012 segundo vice-presidente. Ações da justiça norte-americana e francesa resultaram na apreensão de bens nas suas mansões naqueles países, entre eles memorabilia de Michael Jackson. Embora seja um dos países mais ricos de África no que respeita a petróleo e recursos florestais, 75% da população da Guiné Equatorial, segundo o Banco Mundial, vive com menos de dois dólares por dia.

Em Janeiro de 2014, o Banif assinou um memorando de entendimento com as autoridades da Guiné Equatorial, que prometeram investir no banco moribundo. No mesmo ano, o país foi aceite como membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, embora não se fale português no território e apesar do triste currículo em relação à defesa dos direitos humanos. A entrada de 133,5 milhões de euros através da compra de uma participação realizada por uma empresa pública ou um fundo soberano da Guiné Equatorial, liga o regime diretamente à aquisição de um banco onde o Estado português tem a maioria do capital. Ou seja, o Estado português negoceia com um dos mais corruptos regimes de África. Luís Amado, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e defensor da adesão da Guiné Equatorial, é também o presidente do Conselho de Administração do Banif.

Petrobras – A apresentação é sucinta: o maior escândalo de corrupção do Brasil, que custou 2 mil milhões de euros em subornos e lavagem de dinheiro, envolvendo 50 políticos no activo, 18 empresas e provocando a perda de dezenas de milhares de empregos no país. O denunciante deste caso, Hermes Freitas Magnus, numa entrevista ao Público, afirmava preto no branco que o Banco Espírito Santo foi usado em esquemas de lavagem de dinheiro do caso que envolve a Petrobras. Ao Ministério Público português foi pedida colaboração por parte da Justiça brasileira para averiguar as ligações de empresas portuguesas e brasileiras ao processo Lava Jato.

Banco Espírito Santo – O parágrafo de abertura diz tudo. “Este conglomerado, um dos maiores em Portugal, alegadamente fez alianças muito pouco santas, estando a ser investigado por fraude, corrupção e lavagem de dinheiro”. A Transparência Internacional estima em 10 mil milhões de euros as perdas dos investidores e accionistas, e lembra que, antes do colapso, o grupo já havia sido investigado nos EUA, estava sob olho por causa de um banco detido na Líbia e havia alegações de envolvimento com o Caso Mensalão (corrupção de políticos no Brasil).

Isabel dos Santos – A filha mais velha de Eduardo dos Santos, o presidente de Angola, foi considerada pela Forbes a mulher mais rica de África, valendo 3,4 mil milhões de dólares. A organização lembra que tudo começou quando no colo da filha mais velha do Presidente de Angola caiu uma licença de telecomunicações sem que houvesse um concurso público. E até recorda que, numa entrevista aoFinantial Times, Isabel dos Santos negou favorecimento no processo que deu origem à sua fortuna, tendo-o considerado “justo”.

Na apresentação do caso, outros factos são relembrados. A aquisição da empresa de joalharia suíça De Grisogono; a compra através de subsidiárias registadas em paraísos fiscais de parte do capital da EFACEC (que deu origem a um pedido de investigação no Parlamento Europeu); as significativas participações na Zon, nos bancos BPI e BIC e na Galp. “O povo angolano pagou um preço elevado pela apropriação da presidência de recursos e receitas do Estado durante décadas”, conclui a organização, lembrando ainda o grupo de presos políticos de que faz parte Luaty Beirão, neste momento a ser julgado em Luanda.

Portugal representa 0,14% da população mundial e é apenas a 46ª economia do mundo – mas na corrupção dá cartas.

*Título PG

Portugal. Ana Gomes: “É inacreditável a complacência das autoridades portuguesas com a corrupção”



Quatro de 15 casos de corrupção mundiais passam por Portugal

No nosso país tem havido um grande descontrolo e assistimos à captura dos agentes políticos portugueses pelos mais diversos interesses”, nota Ana Gomes, 61 anos, eurodeputada socialista. A declaração vem a propósito da votação organizada pela Transparência Internacional sobre 15 casos de grande corrupção mundial, dos quais fazem parte dois que diretamente envolvem Portugal. Isabel dos Santos, filha do Presidente de Angola, e o caso BES/Ricardo Salgado, fazem parte do elenco, que inclui ainda o Lava Jato (corrupção na Petrobrás) e o regime da Guiné Equatorial, indirectamente relacionados com o nosso país. “Não é por acaso que Portugal é conhecido em Angola como a ‘lavandaria’”, ironiza a socialista que faz parte do Intergrupo Parlamentar para a Integridade e para a Transparência.

“Nem com a troika, que tinha o dever de monitorizar o Estado, a situação mudou. Houve uma negligência total para impedir a corrupção de grassar», nota a eurodeputada. O facto de Portugal ser uma pequena economia aberta e do país manter relações em muitas partes do mundo são características que, no seu entender, facilitam os fenómenos de corrupção. “E também por desígnio político”, sublinha, evocando o caso dos Vistos Gold, que não fazem parte da lista mas que foram a origem de um convite da Transparência Internacional para discursar na última grande reunião da ONG, na Malásia, em setembro deste ano. “Os programas de promoção do investimento existem em vários países europeus, mas em Portugal não há controlo, há laxismo”, nota.

Ana Gomes fez parte do grupo de cinco eurodeputados que escreveu cartas ao presidente do Grupo de Ação Financeira, à Comissão Europeia, aos Banco Central Europeu e à Autoridade Bancária Europeia a exigir uma investigação aos investimentos de Isabel dos Santos em empresas portuguesas. A compra de 65% da Efacec Power Solutions foi a pedra de toque da iniciativa dos eurodeputados, que chamavam a atenção para o facto de existirem “dúvidas legítimas” de que o Estado Angolano estivesse a financiar indiretamente “aquisições privadas da senhora Isabel dos Santos, incorrendo em inúmeras ilegalidades”. Na missiva enviada às entidades supervisoras e administrativas, os eurodeputados notavam ainda que Isabel dos Santos é uma Politically Exposed Person (Pessoa Exposta Politicamente), o que, segundo a regulação europeia anti-lavagem de dinheiro, obrigaria as entidades bancárias a averiguar a origem dos fundos usados na transacção. “É inacreditável a complacência das autoridades portuguesas, da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e do Banco de Portugal”, considera Ana Gomes.

Luís Amado, atualmente presidente do Conselho de Administração do Banif, é outro alvo da sua ira. “Ele não tem nenhum respaldo do PS para ser o ‘agenciador’ da Guiné Equatorial. Critiquei-o e continuarei a fazê-lo”, assegura a eurodeputada sobre o seu colega de partido e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do governo de José Sócrates.

A Guiné Equatorial, rico produtor de petróleo, é um pária internacional, por causa do desrespeito continuado dos Direitos Humanos e pela corrupção. No seu regime jurídico mantém-se a pena de morte (em relação à qual apenas existe uma moratória) e a língua portuguesa nem sequer era ali falada. A Guiné Equatorial é dirigida desde 1979 por Teodoro Obiang Nguema, que ainda em Novembro defendeu, no congresso do seu partido, que se devia “cortar os tendões dos pés” aos delinquentes para que estes pudessem ser mais facilmente identificados pela população.

O filho do líder da Guiné Equatorial, também ele Teodoro, faz parte da lista de 15 casos da Transparência Internacional. Nomeado pelo pai segundo vice-presidente do país, foi alvo de processos judiciais nos Estados Unidos da América e em França, onde propriedades e bens foram confiscados por receber subornos relacionados com investimentos no setor petrolífero do país. Em França, existem ainda acusações de lavagem de dinheiro.

Em 2014, soube-se que uma empresa estatal ou um fundo soberano do país pretendia investir 133 milhões de euros no Banif, banco onde a maioria do capital é, neste momento, do Estado Português. Luís Amado defendeu com unhas e dentes o memorando de entendimento entre o Banco e o regime guinéu-equatoriano, assegurando que o investimento estava a ser acompanhado pelas autoridades de supervisão portuguesas. Reconheceu ainda que fora nomeado presidente do Banco por ter sido ministro dos Negócios Estrangeiros, “pelo facto de conhecer o mundo” e pela experiência acumulada. "Creio que não há nenhum crime nisso. Ou há?", perguntava, ainda durante a entrevista que deu à Antena Um/Diário Económico.

Paulo Chitas – Visão – Foto: Tiago Miranda

CAMPO PETROLÍFERO KITAN, EM TIMOR-LESTE, CHEGA AO FIM DE VIDA ÚTIL



O campo petrolífero Kitan, um dos projetos da Zona Conjunta de Desenvolvimento Petrolífero (JPDA) no Mar de Timor, chegou ao fim da sua vida útil, indicou hoje fonte da empresa italiana ENI.

Citada pelo portal na Internet Platts, a fonte da empresa que é a maior acionista do campo indicou que, depois de janeiro, não haverá mais petróleo a partir do poço de Kitan, tendo-se esgotado "mais depressa do que se pensava", depois de ter produzido cerca de 60 milhões de barris.

O campo, proprietário de um consórcio entre a ENI (40% do capital), da japonesa Inpex Corporation (35%) e a Talisman Energy (25%) - comprada em maio de este ano pela espanhola Repsol -, foi descoberto em 2008 pela petrolífera italiana e produz desde outubro de 2011.

Localizado a cerca de 170 quilómetros de Timor-Leste, no Mar de Timor, o projeto está na zona gerida conjuntamente por Timor-Leste e pela Austrália, a JPDA, na sua sigla inglesa.

No orçamento de 2015 o Governo timorense previa para este ano receitas de 21,1 milhões de dólares, depois dos 13,8 milhões obtidos em 2014, tendo antecipado que 2016, com receitas previstas de 10,7 milhões de dólares, fosse o último em que o Kitan contribuiria para os cofres do Estado.

Ao longo de 2015, a ENI distribuiu um máximo de 550 mil barris de crude ultraleve em cada dois/três meses, abastecendo sobretudo os mercados do norte e sudeste da Ásia, nomeadamente a Coreia do Sul e a Tailândia.

No início deste mês, o portal Platts adiantou que a falta do crude ultraleve de Kitan irá ser compensada a partir de fevereiro pela plataforma North West Shelf, na Austrália, quando a empresa australiana que o explora exportar 1,95 milhões de barris.

Em março deste ano, a Inpex Corporation já tinha reduzido a produção e o valor do campo petrolífero, na sequência da queda do preço do crude e antevendo o fim de vida útil do poço.

"Foram realizados testes de imparidade em ativos relacionados com (...) o bloco JPDA06-105 na JPDA do Mar de Timor à luz da deterioração do contexto de mercado, com base em fatores como a queda dos preços do petróleo, o que resultou no reconhecimento de perdas de imparidade", referiu então a empresa.

Em Díli, o Governo timorense reconheceu, também em março, que o campo tem uma produção total "modesta", quando comparado com o de Bayu Undam, o que mais contribui para as receitas de Estado timorense.

JSD (ASP/JCS) // EL - Lusa

EURODEPUTADOS APROVAM ISENÇÃO DE VISTOS COM TIMOR-LESTE



O Parlamento Europeu aprovou hoje por larga maioria o acordo celebrado entre a União Europeia (UE) e Timor-Leste que prevê a isenção recíproca de vistos para estadas de curta duração.

Este acordo - que isenta de vistos os cidadãos europeus que se deslocam ao território de Timor-Leste e os cidadãos deste país que se deslocam à UE por um período máximo de 90 dias por cada período de 180 dias - é aplicado a título provisório desde 26 de maio deste ano, data em que foi assinado pelas partes.

O acordo foi aprovado por 581 votos a favor, 66 contra e 23 abstenções.

A isenção de visto aplica-se a todas as categorias de pessoas, independentemente da finalidade da viagem, com exceção das pessoas que viajem para efeitos do exercício de uma atividade remunerada.

"Este acordo de isenção de visto para as estadas de curta duração é o culminar do aprofundamento das relações entre a União Europeia e a República Democrática de Timor-Leste, revestindo-se de elevada importância política no quadro do Acordo de Cotonu, e constitui ainda um meio adicional para reforçar as relações económicas e culturais, bem como para intensificar o diálogo político sobre diversas questões, incluindo os direitos humanos e as liberdades fundamentais", disse a relatora da comissão parlamentar das Liberdades Cívicas, Justiça e Assuntos Internos, Mariya Gabriel.

"O turismo é, nomeadamente, um setor fundamental para o desenvolvimento de Timor-Leste, que poderá despertar o interesse dos cidadãos europeus, como turistas e como investidores", considerou ainda a eurodeputada búlgara.

Em 2014, a taxa de recusas de vistos Schengen a requerentes timorenses foi de apenas 4,5 por cento dos 773 pedidos de vistos de curta duração apresentados.

IG // APN - Lusa

Pelo menos sete mortos em incêndio durante tentativa de roubo num terminal de cereais em Maputo



Sete mortos e nove detidos é o balanço preliminar da tentativa de roubo de combustível que terminou num incêndio de grandes dimensões no domingo no Porto da Matola, disse hoje à Lusa o porta-voz da Polícia da República de Moçambique (PRM).
"Até agora, os dados que temos indicam que sete pessoas morreram em resultado do incêndio", disse Inácio Dina, admitindo a possibilidade de o número de vítimas aumentar nas próximas horas.

O fogo deflagrou durante a operação de descarga de trigo numa plataforma da Silos e Terminal Granuleiro da Matola, cerca das 04:00 de domingo, ao mesmo tempo que alegados assaltantes recorriam a um sistema de transporte de combustível já desativado mas que ainda se encontra ligado ao existente.

O comandante provincial da PRM na província de Maputo, Jeremias Machaieie, citado hoje pela Rádio Moçambique (RM), revelou que agentes da polícia moçambicana estão envolvidos na tentativa de roubo de combustível, acrescentando, sem avançar detalhes, que alguns deles estão entre nove pessoas já detidas.

"Estes dados [sete mortos] são referentes ao balanço preliminar, o que quer dizer que podem alterar", reiterou o porta-voz do comando da PRM.

A RM avança, por sua vez, que o número de vítimas mortais ascende a 14 e a televisão estatal fala de dezasseis.

O incêndio só ficou controlado ao fim de três horas, após a intervenção do Serviço Nacional de Salvação Pública e os corpos de bombeiros das empresas Mozal, Petromoc e Caminhos de Ferro de Moçambique.

Além da plataforma de descargas, o fogo destruiu duas viaturas e embarcações que estavam a ser usadas pelo grupo de assaltantes, que, segundo o ministro da Energia e Recursos Naturais, Pedro Couto, contaram com a ajuda de trabalhadores do Porto da Matola.

Pedro Couto, que se deslocou no domingo ao local do incidente, disse que os prejuízos estão a ser avaliados, dando conta de que os navios de transporte de cereais terão agora de recorrer aos portos da Beira e de Maputo.

O governante assegurou ainda que, apesar da destruição desta infraestrutura, o abastecimento de cereais não está comprometido durante a quadra de Natal.

EYAC (HB) // VM - Lusa

Parlamento moçambicano rejeita proposta de despartidarização do Estado



A Assembleia da República de Moçambique rejeitou hoje um projeto de lei sobre a despartidarização do Estado, submetido pelo MDM (Movimento Democrático de Moçambique), terceira força parlamentar.

A proposta foi rejeitada pela maioria da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) e também pela bancada da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), maior partido de oposição, com um total de 200 votos, e 16 a favor do MDM.

Com o projeto, a terceira fora política pretendia punir até um ano de prisão, multas até seis vezes o salário mínimo e perda do posto de trabalho para quem se aproveitasse do Estado para realizar ações partidárias.

O MDM mantém entre as suas principais "bandeiras políticas" o fim do que alega ser uma apropriação das estruturas do Estado pelo partido maioritário e, com esta medida, além das punições, pretendia determinar o fim da utilização de edifícios e meios estatais para fins partidários, bem como da perseguição a pessoas pelas suas preferências políticas.

O projeto preconizava ainda proibir membros das forças de defesa e segurança de participação em ações partidárias e o uso de símbolos de forças políticas em eventos do Estado, além de vincular o aparelho estatal a escolhas feitas com base no mérito e profissionalismo.

"Queremos libertar o Estado das amarras dos partidos políticos", disse o deputado do MDM José de Sousa, na declaração de voto da sua força política.

No entanto, antes da votação, a primeira Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade já indicara que projeto "não apresenta nada de relevante e de novo no ordenamento jurídico" moçambicano.

"É uma proposta redundante sobre matérias suficientemente reguladas em legislação em vigor", disse Edson Macuácua, presidente da comissão parlamentar e deputado da Frelimo.

Também a Renamo se distanciou do MDM, considerando que o projeto de lei é uma tentativa de esvaziar uma discussão já iniciada nas negociações de longo-prazo entre Governo e o maior partido da oposição, com vista à estabilidade em Moçambique.

Esta proposta "é um oportunismo político exacerbado", acusou António Muchanga, deputado e porta-voz da Renamo, cujo partido interrompeu entretanto as negociações de longo-prazo com o Governo e que, além do desarmamento da oposição, implicava também a despartidarização do Estado.

As duas partes chegaram a atingir um acordo sobre este assunto mas o documento nunca foi levado ao parlamento para ganhar força de lei.
HB // EL - Lusa

Angola. PRISÃO DOMICILIÁRIA BASEADA NUMA LEI QUE AINDA NÃO ESTÁ EM VIGOR



O julgamento dos 15+2 activistas continua fértil em casos sui-generis, sendo o ocorrido hoje digno de figurar no “Guinness Book of Records” da bestialidade judicial. Assim, vão deixar a cadeia e ficar em prisão domiciliária na próxima sexta-feira, dia 18, por decisão do juiz Januário Domingos, baseada numa lei que ainda não está em vigor.

De facto, a musculatura exibida pela diligente representante do Ministério Público, Isabel Fançony, ao solicitar a prisão do advogado Walter Tondela por este ter interpelado o juiz, Januário Domingos, é prova disso.

O juiz recusou-se, inicialmente, a conceder a palavra aos advogados de defesa para que estes se pronunciassem em relação a um requerimento interposto pela própria procuradora, solicitando a alteração da condição carcerária dos arguidos, para a partir do dia 18.12 (sexta-feira) passarem a condição de prisão domiciliária, mas com fundamento numa nova Lei n.º 25/15 de 18 de Setembro, Lei das Medidas Cautelares.

O quiproquó começou precisamente quando o juiz admite o requerimento da magistrada e concede um despacho favorável, “esquecendo-se” que a mesma Lei ainda não entrou em vigor, facto que só ocorrerá no próximo dia 18.

“Meritíssimo como se pode despachar favoravelmente, hoje (15.12), sobre uma lei que ainda não entrou em vigor”?, questionou o advogado, na convicção (ingénua) de que na barra dos tribunais a linguagem é a do Direito.

Ledo engano. Aqui, a lei que impera é da força ditatorial partidocrata e da bestialidade jurídica, que mutilando descaradamente o Direito, não augura a busca da justiça.

Recorde-se que que os tribunais angolanos vão poder passar a aplicar, a partir de 18 de Dezembro, a prisão domiciliária em alternativa à prisão preventiva, no âmbito da nova legislação de medidas cautelares que introduz também a figura do juiz de turno.

As medidas constam do novo Regime Jurídico das Medidas Cautelares em Processo Penal e das Revistas, Buscas e Apreensões, que foi apresentado no dia 23 de Novembro, em Luanda, a juízes, investigadores e procuradores do Ministério Público e que harmoniza a aplicação da prisão preventiva durante a fase de instrução.

De acordo com o director-nacional de Política de Justiça, Pedro Filipe, a nova lei passa a definir prazos “muito concretos” da aplicação da prisão preventiva, algo que até agora não acontecia, nomeadamente pelas sucessivas prorrogações (45 dias) permitidas.

De acordo com a explicação do responsável, a prisão preventiva passa a prever o limite de quatro meses na fase de instrução preparatória e mais dois meses na fase judicial, nos crimes comuns. Além disso, não pode ser aplicada a mulheres grávidas a partir de seis meses de gestão ou cidadãos maiores de 65 anos com complicações de saúde.

“É um pendor muito mais humanista da lei, mais preocupado com a protecção os direitos e das garantias do arguido, sem querer retirar a eficácia dos órgãos judiciais como um todo”, indicou.

Um dos objectivos da nova lei, referiu ainda Pedro Filipe, é limitar a aplicação da prisão preventiva em Angola, para que apenas possa ser decretada nos casos mais graves.

“Para isso, passamos a ter alternativas, como a prisão domiciliária, a restrição de saída do território nacional, o termo de identidade e residência ou o caso do pagamento de uma caução económica”, explicou o director-nacional de Política de Justiça.

Uma “grande inovação” da nova lei é a introdução do juiz de turno, em todos os tribunais do país, com a possibilidade de “reapreciar” – a pedido do arguido – as medidas de coacção aplicadas pelo Ministério Público, ainda na fase de instrução preparatória.

“Para, num prazo máximo de cinco dias, se pronunciar sobre a manutenção ou alteração da medida cautelar imposta”, sublinhou Pedro Filipe.

A introdução da aplicação da prisão domiciliária como uma alternativa à prisão preventiva constitui outra novidade desta legislação, que vem substituir a actual lei da prisão preventiva, em vigor até 17 de Dezembro.

“É um elemento completamente novo, em que vai ser possível a pessoa estar privada da liberdade, mas estando em sua casa, apenas com o impedimento de não poder abandonar porque está sob vigilância policial ou por meios electrónicos”, explicou o procurador-geral adjunto da República de Angola, Pascoal António Joaquim.

Com isto, acrescentou, pretende-se que a prisão preventiva durante o processo instrutório funcione como “última medida”.

Na altura, questionado pela Lusa, não se comprometeu com a possibilidade de o Ministério Público propor a prisão domiciliária como medida cautelar já a partir do dia 18 de Dezembro.

“Quanto à aplicação da medida, tem-se estado a fazer arranjos [técnicos]. Talvez não, talvez sim. É uma questão que vamos ver, mas é uma medida de coacção que vigora a partir dessa dada e é passível de ser aplicada”, apontou.

Folha 8

Angola. Presos políticos. SEDRICK TENTA SUICÍDIO




O activista e jornalista do Folha, Sedrick de Carvalho, tentou hoje suicidar-se no Hospital-Prisão de São Paulo, onde se encontra detido desde 20 de Julho. A confirmação foi avançada há momentos pela mãe, Antónia de Carvalho, que foi atendida também por psicólogos e advogados. A mãe teme que o filho tente o suicídio outra vez, mas, por agora, desconhece-se se as autoridades tomaram medidas para evitar que tal venha a suceder.

Logo pela manhã, Sedrick de Carvalho garantiu que vai levar a greve de fome até à morte e recusou-se a sair da cela e a receber visitas, inclusive da esposa e filha.

Numa carta redigida no Hospital-Prisão de Luanda, Sedrick de Carvalho enumera o que considera “contantes abusos e violações de direitos humanos que se registam há cinco meses” contra a sua pessoa e diz que se recusa a “sair da cela” em que se encontra, “não importando o objectivo e propósitos apresentados, ao menos que seja forçosamente, como aliás é hábito agirem de tal forma”.

O nosso colega recusa-se também “a receber toda e qualquer visita”, pelo que diz lamentar os esforços que a família, “esposa, filhinha, pais e irmãos, certamente farão para que recue desta decisão”.

Sedrick de Carvalho nega-se, inclusive, a beber água e radicaliza a sua posição na carta ao concluir que poderá optar pelo suicídio porque, diz, “estou cansado desta palhaçada”.

Na carta que termina com a frase “a ditadura continua a vencer, infelizmente”, Sedrick de Carvalho autoriza e recomenda ao juiz Januário Domingos José a condená-lo, “mesmo sendo eu inocente”, porque não acredita “em decisão contrária em ditadura”.

No documento de três páginas dirigido à sociedade angolana, Serviços Prisionais, Tribunal Provincial de Luanda, imprensa e família, o jornalista detido a 20 de Junho com mais 14 activistas, acusa as autoridades de tentativas de provocar o seu desequilíbrio mental, “com práticas de torturas milimetricamente orientadas e executadas rigorosamente por aqueles que têm a missão legal e humana de cuidar e atestar a nossa sanidade mental”.

Sedrick de Carvalho cita ainda a “ininterrupta humilhação e desrespeito” às famílias que, “mesmo decididas a contribuírem para a criação da Nação Angolana, foram e continuam a ser injustiçadas por se lhes retirarem o filho, esposo, pai, irmão e garante da sustentabilidade económica e estabilidade psico-emocional”.

Uma “palhaçada” é como aquele activista classifica o que acontece “em pleno julgamento da ditadura contra a democracia, onde os magistrados escondem o rosto mas não a vergonha, onde aprovam e aplaudem as agressões físicas que acontecem no tribunal, ou ainda onde se reconhece que não leram, durante os cinco meses, os livros que para a ditadura são proibidos”.

Refira-se que, além de Sedrick de Carvalho, estão em greve de fome Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Albano Binbo Bingo, Mbana Hamza e Nélson Dibango.

Nesta segunda-feira, foi retomado o julgamento dos 17 activistas.

Osvaldo Caholo continua a ser ouvido e, depois dele, dever ser Rosa Conde que, juntamente com Laurinda Gouveia, está em liberdade.

Folha 8 - ontem

Chefes da Missão da ONU preocupados com “falta de estabilidade duradoura” na Guiné-Bissau



Os chefes de missão das Nações Unidas na África Ocidental estão preocupados com a falta de garantias de uma “estabilidade duradoura” na Guiné-Bissau, anunciaram hoje em comunicado.

Os dirigentes “manifestaram preocupação com a ausência de um clima de estabilidade duradoura na Guiné-Bissau, apesar das elevadas expectativas que se seguiram à restauração da ordem constitucional” com as eleições de 2014.

O comunicado surge na sequência de uma reunião dos responsáveis pela presença da ONU na sub-região, encontro realizado na sexta-feira, em Abidjan, Costa do Marfim.

Os chefes de missão exortaram os atores políticos e institucionais da Guiné-Bissau a estabelecerem vias de diálogo, “a fim de criar um ambiente propício para a execução do programa de desenvolvimento do país”.

O Governo eleito em 2014 angariou mil milhões de intenções de apoio numa mesa redonda de doadores realizada em março, em Bruxelas, mas em agosto o Presidente da República demitiu o Executivo e a crise política travou a expetativa internacional.

Uma nova equipa governamental foi empossada em outubro para dar continuidade à estratégia de desenvolvimento.

O programa de Governo e o Orçamento Geral do Estado para 2016 vão ser votados na Assembleia Nacional Popular nas próximas semanas.

A reunião de chefes de missão da ONU realiza-se duas vezes por ano para rever o progresso na implementação dos respectivos mandatos na região, reforçar a coordenação e enfrentar os desafios comuns em matéria de eleições, segurança, crime organizado e extremismo violento.

Lusa, em O Democrata

CENAS DE PUGILATO ENTRE DEPUTADOS NO PARLAMENTO DA GUINÉ-BISSAU



O parlamento guineense foi hoje ringue de boxe. Houve pugilato entre deputados. Começaram a agredir-se dentro do parlamento e acabaram o round final no exterior do edifício do parlamento.

O jornalista guineense António Aly Silva, em exclusivo do Ditadura do Consenso, narra o sucedido da desavença entre os dois deputados:

“Braima Câmara, deputado do PAIGC, aliado do PR JOMAV, e Vitor Mandinga, deputado do PCD, passaram das palavras (para não dizer insultos) aos actos. Os dois chegaram a vias de facto dentro do hemiciclo, num momento quente e conturbado com a discussão do programa de Governo.”

Refere Aly Silva que “no calor do debate, Braima Camara, de acordo com a nossa fonte, acusou Vitor Mandinga de ter "derrubado o Governo de Carlos Gomes Jr., contra a vontade de todos." E garantiu: "Agora, sou eu (Braima Camara) que vou derrubar o Governo do Carlos Correia!".

"Houve socos, houve pontapés, quase houve cabeçadas", contou a mesma fonte ao DC. Depois, as cenas de pugilato "continuaram já fora do hemiciclo"
, como narra Aly Silva no Ditadura do Consenso.

Redação PG – Na foto: os deputados litigantes 

ASSIM SE PREPARA UMA NOVA GUERRA MUNDIAL



França, Grã-Bretanha e Alemanha, além dos EUA, ampliam intervenção no Oriente Médio. Seu alvo principal não é o ISIS, mas a Rússia. Oposição popular ao conflito é solenemente ignorada

Joseph Kishore, do World Socialist Website – Outras Palavras -Tradução Vila Vudu

Os eventos da semana passada passarão à história como divisor de águas na constituição do imperialismo no século XXI. No período de poucos dias, EUA, Grã-Bretanha e Alemanha ampliaram o respectivo envolvimento militar na Síria, depois que a França intensificou sua campanha de bombardeio no mês passado.

O pretexto para essas operações são os ataques terroristas de 13 de novembro em Paris, seguido agora pelo horrendo ataque a tiros em San Bernardino, Califórnia, na 4ª-feira passada. As razões declaradas publicamente, contudo, pouco têm a ver com discussões estratégicas que estão acontecendo nos escalões superiores das forças militares e das agências de inteligência.

Por trágica que seja a matança de 130 pessoas em Paris e 14 em San Bernardino, não explicam a repentina convulsiva escalada militar das principais potências imperialistas, contra o Oriente Médio. Não é difícil ver semelhanças/diferenças em relação a 1915, quando os EUA recusaram-se a entrar na 1ª Guerra Mundial, mesmo depois do afundamento do RMS Lusitania, com perda de 1.198 vidas. Naquele momento, a classe capitalista norte-americana ainda estava dividida sobre se seria aconselhável intervir na então chamada “Grande Guerra” (que só passou a ser chamada “primeira guerra mundial”, depois que houve a segunda).

A força básica por trás da guerra na Síria é a mesma que motivou a formatação imperialista de todo o Oriente Médio: os interesses do capital financeiro internacional. As grandes potências imperialistas sabem que, se quiserem pôr a mão no butim, têm também de fazer sua parte da matança.

Esse movimento de guerra no Oriente Médio é altamente impopular, o que explica o frenesi para utilizar os ataques recentes na Europa, além da atmosfera de medo que a mídia-empresa cria e infla, para ativar as ações o mais rapidamente possível. Considerem-se os eventos da semana passada:

Na 3ª-feira, o governo Obama anunciou que estaria enviando novo contingente de Forças de Operações Especiais, oficialmente contra o Estado Islâmico no Iraque e Levante [ing. ISIL] e/ou Síria [ing. ISIS]. Em conferência de imprensa no mesmo dia, Obama repetiu que qualquer acordo na Síria terá de incluir a derrubada do presidente Assad da Síria, aliado chave da Rússia.

Na 4ª-feira, o parlamento britânico aprovou apoio a ação militar na Síria, depois de o líder do Partido Labour, Jeremy Corbyn, desimpediu qualquer caminho rumo à guerra, ao aceitar “livre votação” sobre o tema, para os deputados de seu partido. Aviões britânicos decolaram imediatamente para bombardear alguns alvos na Síria já na 4ª-feira à noite, com o primeiro-ministro Cameron declarando “simpatizante de terroristas” quem se opusesse à guerra.

Na 6ª-feira, o parlamento alemão correu a aprovar moção para que a Alemanha também se juntasse à guerra contra a Síria, praticamente sem nem discutir a questão. A aprovação parlamentar ao envolvimento da Alemanha na guerra veio depois da decisão do governo Merkel, no início da semana, de enviar 1.200 soldados, seis jatos Tornado e um navio de guerra para a região.

E então, durante o fim de semana, a mídia-empresa nos EUA e todos os políticos doestablishment dedicaram-se a explorar o tiroteio em San Bernardino, Califórnia, para pressionar a favor da expansão da guerra no Oriente Médio. Os candidatos Republicanos à presidência dispararam ‘declarações’ beligerantes insistindo em que os EUA estariam diante da “próxima guerra mundial” (governado de New Jersey, Chris Christie); que “o país precisa de presidente para tempos de guerra” (senador Ted Cruz, do Texas), e que “eles declararam guerra contra nós e nós temos de declarar guerra contra eles” (ex-governador da Flórida, Jeb Bush).

Em discurso no domingo à noite, Obama defendeu, contra os críticos Republicanos, a própria política na Síria; repetiu que se opõe ao envio massivo de soldados de solo para a área de Iraque e Síria, e que é a favor de acelerar os ataques aéreos; o financiamento para grupos dentro da Síria; e o uso de tropas de países vizinhos. Elogiou os movimentos de França, Alemanha e Reino Unido, e declarou: “Desde os ataques em Paris [dia 13/11], nossos mais próximos aliados (…) aceleraram a contribuição deles à nossa campanha militar, que nos ajudará a acelerar nossos esforços para destruir oISIL.”

Por mais que pressionem e pressionem a favor de mais guerra, nem Obama nem qualquer outro setor do establishment político nos EUA diz sequer uma palavra sobre as raízes reais do ISIS, que já serviu de pretexto para a “guerra ao terror” a partir do qual começou, e nunca mais se alterou, a política externa dos EUA para 15 anos.

No discurso de domingo, Obama fez uma referência oblíqua ao crescimento do ISIS “em pleno caos da guerra do Iraque e depois na Síria” – como se nada tivesse a ver com a própria política dos EUA. A verdade é que EUA e aliados é que ocuparam (ilegalmente) e devastaram (consequentemente) o Iraque, e na sequência criaram e ou inflaram grupos de islamistas fundamentalistas na Síria, a partir dos quais o ISIS emergiu como cabeça de ponte da guerra contra o presidente Bashar al-Assad da Síria.

Os terroristas do ISIS que executaram os atentados em Paris puderam viajar livremente, entrando e saindo da Síria, porque milhares de jovens como eles viajavam da Europa para a Síria, livremente, e com o apoio de autoridades, para que se unissem ao golpe e à guerra contra Assad.

Quanto ao ataque em San Bernardino, funcionários citaram a viagem dos dois atiradores à Arábia Saudita e seus contatos com indivíduos da Frente Al-Nusra, para poderem referir-se ao tiroteio como ataque terrorista. A Arábia Saudita, centro de financiamento e apoio para os grupos fundamentalistas islamistas em todo o Oriente Médio, é aliada chave dos EUA na região, e a Frente Al-Nusra, afiliada da Al-Qaeda, é aliada de factodos EUA na Síria.

Em vez de resposta contra os ataques recentes, as ações das potências imperialistas são a realização de planos já existentes e de ambições já conhecidas há muito tempo.

Na Grã-Bretanha, votação dessa semana reverteu a decisão de 2013, da Câmara de Comuns, segundo a qual o país não participaria de guerra planejada e liderada pelos EUA contra a presidência da Síria. A elite governante alemã não para de ‘exigir’ que o país participe mais ativamente do avanço militar na Síria, para afirmar a própria posição como potência dominante na Europa.

Nos EUA, antes dos ataques em San Bernardino, ouviam-se vozes insistentes doestablishment político e da mídia-empresa a favor do envio de tropas de solo e da imposição de uma zona aérea de exclusão sobre a Síria.

Com os EUA à frente, as potências imperialistas já se engajaram numa guerra infinita, centrada no Oriente Médio e Ásia Central, já há um quarto de século. Mais de um milhão de pessoas já foram mortas e outros muitos milhões foram convertidos em refugiados. Depois das guerras no Afeganistão e no Iraque durante o governo Bush, Obama supervisionou a guerra na Líbia e as campanhas conduzidas pela CIApara mudança de regime na Ucrânia e na Síria. As consequências desastrosas de cada operação prepararam o terreno para que o governo Obama expandisse e intensificasse a guerra.

O que se vê hoje é uma reformatação para recolonização do mundo. Todas as velhas potências levantam-se, exigindo a parte de cada uma no neobutim. Embora hoje centrado no Oriente Médio rico em petróleo, o conflito na Síria já se vai convertendo em ‘guerra por procuração’ contra a Rússia. Do outro lado da massa de terra eurasiana, os EUA dedicam-se a ações cada vez mais provocativas contra a China no Mar do Sul da China.

A situação geopolítica é hoje mais explosiva que em qualquer outro momento anterior, desde as vésperas da 2ª Guerra Mundial. Acossada por crise econômica e social para a qual a classe das elites governantes não tem resposta progressista a oferecer, aquela classe das sempre mesmas elites cada vez mais recorre à guerra e ao saque, como a única resposta que conhecem para quaisquer das suas dificuldades.

O LABORATÓRIO AFRICOM – XI




Em Setembro de 2003 escrevi para o Angolense dois textos sobre São Tomé e Príncipe, na sequência do que havia escrito em 2002, que foi publicado pelo “Actual”, (o “USS São Tomé”).

A 15 de Setembro de 2003 o minúsculo arquipélago do Golfo da Guiné estava a ser tocado pela“cenoura” de George W. Bush e fervilhava nas expectativas que a exploração do petróleo lhe trazia, projectando-o desde logo numa espécie de Diego Garcia para o Golfo da Guiné…

Nunca antes os sonhos sacudiram aquele pacato povo como então e isso permite-nos observar como actua a hegemonia unipolar e seu arsenal de argumentos, onde quer que instale seus interesses.

O desequilíbrio súbito que isso provoca não poupou São Tomé e Príncipe tornando a “hora de Bush” numa “hora dos búfalos”, enquanto as expectativas foram pouco a pouco desvanecendo-se, à medida que se tornaria incomportável a exploração do petróleo “offshore” a grandes profundidades, em função dos elevados custos que isso implica, face à queda dos preços que viriam a ocorrer.

Em 2003 houve a aproximação de São Tomé e Príncipe à Nigéria, sua vizinha a norte e por tabela interessada no “offshore” comum.

Em 2002 e 2003 todavia não sendo possível prever essa queda de preços, a administração de George W. Bush agitava a “cenoura” com os olhos postos em toda a região, justificando desse modo o balanço para o lançamento da iniciativa do Laboratório AFRICOM.

SÃO TOMÉ – A HORA DE BUSH

O micro cosmos que constitui São Tomé e Príncipe tem sido alvo de atenção de muitos observadores sobre os assuntos africanos pelas mais diversas razões.

Na parte que nos cabe, para além das afinidades histórico-culturais-sociais com Angola, o facto de São Tomé e Príncipe estar a sair do “ciclo do café e do cacau” para o “ciclo do petróleo” justifica o nosso maior interesse, até por que essa mudança ocorre no momento em que os contemporâneos métodos e processos de globalização se assumem inexoravelmente por todo o Planeta, com todos os artifícios e manipulações que cada vez mais acarretam, incluindo os seus medos e fantasmas.

Uma das questões mais pertinentes para os observadores que se debrucem sobre os assuntos que se prendem com o arquipélago parece ser a de avaliar até que ponto os impactos próprios dos avanços desses métodos e processos que caracterizam a globalização, impostos fundamentalmente pelas actividades das grandes potências e dos grandes conglomerados financeiro-industriais, estão já a repercutir sobre aquele pequeno país, através das questões que envolvem a exploração do petróleo no Golfo da Guiné, não sendo esse o único veículo de relacionamento para com aquele micro cosmos.

Se antes, durante o relativamente longo “ciclo do café e do cacau”, o território insular se tornou num País periférico, pouco representativo até entre os produtores daquela riqueza natural, sujeito às vicissitudes dum mercado que criou dependência, inclusive na regulação dos preços praticados em relação àquelas matérias-primas, agora com o “ciclo do petróleo”, é precisamente na altura em que a produção mundial do “crude” está a atingir o máximo da escala prevista (o chamado “pico de Hubbert”), que as ilhas vão assumir as primeiras experiências no ramo, pondo fim a uma época em que um romantismo de pinceladas coloniais marcou a sua geografia física e humana, tal como o seu meio acabrunhado isolamento.

Os impactos são aliás evidentes em todo o Golfo da Guiné alterando profundamente a conjuntura externa e a regional, pelo que São Tomé e Príncipe deixou de ser aquele paraíso terrestre, quase ignoto , vegetando sem remédio no subdesenvolvimento crónico, onde à marca indelével do tráfico de escravos e do prolongado colonialismo português que vigoraram praticamente desde a descoberta e povoamento das ilhas até quase ao final do século XX, nem com a independência houve capacidade para fazer alterar para melhor os padrões de vida do seu povo.

Aparentemente não é o “ciclo do petróleo” que poderá pôr fim a esse subdesenvolvimento crónico, mas é ele que, contribuindo para evoluir a conjuntura externa e regional, se reflecte inusitadamente na conjuntura interna do País, mexendo psicológica e politicamente com toda a sociedade, quanto mais não seja pelas expectativas que gere.

Após a independência a vida política parecia fluir placidamente, a um ritmo com aparência de ser puxado por um motor a dois tempos, a cadência tropical da exploração do café, do cacau e pouco mais, o que tinha a ver ainda com o isolamento físico-geográfico, quer durante o período de regime de partido único, quer na altura do início do multi-partidarismo.

As tensões sociais gravitavam como lava dum pequeno vulcão adormecido, provavelmente meio anémico e palúdico, surda e subterraneamente, mantendo-se a emigração como a válvula para se escapar dum labirinto que não permitia melhor solução de vida, apesar do paraíso que as ilhas constituem.

A partir do momento porém que a palavra “petróleo” passou a ecoar no léxico comum, mudou a atitude psicológica das pessoas, o seu projecto comum e especialmente a sua atitude em relação a um futuro próximo que para muitos é inadiável, apesar do facto de não se terem ainda iniciado quaisquer trabalhos de exploração do “crude” que tenham acarretado benefício directo para o país.

A partir desse momento a pressão interior, sempre condicionada pelo marasmo em que haviam caído as ilhas gerações e gerações de são-tomenses, passou a vir ao de cima, agitando as pessoas, a sociedade, as instituições e a política.

A essa efervescência, a efervescência própria dum cadinho ao longínquo jeito dum novo e mirabolante “far West” que foi condicionando a atitude psicológica, social e política interna, juntou-se a atenção que o arquipélago passou a ter para as grandes potências, particularmente os Estados Unidos, com a ascensão da administração Bush e a França segundo uma presença tradicional, como a nível de seus vizinhos na região e até um pouco mais afastados.

Dadas as características próprias dos processos e métodos da globalização nos termos em que ela se realiza, os Estados Unidos, nomeadamente a administração Bush, ao privilegiarem as estratégias relacionadas com os assuntos energéticos e particularmente com a exploração e mercado do petróleo, passaram a conferir a São Tomé e Príncipe uma atenção ainda maior, sintomaticamente na mesma altura em que a palavra “petróleo” foi cada vez mais repercutindo no horizonte do país.

Para a potência hegemónica o micro cosmos ilhéu perdido no meio do Golfo da Guiné, valorizava-se não só pelas suas potencialidades petrolíferas aparentemente disponíveis, mas pelo significado geo estratégico do arquipélago em relação a todos os principais poços produtores do “crude”dispersos pela região circundante, em particular na plataforma “offshore” e numa altura em que as disputas internacionais no acesso a eles tendem a crescer, com todos os riscos que a situação declarada pela administração Bush de “guerra ao terrorismo”, comporta.

É legítimo procurar avaliar no meio desta atmosfera e expectativa que têm sido criadas, se em função das prioridades estratégicas de segurança da potência hegemónica será mais importante a exploração de petróleo do que a rentabilização da potencialidade geo estratégica de São Tomé em benefício dos Estados Unidos em relação a todo o Golfo da Guiné, tanto mais legítimo quanto o adormecido vulcão dá sinais de estremecer e começar a alterar a sua própria conjuntura interna a um ritmo e segundo processos e métodos nunca antes tão profundamente experimentados e sentidos.

Seguindo essa linha de pensamento, não são só as instituições que compõem o que ultimamente se está a convencionar chamar “a sociedade civil” que deverão estar na mira dos observadores mais atentos, mas sobretudo as instituições militares e militarizadas, por muito pouco importância que aparentemente os seus respectivos países detenham.

Há cerca de dez anos a esta parte, imediatamente antes do início do “ciclo do petróleo”, só os analistas mais temperados, levando em conta o estudo multi sectorial dos vários componentes por onde flui a globalização e arriscando as nuvens próprias duma futurologia, poderiam fazer prever o valor de São Tomé e Príncipe enquanto plataforma e ponto de apoio particularmente do interesse da potência hegemónica que melhores garantias poderia oferecer, a fim de ali poder instalar uma parte dum sistema de inteligência vocacionado para a segurança das instalações e interesses petrolíferos no Golfo da Guiné, bem como alguns meios de intervenção, por esforço directo ou de terceira bandeira (incluindo “por procuração”).

Desse modo e nessa altura, muito poucos ou nenhuns eram capazes de definir as eventuais mudanças nos contornos dos relacionamentos do então governo do MLSTP, prevenindo a instalação de novos condicionalismos psicológicos, sociais, políticos, institucionais, económicos e financeiros, a roçar o limiar da ingerência subtil e contínua nos novos moldes em que isso actualmente parece estar já a suceder de há cerda de um ano a esta parte.

Quando alguns sinais foram sendo do conhecimento público muitos desses analistas da região parecem ter levado de-ânimo-leve as evidências duma nova conjuntura política lançada pela administração Bush que iria inevitavelmente acarretar para toda a região e África Sub Sahariana no quadro da “African Oil Policy Initiative Group”, particularizada em relação a São Tomé e Príncipe quando o seu Presidente, Fradique de Menezes visitou os Estados Unidos a 14 de Maio de 2002 e foi recebido pelas mais altas entidades governamentais encarregues da política americana para África, como Walter Kansteiner e pelo “Corporate Council on Africa”, tendo a Exxon Petroleum, a Phillips Petroleum e a Annadarko Petroleum como principais anfitriões.

Muito provavelmente não puderam avaliar o peso das estimativas que foram postas a circular pelos geólogos do Colégio Imperial de Londres que apontam para os 156.000 km2 do “offshore” a existência de 4 mil milhões de barris de petróleo a explorar numa vintena de poços, o suficiente para Washington começar a pensar em ir progressivamente abandonando a Arábia Saudita, em proveito dos esforços de exploração no Golfo da Guiné.

Por outro lado a maior parte dos analistas africanos poucas referências têm tido sobre a actuação e o desenvolvimento de cobertura global do ECHELON e, sincronizadamente, a contínua expansão do conceito dos “Forward Operating Locations” (“Postos Avançados de Operações”), combinando a vinculação Americana-Britânica numa nova ordem de batalha para fazer frente ao que é designado como “terrorismo”, pelas estruturas dominantes.

 A 24 de Julho de 2002, notícias veiculadas pelo correspondente da VOA junto do Pentágono e citando Theresa Whelan, directora do Gabinete do Pentágono para os Assuntos Africanos, aproveitando uma visita do General Carlton Fullford a São Tomé referia o interesse dos Estados Unidos em procurar formar as mini Forças Armadas do país tendo em conta a actividade naval, ainda que viesse a mesma entidade a negar que os Estados Unidos estivessem interessados na implantação duma Base Naval sob sua própria bandeira, conforme o “Jeunne Afrique l’Inteligent”nº 2174 com data de 9 a 15 de Setembro de 2002.

Como que por osmose e sintomaticamente, desde praticamente o início da governação do Presidente Fradique de Menezes que as tensões de ordem social e política foram ganhando outra intensidade por dentro das instituições são-tomenses e muitas vezes passaram ao domínio público, culminando com o mascarado golpe de teatro duma convulsão militar, pintado “tanto quanto bastasse” de golpe de estado, apesar do governo de “Maria da Esperança Renovada”, conforme o Presidente chamou à Chefe do oitavo governo do país.

Não há qualquer possibilidade de dúvida sobre o facto de que as tensões e conflitos internos foram alastrando e, pelo menos em alguns casos, impondo impactos negativos de lesa “democracia” em São Tomé e Príncipe, particularmente após os acontecimentos do 11 de Setembro de 2001 e a veiculação pela opinião pública ao serviço da administração Bush, dos conceitos formulados pelo“think tank” de Jerusalém, “IASPS”, (“Institute for Advanced Strategic and Political Studies”) em relação à alternativa para a exploração de petróleo que constituiu os países do Golfo da Guiné, bem como isso está a mexer com os serviços de inteligência americanos, de seus principais aliados e com as questões que se prendem com o desencadear dos métodos e processos de segurança estratégica naquelas região.

Também parece não haver dúvidas que a tendência da direita e extrema-direita em se manifestarem com outros argumentos e peso político, ainda que a partir de estatutos por vezes quase marginalizados e sem linha histórica institucionalizada, se pode verificar também no micro cosmos que constitui São Tomé e Príncipe, aferindo-se um pouco às características do que estabeleceu a própria administração Bush.

Mapas:
- Zona de interesse comum na exploração de petróleo entre a Nigéria e São Tomé e Príncipe; 
- Zona Económica Exclusiva de São Tomé e Príncipe com o “offshore” da exploração de petróleo;

Foto:
- Primeiros contactos entre as Marinhas de Guerra dos Estados Unidos e de São Tomé e Príncipe.

EM FASE TERMINAL



Jorge Bateira [*]

Nos dias que correm, o chamado "projecto europeu" assemelha-se a um barco no meio da tempestade metendo água por todos os lados. Alguns dos seus mais acérrimos defensores estão tão desmoralizados que, pelo que escrevem, mais parecem adversários da "construção europeia". A título de exemplo: "Com uma união monetária que estiola no Sul. Com Schengen agonizante no Centro e no Leste, o projeto europeu transformou-se num trágico nó górdio, à espera de um génio que o desate ou, o que é mais provável, de um(a) louco(a) capaz de erguer a espada que o corte. Sem olhar às terríveis consequências que se lhe seguirão." (Viriato Soromenho Marques, DN - 7 Dez. 2015). De facto, para grande pesar dos europeístas de todos os quadrantes, o barco está mesmo afundar e não é preciso ser adivinho para perceber que o seu fim está escrito nos astros.

Como se já não bastasse a tragédia do resgate dos bancos credores das periferias, através da conversão da dívida do sistema financeiro em dívida pública à troika, agravada pela aplicação de uma política económica idêntica à dos anos trinta do século passado que converteu o crash financeiro de 1929 na Grande Depressão, temos agora a Finlândia a admitir referendar a sua participação na Zona Euro. Juntemos a recente vitória de um partido eurocético na Polónia e a passagem da Frente Nacional a partido mais votado nas eleições regionais em França. Isto para além do anunciado referendo no Reino Unido sobre a sua participação na UE.

Sendo a Zona Euro o coração da UE, percebe-se que o seu funcionamento cada vez mais debilitado acabará por comprometer a sobrevivência da totalidade do corpo político a que está ligado. Aliás, a crise que estamos a viver já não é designada por "crise das dívidas soberanas", como nos habituaram os media, e alguns analistas já referem com naturalidade a "crise da UE". Na verdade, as dívidas públicas grega e portuguesa, como de resto as de outros países europeus não intervencionados, não adquiriram subitamente a virtude da sustentabilidade. Aconteceu apenas que o BCE tranquilizou os mercados financeiros com a promessa de que em última instância as compraria (à revelia dos tratados) ao mesmo tempo que vai intervindo discretamente para controlar o respectivo preço. Ou seja, afastado de um horizonte mais próximo o colapso financeiro de bancos e Estados, o risco do fim da UEM passou a ser eminentemente político.

Até quando resistirá o povo grego ao massacre a que está sujeito? Até quando resistirá a Itália a uma estagnação sem fim à vista? Até quando resistirá a França à permanente desindustrialização e erosão do Estado-social? Até quando aceitará a Finlândia sofrer uma recessão sem poder recorrer à política económica (orçamental e cambial) de que precisa? Até quando Portugal e Espanha estarão dispostos a sofrer um nível de desemprego típico da Grande Depressão? Muito provavelmente, a crise dos refugiados que chegam em massa às portas da UE será o golpe de misericórdia neste projecto de submissão dos povos ao totalitarismo neoliberal. A França e a Alemanha participaram ativamente nas aventuras imperiais dos EUA no Próximo Oriente e agora, face ao efeito de boomerang das suas intervenções ao serviço de negócios criminosos, prometem à Turquia a integração na UE para que faça o que outros países têm feito simplesmente por razões humanitárias, ao mesmo tempo que impõem à Grécia uma nova polícia de fronteiras sob comando da burocracia comunitária. A Grécia é ameaçada de expulsão por duas vezes em poucos meses (Euro e Schengen), enquanto a frágil democracia Turca, conivente como os terroristas do EI, é convidada a entrar na UE? O projecto europeu entrou certamente na sua fase terminal.

A minha colaboração com este jornal termina aqui. Agradeço aos editores e aos leitores o tempo que me dedicaram.

[*] Economista, co-autor do blogue Ladrões de Bicicletas

O original encontra-se em www.ionline.pt/artigo/490299/em-fase-terminal?seccao=Opiniao_i

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

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