Mariana
Mortágua – Jornal de Notícias, opinião
Marcelo
continua obscuro sobre o atual Governo. Mas tem uma tese: com o resultado das
legislativas, o país ficou divido em dois. O papel do presidente é
"desdramatizar" e conciliar Esquerda e Direita. Quer isto dizer que,
se fosse eleito, forçaria um Governo de bloco central, o tal regresso à
"união" da sociedade, com ou sem novas eleições? Não sabemos - porque
ele não diz. Mas não queremos correr o risco de descobrir a resposta.
Uma
coisa é certa, há muito que Marcelo vive dividido em (pelo menos) três. Para
não criar confusão, chamemos-lhes candidato Marcelo, comentador Marcelo e
só-Marcelo ao anterior líder do PSD e membro do Governo Balsemão.
Logo
a seguir à tragédia do hospital de S. José, o candidato Marcelo apareceu a
defender o SNS. O comentador Marcelo, por seu lado, sempre elogiou o anterior
ministro Paulo Macedo e sempre calou os cortes de 1500 milhões de euros na
saúde. Por fim, só-Marcelo votou contra a criação do SNS em 1979; esteve no
Governo que aprovou o decreto 254/82, entretanto declarado inconstitucional por
visar a destruição do SNS; e propôs em 1996, como líder do PSD, a retirada da
referência constitucional à "gratuitidade tendencial" do SNS.
O
candidato Marcelo promulgaria as leis agora aprovadas pela Esquerda,
legalizando a adoção por casais do mesmo sexo e restabelecendo o direito ao
aborto seguro, gratuito e sem perseguições. Mas o comentador Marcelo,
reconhecendo que a lei discriminava no acesso à adoção, defendeu em 2013 um
referendo. Já sobre o aborto, o comentador pouco disse. Todavia, só-Marcelo,
líder político e ativista pelo "não" nos referendos, votou a favor da
manutenção da pena de prisão para as mulheres que abortassem.
É
verdade que só-Marcelo votou a Constituição. E que o candidato Marcelo jurou a
Marisa Matias que tinha apoiado o chumbo pelo Tribunal Constitucional dos
cortes de rendimentos do Orçamento do Estado de 2012. Mas, na época dos cortes,
o comentador Marcelo exclamava que "não lembraria ao careca" pedir a
fiscalização da constitucionalidade do Orçamento. Depois dos vários chumbos do
TC, o comentador Marcelo passou a dizer que este é um órgão político, que não
pode ser visto da mesma forma que outras instâncias judiciais.
Enfim,
se reunificássemos os três Marcelos, como Marcelo candidato quer fazer ao país,
teríamos a defesa da saúde mas sem SNS; o respeito pela igualdade e pelos
direitos humanos mas sem aborto seguro e gratuito, muito menos respeito pelas
famílias LGBT; teríamos a Constituição, mas um presidente pelo qual, nos
últimos quatro anos, teriam passado todas as violações da lei fundamental.
Em
suma, Marcelo Rebelo de Sousa não é de confiança. Pela minha parte, escolherei
nestas eleições a pessoa que, para as questões em que Marcelo esconde ou erra,
tem uma reposta concreta, sem medos ou meias-palavras. No dia 24 de janeiro,
voto Marisa Matias.
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