Martinho Júnior, Luanda
1
– O “apartheid” preparou-se o melhor que pôde para levar a cabo as
guerras que encetou por Angola adentro, quando Angola, pela voz do Presidente
Agostinho Neto apregoava não só ser“trincheira firme da revolução em África”,
como também ia mais longe: “na Namíbia, no Zimbabwe e na África do Sul
está a continuação da nossa luta”!...
Nessa
preparação, visando ultrapassar durante a década seguinte o improviso relativo
da Operação Savanah em 1975, o “apartheid” a nível externo contou
com conexões que, rompendo o embargo de armas, lhe permitiram obter algumas
tecnologias de ponta e a nível interno com meios financeiros mobilizados para a
indústria militar, cujas principais capacidades estavam instaladas na ARMSCOR,
na SANDOCK-AUSTRAL REUMECH OMC, na KENTRON e na DENEL.
Foi
a partir de sua indústria militar que foram absorvidas algumas novidades
tecnológicas de ponta, mas também desenvolvidas outras tecnologias inteiramente
sul-africanas, dando origem à introdução de novos conceitos de ordem
estratégica como de ordem táctica que foram sendo imediatamente introduzidos
nos campos de batalha, de onde recolhiam também experiências para introduzir
outros novos conceitos.
2
– Foram inúmeras as inovações que a indústria de armamento sul-africana
realizou em suporte das guerras do “apartheid”, apesar dos
constrangimentos das sanções militares (em alguns casos mera retórica) e entre
elas realço:
-
Produção em série de veículos de transportes de tropas todo-o-terreno, de
várias dimensões, desenhados, construídos com protecção contra as minas e
motores Mercedes Benz OM352 produzidos sob licença (Casspir e Buffel); o Buffel
foi elaborado a partir de chassi da Unimog;
-
Produção em série de blindados ligeiros equipados com artilharia de 60mm, 90mm
ou 20mm e motores da General Motors (por exemplo o Eland Mk-7);
-
Produção de blindados Ratel (incluindo o Ratel-ZT3, equipados de mísseis anti
tanque Ingwe, um sucedâneo do BGM-71 Tow, de fabrico norte-americano);
-
Produção em série de peças de artilharia de 155mm (para além de peças de
artilharia de 105mm), G-5, que levou à produção do G-6 auto propulsado e com
chassis assente em rodas, apropriado para percursos no deserto e na savana;
-
Produção de tanques Olifant, com introdução de melhorias a partir do
conceito-base dos Centurion britânicos;
-
Produção do “unnmannned aerial vehicle” para reconhecimento secreto
(“drones” para reconhecimento Denel Dynamics Seeker);
-
Produção de helicópteros Oryx (a partir dos Puma franceses);
-
Produção de mísseis contra blindados de última geração na segunda metade da
década de oitenta (mísseis anti tanque Ingwe, um sucedâneo do BGM-71 Tow, de
fabrico norte-americano);
-
Seis bombas atómicas.
A
indústria militar sul-africana foi um elemento-chave para contrariar as
sanções, os equipamentos produzidos permitiram introduzir novos conceitos
tácticos e estratégicos e visavam criar superioridade militar, provocando o
prolongar da guerra e com isso permitir a sobrevivência do próprio “apartheid” com
seu cortejo de desequilíbrios e injustiças sociais, entre elas a exploração
coerciva e desenfreada de mão-de-obra barata na própria África do Sul, bem como
o protelamento das independências da Namíbia e do Zimbabwe.
A
batalha do Cuito Cuanavale, que alastrou por toda a frente sul de Angola,
permitiu no seu início (Operação Saudando Outubro das FAPLA) às South Africa
Defence Forces tirar partido de algumas das suas vantagens tácticas e só se
assistiu a uma viragem, quando a aliança angolano-cubana introduziu novos
armamentos que permitiram partir para o contra ataque.
3
– De entre os novos conceitos introduzidos no campo de batalha, as SADF
procuraram superioridade no solo: com blindados que garantiam manobra rápida e
segura (com estrutura anti mina), com artilharia de longo alcance adaptada ao
terreno e com boa manobrabilidade, com tanques Olifant com níveis elevados de
combate, com inovadoras capacidades de luta anti tanque e com um reconhecimento
que recorreu não só a um bem treinado e equipado manancial humano, mas também a
inovadores “drones”.
A
combinação do uso de “drones”, com um excelente nível de reconhecimento
apeado, o apoio de helicópteros e o emprego de forças terrestres bem equipadas,
permitiu vantagens iniciais no início da batalha do Cuito Cuanavale, quando as
FAPLA fizeram a ofensiva sobre a Jamba e as SADF, em socorro de Savimbi,
passaram à contra ofensiva (Operações Moduler, a que se seguiram as Operações
Hooper e Packer).
Para
esse efeito as SADF refizeram o 10º Esquadrão da Força Aérea Sul Africana, que
esteve activo primeiro entre 1939 e 1943 (equipado com bombardeiros instalados
junto à costa sul-africana), depois reactivado a partir de 25 de Maio de 1944,
para os bombardeiros serem utilizados na Síria, na Líbia, no Mar Egeu e por fim
na Itália (altura em que findou a sua actividade durante a IIª Guerra Mundial).
O
10º Esquadrão das SAAF, voltou ao activo em Janeiro de 1986, agora equipado com
os “drones”Seeker de reconhecimento e de fabrico inteiramente
sul-africano, que foram utilizados nas Operações Moduler, Hooper e Packer, ou
seja, ao longo de toda a batalha do Cuito Cuanavale, sendo a unidade dissolvida
só a 31 de Março de 1991.
O
10º Esquadrão estava em comunicação com as forças envolvidas em operações no
terreno e demonstraram a sua eficácia enquanto guias de fogos de artilharia de
longo alcance (G-5 e G-6).
Deste
modo a batalha do Cuito Cuanavale assistiu ao primeiro emprego
de “drones” da história, ainda enquanto armas de reconhecimento e sem
capacidades ainda de ataque ao solo, ou bombardeamento.
4
– Para garantir a sua superioridade o “apartheid” desencadeou um
programa nuclear que produziu 6 bombas atómicas e terá mesmo realizado uma
experiência atribuída ao “apartheid” no Índico Sul próximo da
Antárctida (a sul das ilhas Prince Edward), experiência que foi detectada pelo
satélite Vela 6911, a 22 de Setembro de 1979.
A
observação feita pelo Vela 6911, uma vez que gerou controvérsia, foi conhecida
a nível internacional, pelo que de então e até ao fim da guerra (que terminou
com a batalha do Cuito Cuanavale), havia o risco
do “apartheid” utilizar seu poderio nuclear, ainda que estivesse sob
constante pressão internacional em função das sanções a que a África do Sul
estava sujeita.
De
acordo com o Comandante Fidel, o programa de armamento nuclear sul-africano só
foi possível com o apoio norte-americano, mas depois da viragem da batalha do
Cuito Cuanavale, o“apartheid” perdeu a oportunidade de as utilizar por que
entretanto havia perdido finalmente o domínio do ar.
Na
sua “Mensaje a los participantes en el XVII Festival Mundial de la
Juventud y los Estudiantes en Sudáfrica” de 13 de Dezembro de 2010, o
Comandante Fidel revelaria:
…
“Como prueba de la total falta de escrúpulo yanki, es necesario recordar que el
Gobierno de Estados Unidos entregó armas nucleares al régimen del
apartheid, que los racistas estuvieron a punto de usar contra las tropas
cubanas y angolanas, que después de la victoria de Cuito Cuanavale avanzaban en
la dirección Sur, donde el mando cubano, sospechando ese peligro, adoptó las
medidas y tácticas pertinentes que le daban el dominio total del aire.
Si
intentaban usar tales armas, no habrían obtenido la victoria. Pero es legítimo
preguntarse: ¿qué habría ocurrido si los racistas sudafricanos hubiesen
utilizado las armas nucleares contra fuerzas de Cuba y Angola? ¿Cuál habría
sido la reacción internacional? ¿Cómo habría podido justificarse aquel acto de
barbarie? ¿Cómo habría reaccionado la URSS? Son preguntas que debemos
hacernos”...
5
– Para ultrapassar o nível alcançado pelas SADF no campo de batalha, era
necessário introduzir armamento superior ao da bitola utilizada pelas SADF,
assim como efectivos frescos, para e passar ao contra ataque.
O
pedido de ajuda feito por Angola a Cuba, foi decisivo pois garantiu o manancial
requerido e estimulou o volte face da batalha sob o comando do Presidente José
Eduardo dos Santos e do Comandante Fidel.
Um
dos garantes foi a superioridade aérea conseguida com a introdução de
caças-bombardeiros MIG-23 no teatro operacional, o que retirou aos
sul-africanos a iniciativa, até por que suas unidades no solo começaram a ficar
atascadas nos campos de minas envolvente ao triângulo de Tumpo e sujeitas aos
fogos de barragem da artilharia aliada angolana-cubana.
As
unidades das SADF perderam capacidade de movimento e nem os pesados Olifant
conseguiram romper, pelo que a sua paragem possibilitou desencadear o contra
ataque em direcção a Calueque e Menongue, começando a colocar em risco as
pistas de aviação das SAAF instaladas no norte da Namíbia, que ficavam à mercê
das eventuais incursões dos MIG-23 com as cores angolanas da FAPA/DAA.
Os
MIG-23 chegaram mesmo a sobrevoar faixas a norte da Namíbia ocupada
pelo “apartheid”.
A
viragem da batalha do Cuito Cuanavale estava garantida, a possibilidade das
forças angolano-cubanas-namibianas (da SWAPO) entrarem da Namíbia começava a
colocar-se e o “apartheid” só tinha como saída reconhecer que já não
conseguia ganhar a batalha tecnológica, perdera a iniciativa sem a poder mais
recuperar e estava efectivamente a perder a batalha do Cuito Cuanavale, pelo
que só tinha uma saída: sentar-se rapidamente à mesa de negociações, cumprir
com as Resoluções da ONU e iniciar transformações importantes no ambiente
sócio-político da própria África do Sul.
As
independências do Zimbabwe e da Namíbia, assim como o fim do “apartheid”,
comprovam claramente qual foi o lado vencedor na África Austral a partir do
próprio teatro de operações…
Ilustrações:
-
Foto do “drone” de reconhecimento Seeker que equipava o 10º Esquadrão
das SAAF;
-
Ratel ZT3 Ingwe (equipados com mísseis anti tanque, que causaram estragos aos
tanques T-55 das FAPLA);
-
Duas unidades auto propulsadas G-6, equipadas com canhões de 155mmm.
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